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506 I SÉRIE - NÚMERO 17

Governo, que tanto apregoa o rigor como uma das normas da sua actuação, nada fez de significativo para corrigir as deficiências e situações inconstitucionais como aquela que fiz referência. Teve, para isso, condições favoráveis como nenhum outro governo dos últimos 15 anos, mas desperdiçou-as.
A área de ilegalidades em matéria de política orçamental tem mesmo vindo a alargar-se. Quando apresentou o orçamento suplementar de 1985, o Governo criticou o recurso abusivo a operações de tesouraria pelos governos anteriores. Todavia, nos seguintes, essa mesma prática não só foi mantida como ampliada. Será de perguntar: quando é que o Governo, que em 1985 tão pressuroso se mostrou em apresentar um orçamento suplementar para a regularização da operações de tesouraria dos governos anteriores, irá apresentar um orçamento suplementar para regularizar as operações de tesouraria que ele próprio realizou ilegalmente? Além disso, quando é que o Governo irá apresentar propostas de regularização para as operações de tesouraria realizadas até 1985 e que não foram abrangidas pelo orçamento suplementar desse ano?
O Sr. Ministro das Finanças afirmou aqui ontem que desde 1986, não há operações de tesouraria por regularizar mas tudo leva a crer que essa afirmação não é correcta. O problema é que muitos dos empréstimos concedidos pelo Tesouro nos últimos três anos devem ser considerados incobráveis e, por conseguinte, correspondem a verdadeiras despesas públicas que não foram orçamentadas como tais.

O Sr. João Cravinho (PS): - Muito bem!

O Orador: - Esses empréstimos figuram no balanço do Tesouro mas não valem nada. Há, por isso, que excluí-los do referido balanço e não vejo como é que isso pode ser feito sem um orçamento suplementar.
As práticas orçamentais ilegais, em que o Governo persiste, não ficam por aqui. O Governo promete-nos mais. É isso o que acontece designadamente com o artigo 44.ª da proposta orçamental, que consigna receitas do imposto complementar à constituição de um Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social. Esse artigo é uma violação frontal e inequívoca da regra da não consingação de receitas estabelecida no artigo 6.º da lei de enquadramento orçamental.
Além de estar infectada por múltiplas ilegalidades e inconstitucionalidades, a proposta do orçamento está também seriamente falseada. Está seriamente falseada sobretudo porque assenta na ficção, em que ninguém acredita, de que a taxa de inflação em 1989 será de 6%. A falta de verdade orçamental encontra-se principalmente do lado das receitas, que estão grosseiramente subavaliadas. É possível que haja também importantes erros intencionais nas dotações para a despesa.
Eu sei que é difícil fazer previsões rigorosas das receitas fiscais. Eu sei também que quando há margens justificadas para dúvidas, a prudência aconselha a que não se escolham as projecções mais elevadas. Mas daí a fazer projecções em que a subavaliação é evidente e intencional há uma grande diferença.
O Governo, pelos vistos, considera uma virtude apresentar-nos projecções de receitas intencionalmente subavaliadas. Eu sustento que se estiverem a discutir um orçamento com projecções falseadas não sabemos, de facto, o que estamos a discutir. Em vez de termos perante nós um orçamento temos uma mistificação.
E não poderemos cumprir uma das funções básicas de qualquer parlamento que é a de controlar a carga fiscal sobre os contribuintes.
A Assembleia da República não recebeu os elementos necessários para verificar os cálculos utilizados nas projecções do Governo. Esses elementos foram solicitados pela Comissão de Economia, Finanças e Plano desta Assembleia mas foram negados. Sob esse aspecto houve um retrocesso. Em anos anteriores nós, os deputados da oposição, queixavamo-nos da insuficiência dos elementos explicativos sobre os métodos de elaboração do orçamento. Este ano tivemos muito menos ainda. As únicas informações de que dispomos sobre as projecções das receitas sobre o financiamento do deficit são as que constam do relatório da proposta de lei orçamental. Desafio quem quer que seja, principalmente se for técnico de economia e de finanças, que nos mostre como é que, com base apenas nas informações que aparecem nesse relatório, é possível avaliar da justeza dos números apresentados pelo Governo. Em que outro país da CEE se fará uma discussão orçamental totalmente às escuras do lado das receitas como a que hoje está a acontecer entre nós?
Depois destes comentários, vou ainda fazer referência a dois outros pontos de que já tenho tratado em intervenções anteriores - o agravamento da carga fiscal e a dificuldade em sustentar, a prazo, os deficits como aqueles que temos tido.
O Governo, na sua proposta de orçamento, anuncia um ligeiro aumento da carga fiscal. Todavia, o aumento efectivo que espera os contribuintes será certamente muito maior em virtude de, como atrás eu disse, as projecções das receitas estarem fortemente subavaliadas.
Se o agravamento da carga fiscal projectado para 1989 resultasse apenas da maior eficiência das cobranças e da redução de isenções fiscais menos justificadas, nós não teríamos razões para criticar o Governo e teríamos mesmo de aplaudi-lo. Mas não é só isso o que sucede. O que sucede é que as receitas fiscais vão aumentar também em grande medida porque haverá agravamentos substanciais em vários impostos.
Em primeiro lugar, está por provar que o novo imposto sobre o rendimento de pessoas singulares (IRS) não seja, para um elevado número de contribuintes, bastante mais pesado do que os impostos que ele veio substituir.
Em segundo lugar, a cobrança do imposto complementar juntamente com o imposto de rendimento agravará enormemente a tributação sobre muito contribuintes.
Em terceiro lugar, o facto de o Governo propor a correcção de 1% nos escalões do imposto complementar e de não haver ajustamento nos montantes relativamente às deduções quando a inflação está andando pelos 9 a 9,5%, envolve um agravamento significativo das taxas desse imposto.
Em quarto lugar, o Governo prepara-se aparentemente para aumentar ainda mais a incidência do imposto sobre os produtos petrolíferos já que, de outra forma, não se compreendia o aumento do limite superior para as taxas desse imposto, previsto no artigo 28.º da proposta de lei orçamental.
Em quinto lugar, é de admitir que o Governo também pretenda aumentar a fiscalidade sobre os automóveis, a julgar pelo artigo 32.º da sua proposta, embora aqui subsistam muitas dúvidas porque esse artigo tem