22 DE OUTUBRO DE 1993 55
É particularmente preocupante constatar-se que cerca de 1/3 dos actuais quase 340 000 desempregados são jovens com menos de 25 anos, que 42 % estão no desemprego há mais de um ano.
Onde está, Srs. Deputados do PSD, Srs. Membros do Governo, uma política de primeiro emprego para os jovens? Que consequências terríveis para a juventude, as suas famílias e o País advêm do facto de dezenas de milhar de jovens serem lançados no desemprego e, por isso, mais facilmente empurrados para as margens da sociedade?!
Mas passemos agora dos grandes números nacionais-já de si carregados de negro - para a análise regional, radiografia que estamos em condições de aqui trazer, sustentada no levantamento exaustivo da situação que os Deputados comunistas em encontros, visitas e deslocações pelo País fizeram no âmbito da preparação desta interpelação ou da múltipla documentação que, espontaneamente, variadas estruturas nos fizeram chegar. Podemos ir do norte ao sui, do litoral ao interior, do Vale do Ave ao Alentejo, podemos falar com sindicalistas, comissões de trabalhadores ou estruturas empresariais, que encontramos sempre, e sempre, a mesma resposta: ao contrário da teoria do oásis com que o PSD procurou enganar os portugueses até ao momento em que não lhe foi possível «tapar o sol com uma peneira», a realidade social do País nunca foi tão grave como é hoje, continua a degradar-se e o Governo não apresenta políticas que permitam ver a «luz ao fundo do túnel». O Orçamento para 1994 aí está a prová-lo.
Se no Vale do Ave a situação se agrava dia-a-dia, no Alentejo o número real de desempregados atinge já 18 % da população activa, sendo que aqui ascende a 60 % o número dos que não recebem qualquer prestação social. Se no distrito de Lisboa se estima que, até ao final de 1993, sejam destruídos mais de 10 % dos postos de trabalho, em Setúbal o crescimento do desemprego acontece a uma cadência de 500 novos empregos por mês. Se em Julho deste ano já se contavam por 40 000 o número de trabalhadores portugueses com salários em atraso, é uma realidade que hoje este número está agravado em muitos mais milhares de trabalhadores: por cada dia que passa, há uma nova empresa com salários em atraso.
Por outro lado e apesar do Governo ter, de forma chocante, legalizado o trabalho infantil, é uma verdade indesmentível que o trabalho infantil em Portugal cresce em progressão geométrica e volta a ser notícia nos órgãos de comunicação social de todo o mundo. O Sr. Ministro do Emprego, insensível a este drama, preocupa-se com o que se diz no mundo, quando deveria, sim, era preocupar-se em combater este flagelo social em Portugal, consequência da sua política. Não bastando isto, assistimos a uma situação de ruptura na Segurança Social: acumulam-se as dívidas ao sistema (cerca de 300 milhões de contos actualmente), atrasam-se os pagamentos do subsídio de desemprego, modifica-se o regime de pensões e preparam-se medidas restritivas cujo objectivo é reduzir o número de beneficiários do subsídio de desemprego.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Podíamos ficar por este retrato real da situação social em Portugal em pleno reino cavaquista. Seria já, só por si, um enorme libelo condenatório contra uma política insensível às questões sociais, para quem o emprego é um privilégio e não um direito, contra um Governo que procura fazer pagar sempre aos trabalhadores o preço da crise e para quem os interesses dos grupos económicos, do capital, é quem comanda as suas orientações e medidas de política.
Por vezes, nem as aparências são salvaguardadas. Se fizermos uma leitura comparada das propostas apresentadas pela CIP e pelo Governo ao Conselho de Concertação Social em matéria de emprego - portanto, a aproximação é entre o PSD e a CIP e não ao contrário, Sr. Deputado Nogueira de Brito -, a fotocópia não podia ser mais nítida: se a CIP fala na necessidade de promover a «polivalência e a mobilidade dos trabalhadores dentro da empresa», bem como a «mobilidade geográfica» (tese, aliás, também cara ao PS), o Governo escreve que, para melhorar a competitividade das empresas, é necessário impor a «polivalência e a mobilidade profissional e geográfica aos trabalhadores». Se a CIP defende a flexibilidade na organização do trabalho, o Governo sublinha a necessidade de ser promovida a adaptabilidade e a flexibilidade das relações de trabalho às exigências organizativas. Se a CIP escreve «modelação remuneratória», o Governo chama-lhe «moderação salarial».
Mas, infelizmente, a realidade vai muito para além, Srs. Membros do Governo, dos frios dados estatísticos. A par da crescente precarização do trabalho vive-se hoje nas empresas e na Administração Pública um autêntico clima de coacção psicológica sobre quem trabalha. A falsa dicotomia emprego-salários apresenta-se agora despojada de qualquer retórica discursiva. Ou os trabalhadores aceitam redução de salários, rescisões forçadas de contratos, discriminação de salários ou são colocados no desemprego sem contemplações e muitas vezes, com dezenas de anos de trabalho, sem qualquer indemnização. Os dramas sociais e psicológicos multiplicam-se um pouco por todo o lado. É a chantagem erigida em política do Estado, bem exemplificado agora nas negociações salariais para 1994.
Na TAP já não bastava o regime de sucedâneo que fez regredir direitos aos longínquos anos de 68/69. Agora a proposta é de congelamento salarial até 1997 ou então não há dinheiro para o relançamento da empresa. Na CP criam-se 14 empresas a partir da própria empresa para fazer mais caro aquilo que era feito pelos trabalhadores da própria companhia. A Portucel, a EDP ou a Quimigal dão lugar a novas empresas onde os direitos anteriores dos trabalhadores não são garantidos. Na Siderurgia Nacional a perspectiva é de redução dos antigos 6 000 efectivos para 1 500. No sector mineiro, no têxtil ou na indústria vidreira a realidade é também a do encerramento de dezenas de empresas e mesmo, as vezes, do próprio sector e o despedimento de milhares de trabalhadores sem perspectivas de futuro. Nas pescas são quase 4 000 os trabalhadores no desemprego num universo de cerca de 38 000. Na Administração Pública onde, recordamos, o índice mais baixo é inferior ao salário mínimo nacional e onde continua por efectuar a revisão do sistema de carreiras, assiste-se, entre outras ilegalidades, à utilização de trabalhadores no desemprego para cobrir necessidades normais dos serviços.
Finalmente, para poder levar à prática a sua política de desemprego forçado, o Governo e o patronato precisam de procurar impedir os trabalhadores de protestar. E aí está, por isso, a violação sucessiva dos direitos dos dirigentes sindicais e dos membros das Comissões de Trabalhadores, a intimidação, o despedimento ou a tentativa de despedimento para os seus dirigentes mais combativos e destacados. O que se está a passar com os dirigentes da Associação Sindical dos Polícias Portugueses é um exemplo paradigmático do que afirmamos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: A grave crise social que se abate sobre o nosso País, com evidentes consequências no aumento da insegurança e da criminalidade, não é fruto nem exclusivo nem predominantemente da crise internacional que atravessa o sistema de economia capitalista. Natu-