I SÉRIE -NÚMERO 11 300
universitários portugueses em geral, a cerimónia de hoje ficará certamente como um dos momentos mais altos, significativos e sensibilizantes das celebrações do VII Centenário da fundação da Universidade.
Ao falar dos universitários portugueses em geral, que não apenas dos de Coimbra, não me arrogo, naturalmente, uma representação que formalmente não trago, mas apenas me atenho a uma vontade que, com toda a verosimilhança, presumo.
Todos sabemos, na verdade, que a Universidade que D. Dinis fundou em l de Março de 1290 - a qual teria, aliás, começado efectivamente a funcionar em 1288 - e que o Papa Nicolau IV ratificou em 9 de Agosto do mesmo ano foi estabelecida primeiramente em Lisboa, tendo sido transferida logo em 1308 para Coimbra, para voltar à capital em 1338 e regressar a Coimbra em 1354, retornando a Lisboa em 1377. D. João III, corria o ano de 1537, fixou definitivamente em Coimbra a Universidade que D. Dinis fundara em 1290.
Como tive ocasião de dizer na cerimónia solene de abertura das comemorações do VII Centenário da Universidade de Coimbra: «Não esqueço - nem nós aqui, em Coimbra - o papel que Lisboa teve na génese da instituição universitária em Portugal, o que indissoluvelmente nos une, embora para alguns possa parecer que nos separa.»
Mas se é inegável este vínculo histórico com Lisboa, que aliás encontra reflexo na própria estruturação das comemorações, não deve igualmente deixar de ver-se nas mesmas comemorações uma razão mais para o reforço da solidariedade entre todas as universidades portuguesas. Tem sido esse o propósito e o empenho das comissões do VII Centenário, tanto a por mim nomeada e a que presido, como a comissão consultiva nacional, criada por resolução do Conselho de Ministros e à qual também tenho a honra de presidir, conjuntamente com o reitor honorário Professor Ferrer Correia. A elaboração de uma história monumental da Universidade no nosso país, que tais comissões se propõem anunciar oficialmente, constitui a mais de um projecto cultural e científico da maior importância, uma clara e insofismável prova disso mesmo. O espírito que anima esta solene sessão comemorativa organizada pela Assembleia da República vai, também ele, estou certo disso, na linha, que assinalei, da solidariedade e fraternidade universitária e interuniversitária.
O que acabo de dizer indicia, de par com muitos outros actos realizados, projectados ou em curso, o sentido das celebrações do VII Centenário da Alma Mater Conimbrigensis. Já defini esse sentido noutras ocasiões, em especial no aludido discurso de l de Março passado, aliás em perfeita sintonia com a Universidade, e pode ele sintetizar-se assim: importa que as celebrações do VII Centenário não tenham um alcance passadista, mas um cunho actualista e prospectivo.
Esta postura significa que se procura rever o passado com os olhos postos no futuro e, por outro lado, ganhar novos estímulos e forças em ordem a significativos avanços no desenvolvimento humano e material da Universidade. Daí que a comemoração dos 700 anos da Universidade, num programa aberto e multiforme do qual já muito se fez e mais se fará-, deva decorrer de molde a que se não esqueçam as festividades, mas se ponha a tónica em empreendimentos científicos e culturais e em outras realizações de progresso para a Universidade. Ela precisa de novos cometimentos no ensino, na investigação, na vivência cultural e na ligação à comunidade.
Tais progressos e cometimentos constituem um legítimo anseio e, do mesmo passo, uma instante necessidade.
Com efeito, é patente o desejo social de acelerar a evolução ou as mutações da Universidade - de uma Universidade em crescimento rápido, susceptível de abalar ou subverter as estruturas materiais e humanas da instituição.
Eu diria, em apertada e por isso algo redutora síntese, que a Universidade do futuro - e de um futuro mais ou menos próximo - há-de buscar amplas reformas de cursos, conteúdos e métodos de ensino, capazes de actualizarem e activarem o que nela se ensina e aprende, apontando mesmo para um novo perfil de aluno e de professor, o que será um dos aspectos relevantes do percurso da instituição universitária na pós-modernidade. Essas reformas serão, a meu ver, pressionadas e potenciadas pelo corpo estudantil, que conseguiu, na Lei da Autonomia Universitária e nos estatutos das universidades -de um modo geral, mas sobretudo em Coimbra, um assinalável reforço de poder e influência. Reforço que muitos lamentam, mas com o qual me congratulo, por o julgar justo e por constituir uma garantia de dinamização e rejuvenescimento das universidades.
Além deste acréscimo da importância relativa do ensino e da pedagogia, julgo que se exigirá da investigação científica uma melhor articulação com o ensino, por um lado, e com a sociedade, por outro. Neste segundo aspecto, avultará o papel da investigação contratual, actuada através de protocolos e convénios com empresas, entidades governamentais, autarquias e outros entes, públicos e privados. De toda a maneira, tomar-se-á mister uma revitalização da investigação científica, que corresponda a políticas não heteronomamente impostas.
Num outro plano - mas todos, claro está, se interligam - impõe-se à Universidade reforçar a sua componente cultural e implementar mesmo uma política de cultura a se, própria, autónoma, e não apenas aquela que aparece necessariamente co-envolvida no ensino e na pesquisa científica. É um passo imprescindível para a sociedade de cultura que ambicionamos.
Estas novas perspectivas da educação, ciência e cultura - que acabo de traçar no seu rasgo mais essencial, despido de qualquer pormenorização, que nem o tempo nem o teor desta intervenção permitiriam - correspondem, inegavelmente, a uma politização da Universidade. Entendamo-nos: não falo de politização da Universidade no sentido de uma universidade ideológico-política e partidarizada, concepção que é claramente de rejeitar. Falo, sim, no sentido de uma politização da sociedade, isto é, de uma cada vez maior sensibilidade e abertura às realidades e aos problemas económicos e sociais.
É, afinal, a ideia de que a Universidade tende a abrir-se progressivamente à sociedade. Ideia hoje assente, a questão é realizá-la. Mas enganar-se-á quem julgue que as universidades aceitam, passivamente, estar ao serviço da sociedade. E bem assim se enganará quem, nomeadamente, tire daí apressadas conclusões quanto ao financiamento das instituições universitárias através de receitas próprias, as quais, numa perspectiva economicista e empresarial da Universidade - que é de rejeitar-, deveriam subir em flecha, com a correspondente quebra dos financiamentos estaduais. Como disse recentemente o Sr. Presidente da República, reportando-se a um dos aspectos mais frisantes do relacionamento das instituições