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1866 I SÉRIE - NÚMERO 54

A Sr.ª Maria Santos (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.ªs e Srs. Deputados: O Partido Os Verdes recebeu uma «Carta Aberta» sobre o Dia Mundial da Floresta, subscrita por diversas associações, alertando para a situação que se vive actualmente no sector florestal do nosso país.
Consideramos ser nosso dever dar o devido relevo a esta «Carta Aberta», para que o seu conteúdo não chegue apenas aos deputados responsáveis pelas questões agrícolas ou ecológicas mas para que seja do conhecimento de toda a Câmara.
Ao divulgar este apelo no dia 21 de Março, dia consagrado à defesa da floresta e dos valores que ela representa, Os Verdes associam-se às preocupações expressas e apelam a todos vós, Sr.ªs e Srs. Deputados, para que, independentemente do nosso posicionamento político-partidário, tomemos as medidas que urgem, no sentido da definição, para o nosso país, de uma política florestal que esteja de acordo com o estabelecido pela Estratégia Mundial da Conservação da Natureza, convenção que aprovámos por unanimidade e aclamação no passado dia 17.

Carta Aberta à Assembleia da República

Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados: Portugal encontra-se envolvido num amplo processo de transformação que se pretende vir a substituir a imagem de um país em vias de desenvolvimento pela de um país europeu moderno.
Neste contexto, a par do crescimento económico, largamente suportado pelo financiamento comunitário, terá de ser incentivada, decisivamente, a valorização e a conservação da natureza e da cultura, patrimónios inalienáveis do povo português e bases da sua identidade.
Ficará comprometido o progresso real se a utilização sustentada dos recursos naturais e a defesa do ambiente não constituírem um guião indispensável das acções de desenvolvimento.
Mais grave será se, tal como se verifica em diversos campos, em particular na exploração florestal, na utilização turística do litoral e no crescimento urbano, o crescimento económico for procurado de forma irresponsável e negligente, à custa do património, da cultura, dos recursos naturais, do equilíbrio sócio-económico regional e do ambiente no seu contexto mais amplo.
O Dia Mundial da Floresta de 1989 tem de constituir um marco de viragem no descalabro ambiental, cultural e frequentemente sócio-económico a que está a conduzir a atitude de irresponsabilidade do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação e do Ministério do Planeamento e Administração do Território. A sua actuação demissionária e cúmplice perante a agressividade prepotente da indústria de celulose tem permitido e incentivado a expansão anárquica da monocultura de eucalipto, deixando abafar outros sectores económicos viáveis baseados nos recursos endógenos que poderiam contribuir para o desenvolvimento regional sustentado.
Que o eucalipto seja «vendido» à opinião pública como «árvore-milagre» pela indústria da celulose, cuja expansão voraz beneficia da fragilidade económica e social das populações rurais e da cumplicidade dos departamentos estatais em que aquela colocou os seus homens de mão, é compreensível.
Que a mesma imagem seja difundida por muitos gestores e administradores públicos para encobrir a inoperância na procura de soluções equilibradas e diversificadas de desenvolvimento regional, alegando a inexistência de alternativas, também é compreensível.
Agora que, num sector tão fundamental em termos ambientais e económicos, se deixe o País ser governado, na prática, pelas empresas de celulose, cujos naturais interesses não coincidem necessariamente com os de toda a nação, tal já é admissível.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos reconhecemos que a produção de pasta de papel constitui um sector económico importante. Mas ninguém, minimamente responsável, deixará de admitir também que não se pode continuar a permitir a destruição, frequentemente ilegal, de recursos valiosos como solos agrícolas, recursos hídricos necessários para outras utilizações, montados de sobro e azinho, olivais, madeiras nobres, medronhais, pastagens, etc.
Não se pode continuar a permitir a destruição sistemática dos biótopos mais importantes para a flora e fauna selvagens, quase sempre incluindo inúmeras espécies ameaçadas e protegidas pelas leis nacionais e internacionais, pelas convenções internacionais e directivas comunitárias.
Não se pode tolerar a contaminação impune dos rios e da atmosfera pelas fábricas de pasta de papel nem a destruição sistemática de estações arqueológicas, delapidando a nossa memória colectiva, nem mesmo a irradicação súbita e decisiva da nossa paisagem rural tradicional, que constitui parte integrante de uma identificação regional e nacional.
Não se pode permitir que um único sector produtivo, usufruindo da situação presente nas regiões desfavorecidas, da ausência negligente de planeamento e ordenamento efectivo do uso do solo, de ausência de estudos e apoio às alternativas possíveis e das carências técnicas e financeiras da gestão autárquica, inviabilize a diversificação económica regional geradora de emprego estável e desenvolvimento sustentado e contributo para a fixação das populações.
Entregues, sem defesa, à monocultura de eucaliptos em grandes extensões, tal como a qualquer outra monocultura ou excessiva especialização económica, as regiões ficarão sujeitas, a médio ou longo prazo, a uma crescente dependência do exterior, das flutuações de mercado e das próprias vicissitudes de eucaliptais indevidamente instalados e conduzidos - pragas, geadas, quebras de produção -, acompanhada de diminuição dos níveis de emprego, emigração e agravamento das assimetrias regionais.
O que se tem permitido, na ausência de incentivo, investigação e investimento, em outros sectores florestais ou a eles associados, é o comprometimento da continuidade, fomento ou recuperação dos recursos corticeiros, madeiras nobres, frutos secos, mel, caça, produtos pecuários autóctones de qualidade, etc.