1608 I SÉRIE-NÚMERO 47
rigor, com segurança, com qualidade, o PS votará com satisfação, favoravelmente, a proposta na generalidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Saúde.
A. Sr.ª Ministra da Saúde (Maria de Belém Roseira): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Tendo agora oportunidade de intervir em relação à Lei de Saúde Mental, não posso deixar de orientar a minha intervenção para aquilo que ouvi até agora, nesta Assembleia da República.
Muito aqui se ouviu falar da desproporção, em termos de articulado, entre-a Lei n.º 2118 e a proposta de lei hoje submetida à vossa ,apreciação. Uma vez que já fizemos contas, pesos e medidas, gostava de dizer o seguinte: se bem repararem, na Lei n.º 21 18 há um único artigo sobre política de saúde mental, mais de 20 sobre a organização de serviços de saúde mental e 17 ou 18 sobre o tratamento e internamento compulsivo dos doentes mentais.
Ora, esta lei tem cerca de 35 anos, cumpriu o seu papel, mas passaram-se 35 anos! E 35 anos volvidos, o que é que nós vemos? Vemos uma proposta de lei com cinco artigos relativos à política de saúde mental, contra o único artigo que existia na lei anterior. Tendo em atenção aquilo que é saúde, que se mede muito mais pela qualidade do que pela quantidade, e sendo certo que não posso ter numa proposta de lei a maneira como se faz o tratamento, porque isso é assunto inter pares e que corresponde aos órgãos respectivos para a definição das legis artis, o que é que se verifica nesta proposta de lei? Um pendor bastante grande relativamente à preocupação da regulamentação dos direitos, liberdades e garantias, que é algo que pode ser posto em prática para conseguir o adequado tratamento destes doentes e, também, a defesa da sociedade, sem prejudicar os direitos dos doentes.
Assim sendo, esta proposta de lei, em termos de política de saúde mental - e penso que posso contar com a benevolência de todos os Srs. Deputados em relação a esta matéria -, consagra, pelo menos, quatro princípios fundamentais muito importantes e que nem sempre foram tão assumidos pelo conjunto da comunidade científica, social e política que se debruça sobre estas questões, que são: o tratamento próximo da comunidade corri a perspectiva da reabilitação e integração social; o internamento em hospitais gerais, fundamentalmente, e não em hospitais especializados, os quais, progressivamente, serão esbatidos no nosso tecido de internamento, para evitar a estigmatização; o reconhecimento dos direitos dos doentes, que corresponde a uma evolução muito grande e que, do ponto de vista ético, deve estar consagrado em termos de lei; a participação nos conselhos consultivos, quer dos doentes, quer das suas famílias, que era algo que não existia no ordenamento anterior.
Ainda em relação a esta matéria, a Conferência sobre Saúde Mental, promovida e presidida pelo Sr. Ministro da Saúde que me antecedeu, Sr. Deputado Paulo Mendo, foi importantíssima para se conseguir obter consensos nesta matéria e foi um forum de debate muito alargado e muito participado. Na sequência dessa Conferência, o Sr. Ministro da Saúde de então criou, em 23 de Agosto de 1995, a Comissão Nacional de Saúde Mental, a quem competia e vou dizer o essencial do despacho ministerial então exarado - «dar seguimento às conclusões da Conferência sobre Saúde Mental, nomeadamente no que respeita:
a) À necessidade de reformulação da política de saúde mental; b) Ao modelo organizacional de saúde mental e eventual revisão do Decreto-Lei n.º 127/92, de 3 de Julho, bem como da Lei de Saúde Mental; c) Ao desenvolvimento de um sistema de informação...», etc., pois o resto já é instrumental.
Ora bem, a maneira de dar seguimento - e por isso queria aqui dizer que o Sr. Deputado Jorge Roque Cunha só me ouve de vez em quando, não me ouve sempre...
O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Ouço-a sempre com muita atenção!
A Oradora: - Mas se o Sr. Deputado, me tivesse ouvido no Dia da Saúde Mental, quando, fiz uma intervenção, revendo-me e reafirmando estas conclusões da Conferência e o trabalho que tinha que ser desenvolvido nessa sequência, incumbindo a orientação desta matéria e o seu desenvolvimento à Direcção-Geral da Saúde, teria reparado que essa Direcção-Geral indicou os técnicos para, no cumprimento deste despacho ministerial, que continuou em vigor, darem seguimento ao que era a necessidade de reformulação da política de saúde mental, em articulação com o Ministério da Justiça, uma vez que aborda a questão dos direitos, liberdades e garantias. E esse desenvolvimento foi feito em grupo de trabalho, como é evidente, porque não se faz com todas as pessoas que participaram na Conferência, se bem que algumas delas tenham integrado este grupo, e na parte que respeita à saúde foi abordada a questão da política de saúde mental. E isto porquê? Se tenho a orgânica do Ministério da Saúde é de todos os serviços de saúde definida em decreto-lei, isso corresponde a uma evolução do que é a prática jurídica relativamente a normas que são- muito mais instrumentais, que estão sujeitas a evoluções que aconselham a que o instrumento jurídico que as aprova seja mais maleável. Daí que a organização dos serviços de saúde mental deva ser feita por decreto-lei, aliás, como é toda a orgânica do Ministério da Saúde de 1993. Por isso, não considero que deva ser feita por leia orgânica dos serviços de saúde mental, na sequência, aliás, das conclusões da Conferência sobre Saúde Mental, ao distinguir em duas alíneas, neste despacho do Sr. Ministro da Saúde de então, a política de saúde mental e a orgânica do ministério que lhe pode dar execução. Isso é muito importante e foi isso que se fez.
De maneira que gostaria de sublinhar que não é o número de artigos que importa mas o seu conteúdo qualitativo e aquilo que representa de: oportunidade única de se conseguir consensos em relação a uma matéria que, como todos sabemos, as variadíssimas escolas que se pronunciam sobre esta matéria divergem. Portanto, esta pode corresponder a uma ocasião histórica em Portugal para garantir o tratamento adequado das pessoas, para respeitar os direitos que lhes assistem e para lhes permitir também uma participação mais ampla neste domínio.
Gostaria também de referir que alguns aspectos que aqui foram levantados, nomeadamente o das comparticipações de medicamentos, e outros deste género, são objecto de regulamentação em decreto-lei. Não faz sentido estigmatizar, mais uma vez, em lei o tratamento separado dos doentes de saúde mental. Aquilo que é indispensável consagrar em termos de política são os princípios básicos fundamentais e esses estão reservados, porque são muito nobres, à nobreza do instrumento legislativo.
Gostava, ainda, de dizer o seguinte: o facto de esta proposta de lei ter sido apresentada há cerca de um ano, em Junho do ano passado, se não me engano, permitiu que,