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11 MARÇO DE 1994 1591

Convenção em apreço aparece, para ratificação, sem original e sem a indicação de quais os países que a ratificaram (já vimos que apenas a França a ratificou).
Surge ainda com um artigo 15.° que não é despiciendo referir de novo, apesar das explicações do Sr. Secretário de Estado, porque inequivocamente esse artigo 15.° diz que esta convenção vem, afinal, aplicar-se aos Estados membros signatários das outras que são referidas naquele artigo, entre as quais a Convenção de Estrasburgo de 1972, e vem colmatar qualquer vazio dessas outras convenções dos Estados membros. Ora, ainda não vimos aqui a Convenção de 1972, embora já esteja assinada por Portugal. Por isso, estamos, afinal, a ratificar uma Convenção que depois irá ser acrescentada a outra que ainda não está ratificada, o que efectivamente me parece subverter toda a ordem natural das coisas e me leva a dizer que o processo está errado.
Compreendemos que, ao fim e ao cabo, o que está por detrás desta Convenção e de outros instrumentos que aqui nos têm chegado é a construção de um espaço comum de perseguição penal a nível europeu, o que está relacionado, afinal, com o «terceiro pilar» da União Europeia, mas a verdade é que não existe, por não haver uma ordenação nestes instrumentos, uma visão global e de conjunto sobre o que se está a preparar.
Do que não há dúvida é de que entre um decreto-lei de 1991 que aqui ratificámos e a presente Convenção há uma diferença abissal, creio que para pior. De facto, esse decreto-lei de 1991 tinha uma malha muito mais apertada em relação às transmissões dos processos penais c protegia os direitos das vítimas. Como referi há pouco, só haveria transmissão no caso de estarem pagas as indemnizações ou no caso de as vítimas renunciarem à indemnização, o que não acontece com a Convenção em apreço. Embora no seu preâmbulo se diga que se pretende também acautelar os direitos das vítimas, o que surge no articulado e que os direitos das vítimas só estão acautelados em matéria de perseguição penal que poderá ser feita noutro país.
Em matéria indemnizatória, porém, é evidente que será extraordinariamente difícil, por exemplo, que uma vítima que esteja em Portugal e queira fazer valer os seus direitos na Alemanha venha a accionar o pedido indemnizatório no processo penal. O que consta do preâmbulo não corresponde, nesse aspecto, ao texto do articulado.
Para além disso, fui ler a Convenção de Estrasburgo de 1972 para ver se continha algum artigo que completasse os da Convenção em debate. Não basta - salvo, como é óbvio, melhor opinião - o que o Sr. Secretário de Estado referiu em relação à questão da audição do arguido para nos considerarmos satisfeitos sobre a questão de saber se estão ou não garantidos todos os direitos de defesa no processo penal, porque isso apenas se refere à audição do arguido, que é um dos actos do processo penal.
Por outro lado, nada nos garante que esse mesmo arguido possa ser contactado previamente, antes do interrogatório, pelo seu advogado, se, por hipótese, for detido num outro país que não contemple a possibilidade (sabemos que há casos desses) de existir urna comunicação entre o advogado e o arguido antes de este ser interrogado. Nem sequer essa garantia, em relação à audição do arguido, consta do texto da Convenção.
Mas o processo penal tem muitos outros problemas, entre os quais os relacionados com a própria audiência «e discussão e julgamento, nomeadamente a forma como
ela decorre e os princípios que a orientam. Não encontramos no texto qualquer reserva nessa matéria e nada que garanta que tais princípios serão respeitados.
São estas as considerações que, de uma forma geral, temos a fazer sobre a presente Convenção, que nos deixa algumas preocupações. Terminaria recomendando - se é que serve de alguma coisa- que as convenções passem a vir acompanhadas de um quadro com a indicação dos instrumentos com elas correlacionados e da data da ratificação por outros Estados, porque isso ajudaria bastante a reflectir sobre o assunto.

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Filipe Madeira.

O Sr. Luís Filipe Madeira (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estamos de acordo com a Convenção em debate, que resulta, aliás, da União Europeia e da sua dinâmica, também no aspecto da justiça. Nada temos a objectar, pois, quanto ao aspecto substancial. A meu ver, tudo está devidamente salvaguardado e nada há aqui que ponha em perigo o que para nós é essencial no piano dos Direitos do Homem, aceites e protegidos pela nossa Constituição.
Penso, no entanto, que talvez se pudesse melhorar alguma coisa em matéria de processo.
Na verdade, a convenção é omissa quanto à língua em que devem ser redigidos os documentos a dirigir ao Estado requerido. Penso que nesta matéria se está a cair num certo laxismo nos nossos tribunais. Assisto ultimamente, com surpresa e desgosto, a que os tribunais dão seguimento a cartas rogatórias que não vêm escritas em língua portuguesa. Trata-se de matéria em que devemos ser inflexíveis. O nosso Ministério dos Negócios Estrangeiros não deve aceitar uma carta rogatória dirigida a um tribunal português, especialmente sobre um cidadão português, se não vier acompanhada do texto em português. Esta questão tem a ver com a soberania nacional, com a nossa língua e com a protecção internacional do português.
Também aqui nada se diz sobre a língua em que o pedido deve ser dirigido ao Estado requerido, neste caso o Estado português, nem sobre se os documentos que integram o processo devem vir traduzidos. Penso que devem vir traduzidos, porque o Estado português não deve suportar os custos de uma tradução. Pelo contrário, deve neste caso encontrar-se um meio de estimular a protecção da língua portuguesa no estrangeiro, em especial nos países onde temos comunidades de emigrantes com número significativo, criando-se assim um estímulo suplementar para cultivar nas gerações - segundas, terceiras e quartas - o culto, o conhecimento e o domínio da língua portuguesa.
Outro ponto em que a Convenção é omissa é o da competência territorial. Qual deve ser o tribunal português competente para levar a cabo o requerimento? Porquê o Tribunal da Comarca de Lisboa? E se o perseguido viver em Angra do Heroísmo, em Cacilhas ou em Bragança? Por que terá ele de se deslocar ao tribunal de Lisboa?
Trata-se de uma questão - a da competência territorial do tribunal penal português - que não está resolvida, mas penso, Sr. Secretário de Estado, que ainda estamos a tempo de ponderá-la, porque se trata de aspectos que, ao contrário do que parece, não são tão despiciendos em termos, esses sim, de garantia dos direitos dos cidadãos, sejam eles nacionais ou estrangeiros.

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente (Correia Afonso): - Não havendo mais inscrições, dou por encerrado o debate da proposta de resolução n.° 50/VI.