2064 I SÉRIE -NÚMERO 62
no que a Assembleia da República se debruce sobre alguns dos aspectos que têm sido colocados e que o diploma em causa procura regular.
Aliás, o problema da protecção dos utentes em certo tipo de contratos com cláusulas de aplicação geral não é novo. Já foi objecto, recentemente, da Directiva n.º 93/13/CEE, do Conselho de 5 de Abril, que não foi transporta para o direito português - aliás já ultrapassámos o prazo - e foi também objecto do Decreto-Lei n.º 446/85, que, no entanto, não é aplicável a contratos regulados por normas de direito público.
O projecto de lei n.º 517/VI vem, de um modo geral, propor algumas medidas de protecção dos utentes e de reforço dos seus direitos e, em particular, regular os dados respeitantes aos assinantes e as chamadas de valor acrescentado, que, como é sabido, têm uma importância cada vez maior no quotidiano de muitos utentes.
Por isso, e sem prejuízo de uma ponderação de conjunto dos direitos e obrigações dos utentes de serviços telefónicos, de forma a assegurar a sua protecção tão larga quanto possível, julga-se que o projecto de lei n.º 517/VI vai ao encontro das preocupações que mais frequentemente se têm manifestado.
Também a 5.ª Comissão entende que ele satisfaz as condições regimentais para ser apreciado em Plenário.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, como autor do projecto de lei n.º 517/VI, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães, que dispõe inicialmente de 5 minutos, mas que poderá ultrapassá-los usando tempo global do seu partido.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Grupo Parlamentar do Partido Socialista reservou a ordem do dia desta reunião plenária para debater um projecto de lei que reforça os direitos dos consumidores de serviços telefónicos.
Trata-se de uma iniciativa - e apraz-me sublinhá-lo - que tem lugar por especial empenhamento tanto da direcção do meu grupo parlamentar como do meu próprio grupo parlamentar, considerando o relevo crescente que a situação destes consumidores vem tendo entre nós.
Na verdade, os portugueses precisam de comunicações telefónicas de qualidade, cobrindo todo o território em condições equitativas, abertas à modernização propiciada pelas inovações tecnológicas, criando auto-estradas que são, hoje já, em larga parte, digitais e que hão-de sê-lo mais, uma vez que os investimentos consideráveis que estão a ser feitos levarão Portugal à digitalização completa dentro de muito poucos anos. Somadas às auto-estradas digitais propriamente ditas, estas infra-estruturas constituem um elemento basilar para que Portugal tenha uma verdadeira e própria sociedade de informação a caminho do próximo século.
Trata-se de um domínio em que se assiste, à escala mundial, a uma das maiores explosões transformadoras, que vai deixar corripletamente para trás o panorama que nos habituámos a viver durante anos, no qual alguns monopólios - muito poucos - controlavam tudo, desde os equipamentos terminais até à prestação de serviços, sendo esses serviços diminutos na oferta ao público.
Nesse contexto, Portugal tem, neste momento, operado pela Portugal Telecom, um parque telefónico de 3,5 milhões de linhas, o que corresponde a uma média de 35 telefones por cada 100 habitantes.
A rede está digitalizada em certa de 70 %, em média, sendo, no entanto, 87 % na rede interurbana e 85 % na rede internacional.
No entanto, vai haver um conjunto de alterações e de melhorias nestes domínios e é fundamental, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que os consumidores sejam colocados no centro da reflexão sobre a problemática das telecomunicações em Portugal. Os consumidores devem estar no princípio e no fim da política de telecomunicações, mas o certo é que os consumidores, em Portugal, têm razões de queixa face à evolução do panorama das nossas telecomunicações.
Há, na verdade, Sr. Presidente e Srs. Deputados, neste momento, em Portugal, três tipos de consumidores e não apenas um. São eles: os consumidores em velocidade de luxo que, embora instalados em Portugal, consomem produtos telefónicos vendidos por estrangeiros, pagos em divisas, com facturação detalhada e várias regalias; os consumidores da rede móvel, também eles com serviços de alta qualidade, que explodiram em Portugal em condições extremamente positivas e tecnicamente exemplares; e os consumidores da rede fixa. E em relação a estes, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é preciso dizer que há um fosso crescente entre este tipo de consumidores e há um risco, que é o de as novas mudanças criarem ou acentuarem três velocidades e uma espécie de abismo entre os «info-ricos» e os «info-pobres» telefonicamente.
Na realidade, uns recebem facturação detalhada, têm acesso a serviços complementares, a serviços a montante e a jusante, a assistência, a qualidade elevada no serviço prestado e os outros sem caixa de correio telefónica, sem serviço de qualidade, sem assistência, sem apoio, sem facturação detalhada e outras regalias inevitáveis.
Ora, nós não aceitamos o estabelecimento e, menos ainda, o aprofundamento deste tipo de fosso e esta é a primeira mensagem que se desgarra deste projecto de lei do Grupo Parlamentar do PS.
Srs. Deputados, o projecto do Partido Socialista tem como alvo principal os consumidores da rede fixa e é um toque a rebate perfeitamente justificado, em primeiro lugar, porque a situação destes consumidores é regulada por uma manta de retalhos jurídica, datada de momentos diferentes, em grande parte inspirada ainda no velho regulamento de 1942, que foi revogado, na letra da lei, mas cujo espírito ainda povoa os corredores jurídicos do direito das nossas telecomunicações, manta de retalhos que é filha de uma cultura nos termos da qual o Estado e o operador telefónico eram tudo e o cliente, o assinante, o consumidor, era bem pouco.
É esse cultura, que não toma os utilizadores como verdadeiros consumidores com os seus direitos próprios, que é necessário alterar, e este projecto procura fazê-lo.
Em segundo lugar, Srs. Deputados, é preciso inovar, porque a explosão da pornografia telefónica tornou o Estado português, através da Telecom, proprietário de uma espécie de bordel electrónico, gerido com hipocrisia, alguma ganância e pouco respeito pela carteira dos cidadãos. É preciso, nesta matéria, tomar medidas. E eu atacaria, de imediato, esta segunda questão, os telefones ditos eróticos ou as linhas telepornográficas.
Neste domínio, Srs. Deputados, é preciso ter em atenção que a lei em vigor não é cumprida. Não há uma omissão legal absoluta, mas há uma omissão de cumprimento da lei, já que existe um tratamento desleal dos utilizadores por parte dos vendedores e uma indiferença do operador público em relação ao que acontece.
Se os Srs. Deputados tiverem em atenção o que se passa à nossa volta e tiveram ouvidos, podem escutar as coisas mais diversas...