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1876 I SÉRIE - NÚMERO 56

propõe à Assembleia é, em primeira linha, um voto de homenagem à democracia. Mas como nenhuma democracia se pode construir sem democratas, sem homens e mulheres concretos que se batam por ela e a pratiquem, esta homenagem é também dirigida aos congressistas de 1973.
No entanto, esse 3.º Congresso da Oposição Democrática, marco da luta contra o fascismo salazarista, não surgiu como oásis num deserto de passividade e conformismo. Captou e exprimiu uma energia democrática produzida em repetidos actos de resistência e potenciadora de um persistente sonho de liberdade que viveu longamente na maior parte do nosso povo. Há, pois, também neste voto uma saudação a um património acumulado de amor à liberdade que se construiu ao longo de quase meio século de ditadura. Saudação tanto mais apropriada quanto, verdadeiramente, ela se dirige ao que esperamos haver de melhor no nosso futuro colectivo.
Dentro desse espírito, não podemos deixar de evocar o simbolismo e o significado do facto de esse Congresso ter decorrido em Aveiro. Deu-se assim continuidade a uma generosa tradição de luta pela liberdade que, ao longo do tempo, aí amadureceu. Os congressos da democracia poderiam, é certo, ter decorrido em qualquer outro lugar, mas foi feliz a escolha de Aveiro que, assim, os colocou dentro do que de melhor tem a sua história como lugar de liberdade.
Hoje, sabemos que o 3.º Congresso da Oposição Democrática foi o prenúncio de um estertor anunciado do fascismo salazarista. Mas realizá-lo naquela época foi um acto de resistência e uma aposta na democracia, carregada de esperança, mas também determinada a persistir fosse qual fosse o tempo de escuridão que ainda nos esperasse.
Os esbirros e os corvos do fascismo estiveram desesperadamente activos nesses dias. Houve mesmo, nas ruas, demonstrações concretas de violência. As estradas foram bloqueadas. O regime, forçado à pequena abertura de autorizar o Congresso, temia-lhe as consequências. Tinha razão.
Se lermos hoje alguns dos textos mais consistentes apresentados ao Congresso, surpreenderemos neles múltiplos sinais, múltiplas propostas, muitas questões, que viriam a tornar-se-nos familiares um ano depois, após o 25 de Abril de 1974. Por exemplo, sem desprimor para outros e homenageando todos os que enviaram textos ao Congresso através dele, poderemos recordar a tese de José Medeiros Ferreira, que hoje se senta entre nós, em que se afirmava, como eixos projectivos, a necessidade de se descolonizar, de se democratizar, de se desenvolver. Ou seja, os célebres três dd que, pouco mais de um ano depois, viriam a marear profundamente o horizonte político português.
A memória dos actos futurantes é o contrário de um saudosismo imobilista porque nos recorda a vocação libertadora de tudo o que é humano. Por isso, recordamos esse Congresso homenageando-o, homenageando nele os sinais de democracia e liberdade que soube enviar para o futuro.
Mas, ao prestarmos esta homenagem, devemos também assumir com autenticidade que a democracia não é um estado natural que se colha através da passividade.
A democracia é a invenção da liberdade, o exercício da justiça, a disponibilidade para resistir aos seus inimigos. No fundo, é a ela que prestamos homenagem.

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foi há 25 anos que o fascismo, contra a sua vontade, foi obrigado a aceitar a realização do 3.º Congresso da Oposição Democrática que não foi um congresso qualquer.
Na sequência das eleições de 1969, em que a oposição abriu um novo caminho no combate à ditadura com base numa enorme imobilização da vontade popular, o 3.º Congresso da Oposição Democrática reuniu, de 4 a 8 de Abril, em Aveiro, mais de 4000 congressistas, dos quais cerca de 500 constituíam uma comissão nacional, que apresentaram quase 200 teses, metade das quais colectivas, com presenças de membros de todos os distritos do País.
O Congresso valeu por si, Sr. Presidente, como um acto que, seguramente, acelerou o caminho para o 25 de Abril. Mas valeu também por todo o trabalho preparatório e pela forma como se conjugou com outras lutas e outros momentos da luta contra a ditadura. Este foi o momento alto no caminho para a liberdade.
Nas suas três principais conclusões da declaração final, pode ler-se que o Congresso definiu como objectivos a luta pelo fim da guerra colonial, a luta contra o poder absoluto do capital monopolista, a conquista das liberdades democráticas. Muitas destas conclusões foram depois traduzidas no Programa do MFA, cerca de um ano depois.
O regime fascista temeu o Congresso e, por isso, desencadeou contra ele uma brutal repressão, traduzida na forte carga policial aquando da romagem à campa de Mário Sacramento, na manhã de um dos dias do Congresso, que produziu mais de 70 feridos.
Ainda hoje me recordo, Sr. Presidente, da forma solidária como a população de Aveiro nos abria as portas de suas casas para nos refugiarmos das bastonadas e das perseguições da polícia de choque.
Assim, não quero deixar de recordar neste momento todos quantos estiveram em Aveiro e todos quantos contribuíram para a realização do Congresso: os comunistas, seguramente, que tiveram um papel importante na preparação, na definição dos contornos e na mobilização popular. Mas os comunistas não estiveram sozinhos. Com eles estiveram os socialistas, muitos dos quais vejo sentados naquela bancada neste momento, os que na altura eram chamados católicos progressistas e muitos outros democratas que, hoje, se espalham pelas várias bancadas deste Parlamento.
É por isso, Sr. Presidente, que, neste momento, não posso deixar de associar-me a este voto que gostaria que, no respeito pelo espírito do Congresso, tivesse sido posto à assinatura das outras bancadas e de outros Deputados desta Assembleia.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Contudo, Sr. Presidente, neste momento em que comemoramos os 25 anos do Congresso de Aveiro, fica bem recordar o apelo final da carta-testamento de Mário Sacramento, que o Prof. Lindley Cintra citou na sua intervenção de encerramento do Congresso, que dizia: «Façam um mundo melhor, ouviram? Não me obriguem a voltar cá!». É para isso que aqui estamos e é para isso que temos de dialogar.

Aplausos do PCP, do PS, do PSD e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.