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2474 I SÉRIE-NÚMERO 74

É um modelo liberal? Pretender-se-á também retirar o Estado de áreas onde o seu papel é fundamental? Anunciou-se a fusão do Instituto para a Cooperação Económica com a Direcção-Geral da Cooperação, mas nada se fez. Prometeu-se a criação de um instituto para a cooperação, mas não se cumpriu. Anunciou-se, há já muito tempo, um miniplano Marshal para Angola. Onde é que ele ficou? Falou-se depois do plano para ajudar a recuperação económica de Angola. Onde é que está? O mesmo se diga em relação à Conferência Internacional de Ajuda, anunciada para o 1.º semestre de 1990. E, embora tenha aumentado a dotação orçamental para a cooperação, devemos perguntar-nos se ela corresponde às responsabilidades históricas, políticas e culturais de Portugal.
Penso que seria necessária uma definição estratégica do orçamento para a cooperação. Mas a questão essencial, Srs. Membros do Governo, Sr. Presidente, Srs. Deputados, é a da política cultural e, sobretudo, a estratégia para a preservação da nossa língua. A língua é a questão decisiva, porque é ela a nossa trincheira de resistência contra a concorrência francófona e anglófona.

A Sr.ª Edite Estrela (PS): - Muito bem!

O Orador: - Os Ingleses e os Franceses têm uma política da língua para os países africanos. Nós não temos estratégia, não temos política, não temos coordenação! Fazemos algumas «flores», acções desgarradas, umas feiras, mas as despesas totais com o funcionamento e actividade dos centros culturais da Praia, do Mindelo, de Bissau, de São Tomé e Príncipe, Maputo e Beira somam 35 217 contos - esta é a realidade. E se é verdade que somos um país pobrezinho, também é verdade que um país com a nossa história, com as nossas responsabilidades, tem de ter algo mais do que retórica. A política da língua tem um preço. A política cultural e da nossa afirmação cultural em África tem um preço que Portugal tem de pagar e não pode reduzir-se a esta verba.
Aliás, como várias vezes temos dito, essa estratégia implica um grande envolvimento nacional, pois trata-se de uma prioridade nacional, e não pode ser tratada como um luxo ou como um resto, e não pode ficar à mercê dos trocos do Orçamento ou do mecenato. O Estado não pode continuar a demitir-se.

O Sr. José Sócrates (PS): - Muito bem!

O Orador - O centro cultural de São Tomé tem apenas uma pessoa e, tanto quanto eu saiba, a conselheira cultural em Cabo Verde continua por substituir.
Estes casos serão insignificâncias, mas é destas pequenas insignificâncias que se faz ou não se faz uma política.
O centro cultural de Luanda ainda não está, pelo menos que eu saiba, a funcionar, porque faltam professores, faltam casas, falta resolver o problema da equivalência do estatuto do cooperante com as remunerações das organizações internacionais ou, pelo menos, tentar aproximá-lo um pouco mais. É talvez por isso que o número de cooperantes tem vindo a diminuir: em Angola, de 70 em 1983/1984 para 13 em 1989/1990; em Moçambique, de 125 para 24; na Guiné, de 52 para 7; em São Tomé e Príncipe, de 33 para 16; em Cabo Verde, de 27 para 11. Isto é, no total, de 338 para 73.
Estes são números que falam por si, que chegam para condenar uma política ou, pelo menos, para ilustrar a ausência dela. V. Ex.ª já aqui falou hoje da sua preferência pela qualidade em detrimento da quantidade e, por isso, penso que Portugal tem de ter mais do que assessores em pontos estratégicos ou de ministros com pastas estratégicas. Portugal tem de ter uma presença de qualidade, mas em todas as áreas da cooperação.
A nova situação em África e os novos desafios implicam também uma mudança de atitude e exigem uma nova coerência das políticas de cooperação. É, pois, tempo de encarar a cooperação como uma opção nacional e como uma componente fundamental da solidariedade europeia. É preciso pôr fim à dispersão, racionalizar os instrumentos estatais, realizar a fusão prometida e não cumprida e criar, finalmente, o anunciado instituto para a cooperação.
Ao mesmo tempo, é necessário apoiar a formulação de políticas na universidade e na investigação, fazer formação e investigação em questões africanas, criar um instituto de estudos africanos, porque a cooperação é também uma questão cívica, pedagógica e de sensibilização, havendo uma memória, uma acumulação de experiência e de conhecimentos que não podem perder-se, assim como uma vivência que deve ser transmitida às novas gerações.
Uma estratégia nacional para a cooperação exige a criação de quadros capazes de a levar a cabo.
Aliás, devo dizer que o Sr. Deputado Adriano Moreira teve a ideia, que considero original e brilhante, de criar uma Universidade Luís de Camões que poderia ter as suas projecções nos países africanos de língua portuguesa. Esta seria a forma de o Estado Português e de Portugal contribuírem para a concretização de uma efectiva política de estratégia da língua e da difusão da nossa língua e da nossa cultura.
Mas a verdade é que as verbas atribuídas à cooperação, apesar dos aumentos verificados, não permitem responder às solicitações apresentadas pelos países africanos, nomeadamente no que respeita ao atendimento de pedidos de formação e assistência técnica de grande efeito multiplicador e que se não forem satisfeitos por Portugal sê-lo-ão por outros países.
Outro problema é o da preservação do riquíssimo espólio documental da antiga administração ultramarina portuguesa, que carece urgentemente de instalação adequada, sob o risco de deterioração a curto prazo.
O pudor quase me obriga a calar o estado em que se encontram algumas embaixadas, como a de São Tomé e Príncipe, que visitei quando acompanhei o Sr. Presidente da República, bem como o parque automóvel da representação portuguesa em Angola, para já não falar de algumas insignificâncias, como o problema do gerador da embaixada de Luanda e da alcatifa rota. Estas serão pequenas insignificâncias, mas a presença de Portugal em Angola não é compatível com insignificâncias desta natureza.
Sr. Presidente, Sr. Membros do Governo, Sr. Secretário de Estado: A vida anda, as sociedades relacionam-se e em muitos aspectos a cooperação desenvolveu-se, mas não foi resolvido o problema da sua coordenação, da criação de instrumentos que permitam a sua coordenação. Nós somos partidários do relacionamento não só Estado a Estado, mas povo a povo, sociedade a sociedade, mas o Estado não pode demitir-se da sua missão.
Assim, há que criar mecanismos de um outro tipo de articulação entre o que é a iniciativa privada e a iniciativa pública nesta matéria, porque a cooperação é uma causa nacional e por ela passa, mais do que nunca, a afirmação da nossa identidade e da nossa singularidade.

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