308 SÉRIE - NÚMERO 9
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Castro.
A Sr.ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, quero agradecer à bancada do PSD que nos cedeu do seu tempo para este debate.
Começo por chamar a atenção para o facto de este projecto de lei do Partido Socialista retomar propostas de 1990 e 1992, portanto, tentar resolver por via ordinária aquilo que, por via constitucional, o mesmo partido tem vindo a rejeitar ao longo dos anos. Aliás, estas propostas viriam a ser alargadas para incluir a possibilidade de grupos de cidadãos poderem apresentar candidaturas a nível autárquico.
Assim, a primeira questão que tenho para colocar é a de saber por que razão o Partido Socialista opta pela via de não propor de modo alargado um conjunto de direitos que permitam aos cidadãos uma maior participação na vida pública do seu país, para mais estando em curso uma revisão constitucional. Poderá ser uma ideia simpática mas não é, seguramente, uma ideia que «vá adiantando», como se lhe referiu o Sr. Deputado Jorge Lacão. Não adianta nem deixa de adiantar; não vai ter qualquer efeito prático porque, antes das próximas eleições autárquicas, o processo de revisão constitucional estará concluído, como aliás hoje. foi reafirmado. Donde, não se trata de uma medida com efeito prático.
A segunda questão que nos parece enviesar este debate é o modo como ele é equacionado. Ou seja, diz-se que a apresentação de listas de candidatos independentes visa cessar um privilégio que, do ponto de vista institucional, apenas é concedido aos partidos políticos. Ora, não é esse o nosso entendimento. Na verdade, pensamos que não há concorrência, há complementaridade, há diferentes níveis de intervenção. Além disso, mantemos que do mesmo modo que os partidos, pequenos ou grandes, desempenham um papel na sociedade, que não é nem de primeira nem de segunda, mas que têm o estatuto e a importância que têm, também os movimentos de opinião e os cidadãos têm um papel a desempenhar.
E se estamos de acordo em que se alarguem as possibilidades de intervenção e se repense a democracia, garantindo novas formas de envolvimento dos cidadãos nas tomadas de decisão, através de consulta, parceria e igualdade de participação na vida do seu país e da comunidade, não nos parece, claramente, que seja este o caminho, nem que esta questão se ponha nestes exactos termos.
Há pouco coloquei uma questão ao Sr. Deputado Jorge Lacão e ele não me deu resposta, contornou a questão e, pura e simplesmente, disse nada. Volto, por isso, a repeti-la, porque a verdade é que temos hoje, ao nível das freguesias, uma experiência interessante, já com alguns anos, mas que não tem tido, aliás, grande expressão ou, melhor, é ainda pouco expressiva, que se prende com a possibilidade de listas de cidadãos concorrerem à autarquia freguesia. Permite-se assim, quer àqueles que se apresentam ao eleitorado, quer aos eleitores uma escolha consciente, na medida em que estamos a falar de um universo determinado, do ponto de vista tísico e geográfico, em que todos se conhecem e, nesse sentido, as escolhas são claramente colocadas.
Mas, Sr. Deputado Jorge Lacão, um projecto desta natureza suscita-nos algumas reservas numa autarquia como o município porque, como o Sr. Deputado sabe, estão em causa poderes muito amplos. Compete-lhe, designadamente, fazer o ordenamento do território, permitir
licenciamentos e, se assim quiserem aqueles que estiverem à sua frente, fazer com que, por exemplo, grandes interesses imobiliários nela se possam concretizar de modo irreversível, marcando a paisagem, destruindo o ambiente e deixando uma herança que, mais tarde, ninguém pode modificar.
Em primeiro lugar, tenho sérias dúvidas de que, de acordo com a forma como as eleições se fazem, grupos de cidadãos efectivamente independentes possam, sem os meios financeiros e logísticos próprios dos partidos políticos, concorrer às eleições em situação de igualdade e, em segundo lugar, o receio e a reserva que mantemos deve-se ao facto de nos parecer fácil, a pretexto de um grupo de cidadãos, conseguir que interesses de grupo e lobbies se instalem e possam ficar à frente do município.
Vozes do PCP: - Muito bem!
A Orador: - O nosso receio advém do seguinte: é que, mal ou bem, o voto é uma forma de aqueles que elegem poderem validar ou não aqueles que escolheram, ou seja, se o partido A ou B não assume os seus compromissos terá sérias probabilidades de não voltar a estar à frente do município. Mas um grupo de cidadãos que se instale, porventura servindo interesses que não aqueles em nome dos quais se apresentou e suportado por lobbies, por grupos de interesses, designadamente interesses imobiliários, ao fim de 4 anos sai com a maior segurança e impunidade e nem sequer a arma do voto poderá ser utilizada pelos cidadãos, porque se tratam de cidadãos que podem desaparecer sem rasto.
Estas são ainda questões que, para nós, se colocam de modo preocupante, tanto mais preocupante quando vivemos num pais onde o ambiente, o ordenamento do território e a qualidade de vida continuam a ser questões menores, acessórias e sem expressão; num país onde o ordenamento do território continua adiado e onde os direitos ambientais dos cidadãos não têm qualquer validade nem peso - como, por exemplo, o Ministério do Ambiente -, por forma a garantir que a legislação é cumprida. Donde, este tipo de malfeitorias, riscos e perigos colocam-se com muito maior dimensão no nosso país.
Em conclusão, o Grupo parlamentar «Os Verdes» vai manter a posição que tem adoptado ao longo dos anos, ou seja, vai abster-se em relação a este projecto de lei por considerar que ele não faz parte de uma intervenção global no sentido do alargamento dos direitos de participação dos cidadãos, que, aliás, não estão garantidos, por exemplo, em matéria de referendo para anteceder a adesão de Portugal à moeda única. E não estão garantidos porque, efectivamente, os direitos ambientais e o ordenamento do território não existem e são, infelizmente, letra-morta.
Aplausos de Os Verdes e do PCP.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Gonçalo Ribeiro da Costa.
O Sr. Gonçalo Ribeiro da Costa (CDS-PP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A Assembleia da República está, de novo, a discutir a questão das candidaturas de cidadãos independentes aos órgãos das autarquias municipais ou, numa nomenclatura que preferiríamos, as candidaturas de listas não partidárias.
Não deixa de ser sintomático que, apesar das repetidas profissões de fé de todos os partidos na bondade desta alteração do sistema eleitoral, este continue exactamente