12 DE MARÇO DE 1998 1607
to de 1995, que aprovou as conclusões da Conferência sobre Saúde Mental, realizada em Lisboa pela Direcção-Geral de Saúde nesse mesmo ano.
A confirmar esta necessidade legislativa, é a própria comunidade científica, clínicos, psiquiatras, psicólogos, que hoje reconhecem publicamente que esta proposta de lei do Governo vai de encontro às directrizes do Conselho da Europa e está em perfeita sintonia e conformidade com as mais recentes recomendações internacionais.
A Associação Portuguesa de Saúde Mental, em parecer remetido à Comissão Parlamentar de Saúde, considera que a proposta de lei n.º 121/VII constitui uma contribuição importante para o progresso da saúde mental em Portugal.
Em primeiro lugar, porque ao fim de largos anos de vazio legal em aspectos essenciais dos cuidados de psiquiatria e saúde mental, esta proposta vem abrir perspectivas para que esta situação, que tem causado prejuízos tão graves a doentes, a familiares e a técnicos de saúde, possa finalmente ser superada.
Em segundo lugar, porque a proposta de lei toma em consideração as principais questões que se colocam neste domínio, nomeadamente as que têm a ver com os princípios orientadores da prestação de cuidados de saúde mental, com os direitos dos utentes dos serviços de saúde mental e com a regulação do internamento compulsivo de doentes mentais.
Finalmente, a Associação Portuguesa de Saúde Mental refere que as soluções encontradas para os inúmeros e complexos problemas encontrados na elaboração de legislação adequada nestas matérias lhe parecem equilibradas, integradas nos princípios do ordenamento jurídico português e conformes às orientações provenientes dos organismos internacionais (nomeadamente o Conselho da Europa, a ONU e a OMS).
Contributos como o que acabamos de descrever permitem-nos, com a segurança dos saberes da comunidade cientifica e a determinação política da nova lei de saúde mental, colocar Portugal a par de outros países desenvolvidos em matéria de saúde mental. Temos a certeza de que vai ser, de facto, um importante contributo na modernização de toda a saúde mental em Portugal.
Srs. Deputados; parafraseando Miguel Torga «a angústia é a radical incomunicabilidade». Pela nossa parte, tudo faremos para que não caiamos nesta angústia.
A maioria das «perturbações psíquicas» das pessoas, tal como as do foro físico, são «resolvidas» em termos clínicos no patamar do médico de família - é preciso dizê-lo neste debate.
Nas situações perturbadoras do «equilíbrio» da pessoa, na neurose ou nas psicopatias mais sérias intervêm, concomitantemente ou subsequentemente, a psiquiatria e a psicologia. Estas justificam, por vezes, sempre em função dos critérios médicos, quase sempre pela vontade do próprio doente, tratamentos em regime de internamento. Menos vezes, mas também com maior gravidade e risco existencial da pessoa doente, as doenças só poderão ser controladas por internamento compulsivo.
Esta última situação, por se aplicar a pessoas em si mesmas prisioneiras das amarras da história natural da sua própria doença, limita-lhes o exercício dos direitos fundamentais, que carecem de ser protegidos judicialmente.
A sua fragilidade pessoal e social chega a ser impressionante, e por tão desprotegidas correm maiores riscos não só de saúde, mas também de toda a sua vida social.
Em jeito de aparte, refiro que li há dias, num livro de psiquiatria, que num qualquer ponto do Globo se suicida uma pessoa em cada 80 segundos. É algo que merece a nossa reflexão.
É obrigação da sociedade apoiar as pessoas que são vítimas de saúde mental e protegê-las com dignidade. É esse o verdadeiro sentido da presente iniciativa do Governo.
Assim, parece-nos importante que no Capitulo II da proposta de lei, o do internamento compulsivo, todo esse processo de internamento seja tratado com muito detalhe, com transparência e grande segurança jurídica, que tem a ver com o procedimento, os pressupostos, a legitimidade e o desenrolar do internamento involuntário dos doentes mentais.
Por outro lado, aquilo que alguns, com alguma nebulosidade, classificam de intromissão do poder judicial nesta matéria da saúde nem sempre tem sido explicado com seriedade.
A existência de mecanismos jurídicos é, em nosso entender, justificada e necessária, nas restritas condições que a própria lei propõe. Há grande rigor em todo o articulado da proposta, rigor processual, rigor em tudo aquilo que tem a ver com o respeito pela exigência do diagnóstico e de envolvimento dos médicos em todo este processo e fundamentalmente sempre a bem do doente, defendendo pessoas que, na nossa perspectiva, necessitam e têm direito a respeito e a defesa sob os pontos de vista social, político e ético.
Em matéria como esta, profícua em subjectividade individual, envolvendo um profundo alcance intelectual, humano, social, político e permitindo, legitimamente, diversos posicionamentos nos campos técnico, científico, social e político, a participação e a crítica séria, interessada no sentido de aperfeiçoar e melhor as soluções para os problemas de saúde é sempre bem-vinda.
Em sede de especialidade, o Partido Socialista tentará consensualizar esta perspectiva de benfeitorias à lei.
Pelo Partido Socialista, anunciamos desde já a intenção de apresentar algumas propostas de alteração em sede de especialidade, necessariamente em articulação com os Ministérios da Saúde e da Justiça, deixando em aberto possíveis pontos de consenso parlamentar.
Termino, reafirmando que o tratamento das doenças mentais é sempre um problema do âmbito da saúde, particularmente dos médicos e dos psicólogos, mesmo nas situações em que, por força da gravidade da doença mental e a indicação expressa dos psiquiatras, se tome necessária a intervenção judicial, nos termos da lei, para a determinação de internamento compulsivo de doentes mentais.
A saúde mental é simultâneamente complexa em todo o processo da prestação de cuidados, dos direitos, dos deveres, mas simples no entendimento do que é em si mesma um direito universal para o justo equilíbrio do indivíduo colocado perante a sua intrincada relação e inter-acção no plano da convivialidade social e do envolvimento cívico de cada um, como elemento activo, responsável, mais ou menos implícito em valores e princípios humanos, éticos, sociais e políticos tal qual a complexidade da vida em comunidade.
Nestas circunstâncias, mais do que colocar Portugal a par de outros países, importa tratar e apoiar as pessoas doentes, especialmente as que por mais gravemente doentes e desinseridas da vida familiar e social determinam que a lei permita defender as pessoas sem defesa, privadas temporariamente da liberdade e da capacidade de reconhecer a necessidade do tratamento para seu próprio beneficio.
Porque a proposta de lei corresponde a todo este vasto conjunto de princípios, de necessidades, de garantias, com