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11 DE ABRIL DE 1987 2663

Se é certo que a invasão de Dezembro de 1975, foi uma afronta aos direitos e à soberania portuguesa, não será menos certo que a efectivação de um acto eleitoral, por um país invasor, num território de que outro é potência administrante, ultrapassa tudo o que é admissível à luz do direito internacional, à luz dos princípios da Carta das Nações Unidas, à luz do respeito pelas regras de convivência, à luz do direito dos povos.
Eleições cujos resultados os responsáveis indonésios antecipadamente já anunciam, que, em idêntico acto, cinco anos atrás, apresentaram mais votos que votantes, feitas sem o mínimo de garantias e lisura democráticas, sem a anuência, mas contra a vontade de um povo, mais não são do que uma fraude, um atentado à liberdade, à democracia e ao direito internacional. Por isso, aqui estamos a denunciar, sem qualquer tipo de ambiguidades, tão hedionda farsa, mas mais do que isso, em nome do Partido Renovador Democrático, aqui estamos a recusar qualquer significado político de tal acto, a declarar como inadmissível que ele possa ser minimamente utilizado como pretensa prova da livre expressão da vontade do povo de Timor e muito menos como referencial do seu processo de autodeterminação.
Por isso, aqui estamos a reafirmar o inalienável direito do povo de Timor-Leste à autodeterminação, mas autodeterminação isenta «de qualquer tipo de ingerência na manifestação livre da vontade do povo de Timor-Leste», como em Julho de 1984 publicamente afirmava o então Presidente da República, general Ramalho Eanes.
Por isso, aqui estamos a lançar um apelo para que se envidem todos os esforços no sentido da resolução do problema de Timor, não esquecendo nunca que é ao povo timorense e aos seus legítimos representantes que caberá, em última análise, a palavra definitiva.
Porque o acto eleitoral de 23 de Abril, Sr. Presidente, Srs. Deputados, mais não é do que a sonegação do direito do povo de Timor à sua livre autodeterminação, do direito do povo de Timor à sua própria liberdade, o sentido do nosso voto.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É preciso e justo que se proclame, aqui, a propósito do voto acabado de aprovar, que as eleições programadas pela Indonésia no território de Timor-Leste constituem uma mascarada intolerável que nada legitima. O ocupante serve-se de instrumentos ilidimos para tentar, diante da comunidade internacional, credibilizar uma política de constante violação do direito público das nações e de ofensa das mais elementares prerrogativas do homem. A situação que se vive naquela zona do globo, conforme o relatório da Comissão Eventual da Assembleia da República e a opinião mundial, é comprovadora da reiterada, sofrida, indomável resistência dos Timorenses à tutela estranha. Pelas armas e pelas manifestações quotidianas, não desfalecem na luta por liberdade, demovem obstáculos sem fim na construção de uma pátria independente. Nos alicerces dessa edificação heróica vão-se empilhando e espalhando os mortos, ficam os traços de inúmeros sofrimentos, o sangue dos inocentes e dos guerrilheiros, as crónicas da violência de Djacarta. Recentemente, o caso dos quatro estudantes impedidos de abandonar a Indonésia, munidos embora de passaporte português, veio chamar a atenção, uma vez mais, para os riscos, as emboscadas, as ignomínias e torções jurídicas de toda a ordem que recaem sobre os homens, as mulheres e as crianças de Timor. Prosseguem as deportações, os assassínios, as prisões arbitrárias, os bloqueamentos ao exercício de uma cidadania indeclinável. Somam-se, entretanto, as condenações, por parte de múltiplos países não contaminados pelo escalracho dos interesses imperialistas. Ao contrário das declarações proferidas pelos dirigentes indonésios após a anexação, o regime tirânico mantém uma conduta expansionista, agora culminada no acto eleitoral previsto para 23 do mês em curso, fazendo do seu Ministro dos Negócios Estrangeiros um dos cabeças de lista por Dili, designada 27.ª Província. Trata-se de uma indignidade e de uma aberração que não pode passar em claro.
Não são externas, sabemos, estas molduras ao arrepio da vontade dos povos e do senso democrático que se desenvolve e aprofunda na maioria das políticas externas nacionais. O direito de Timor-Leste à completa e autónoma gestão dos seus destinos ver-se-á consagrado no viver de cada dia, longos ou curtos que se afigurem ainda os anos de porfia e dor. A nós, porém, não bastará nunca o conforto de tal certeza; incumbe-nos, como potência administrante, uma acção indescurável que abrevie a fase histórica actual e, em consonância com os princípios da Carta e as deliberações da ONU, bem como a norma constitucional que nos vincula a procedimentos diligentes, estimule, apoie e garanta a independência de Timor-Leste. A realização projectada de uma conferência internacional, promovida por este órgão de soberania e pensada, em última instância, para o mês de Junho próximo, assume, no quadro das circunstâncias presentes, uma óbvia relevância. Daí que rejeitemos, de forma categórica, as tibiezas e as intenções malsãs que, oriundas do Governo, possam pô-la em causa. A multiplicação de actuações diplomáticas, quaisquer que sejam os agentes, desde que pautadas pelas definições correctas de postura que para Portugal estabelece a Constituição da República, só favorece e robustece o combate que nos mobiliza.
No Parlamento Europeu, tal como na União Inter-parlamentar, as actuações empreendidas no sentido da sensibilização para o problema a que nos reportamos e no da assunção de opções favoráveis, atestam bem da justeza de se não reclamar nenhum exclusivismo institucional no advogar das nossas posições.
Urge o concerto de intervenções, a dinamização do papel do Estado. Controvérsias suscitadas em nome de mesquinhos azimutes político-partidários ou no lodo da afronta ao Parlamento merecem firme repúdio e determinação, certamente, a persistirem, uma inequívoca denúncia.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A par das inúmeras torturas a que têm sido submetidos, os Timorenses confrontam-se com a sistemática e criminosa descaracterização da sua índole cultural, linguística e sociológica, perpetrada pela autocracia indonésia. É da prática corrente dos colonizadores de todas as épocas a busca da imposição dos seus modelos próprios às comunidades constrangidas, o apagar da memória popular autêntica, fermento sempre renovável de insubmissão. Pelos fidedignos relatores que ouvimos, Jacarta falhou já a sua cruzada, pesem embora os êxitos pontuais. A identidade do povo maubere, que não foi jugulada por séculos de presença portuguesa, não cederá