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1562 I SÉRIE-NÚMERO 42

Quanto ao primeiro aspecto, aquando da criação da ANA, em 1979, está afirmado no diploma que lhe deu corpo que a empresa deveria garantir, e cito: " o equilíbrio económico e financeiro da exploração da sua actividade, bem como a permanente melhoria da qualidade do serviço público prestado", com vista à prossecução das suas finalidades, que é o "serviço público de apoio à aviação civil", visando "orientar, dirigir e controlar o tráfego aéreo, assegurar a partida e chegada de aeronaves, o embarque, desembarque, encaminhamento de passageiros, carga ou correio", bem como o planeamento e construção de novos aeroportos.
Ora, a ANA tem tido uma muito boa performance económica, com resultados crescentemente positivos. Só na década de 90, e até ao final do exercício de 1997, a ANA realizou um volume global de investimentos de mais de 71 milhões de contos e obteve mais de 36 milhões de contos de resultados líquidos positivos. O volume de negócios ultrapassa, actualmente, os 50 milhões de contos por ano. A qualidade e eficácia do serviço levou a que o modelo da ANA tivesse sido. inclusivamente, assumido por outros países europeus.
Mas a ANA não é uma empresa qualquer; a responsabilidade pelas infra-estruturas aeroportuárias e pelo controle de tráfego aéreo envolve importantes responsabilidades de claro interesse público e, inclusivamente, de segurança do País. As interfaces entre as várias funções da ANA são numerosas e evidentes. Desdobrar a empresa em duas, com estatutos jurídicos diferentes, uma das quais (a ANA, S.A.) com o objectivo de privatizar a seguir, levará necessariamente à introdução de factores de instabilidade, sobreposição e confusão em funções onde hoje reina a estabilidade e a clareza. De tal modo que já foi necessário pôr em marcha a elaboração de um complexo protocolo entre as duas empresas para tentar definir quais as actividades técnicas e operacionais que cada uma deve assumir.
Mas tão ou mais preocupante que isto é o facto de esta situação fragilizar necessariamente a responsabilidade que hoje está atribuída a Portugal no controle do tráfego aéreo. Não será de estranhar que países como a Espanha ou o Reino Unido, que têm tentado retirar a Portugal o controle da Região de Informação e Voo Oceânico de Santa Maria, que compreende, como sabemos, os Açores e uma extensa zona do Atlântico Norte, voltem agora, com mais força, a colocar esta questão em cima da mesa do ICAO, tanto mais que a própria empresa a privatizar, tal como a NAV, E.P., ficarão, de facto e na prática, fora de controlo da autoridade nacional da aviação civil.
Segundo grupo de questões: quanto à precipitação e falta de transparência, os exemplos e as interrogações também são muitas.
De facto, não está sequer avaliado oficialmente o valor patrimonial da ANA, designadamente quanto aos terrenos afectos à sua exploração no Aeroporto da Portela. De tal modo foi a pressa que só depois de publicado o diploma de desmembramento da ANA e de criação das novas empresas é que, nos termos do artigo 26.º, será elaborada a "lista dos elementos patrimoniais a destacar da ANA, S.A. e os respectivos valores contabilísticos" que passarão para as novas empresas.
A razão é que não está ainda estabelecido nem o valor nem sequer, em grande parte, a titularidade da parte mais significativa do património, os terrenos afectos actualmente ao Aeroporto da Portela. É que parte deles, que foram objecto nos anos 40 de expropriação por utilidade pública para a construção do aeroporto, foram entretanto afectados à urbanização do Alto do Lumiar/Stanley Ho; outros são património do Estado, através da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil (hoje INAC); e, por último, outros há que, tendo sido expropriados e infra-estruturados pela Câmara Municipal de Lisboa, foram entretanto afectos à actividade aeroportuária sem que a autarquia tenha sido ressarcida ou indemnizada. Daqui decorre, aliás, uma acção judicial da Câmara Municipal de Lisboa contra a ANA, de valor superior a 100 milhões de contos, promovida ainda durante o primeiro mandato do Presidente Jorge Sampaio.
Como se vai transferir um tão valioso património para uma empresa a privatizar com um tão alto grau de indefinição patente, aliás, na entrevista que o Secretário de Estado dos Transportes deu ao Expresso, em 17 de Outubro passado? Mas mais: como é que se atribui, desde já, à empresa a privatizar a concessão do serviço público aeroportuário sem serem, sequer, previamente definidas as condições da concessão nem haver, consequentemente, sido celebrado o respectivo contrato? Qual é a razão de tanta pressa?
Terceiro grupo de questões: quanto à garantia futura dos direitos dos trabalhadores e repartição dos encargos, designadamente em matéria de fundo de pensões, as perplexidades são também enormes. Sabe-se que a insuficiência global dos fundos de pensões da ANA, E.P. é de 12,566 milhões de contos. É grande o "buraco"!
Sr. Secretário de Estado, tenho presente o memorando interno da administração da ANA com esses valores, que decorrem, como sabe, do estudo do BPI que o conselho de administração da ANA considera que é o reais adequado à situação. E grande o "buraco"!
Deste "buraco", 10,345 milhões de contos dizem respeito ao universo dos 850 trabalhadores que transitarão para a finura NAV, E.P. Mas deste "buraco", 9,363 milhões é afecto aos 300 controladores de tráfego aéreo.
Entretanto, a insuficiência restante dos fundos de pensões (2,221 milhões de contos) diz respeito ao universo dos 1500 trabalhadores que se prevê transitarem para a ANA, S.A., a empresa privatizar.
Tudo isto parecia claro até ao momento (11 de Agosto de 1998) em que, por acordo entre a ANA e o Sindicato dos Controladores de Tráfego Aéreo, seguramente com o aval da tutela, foi assumido que, na prática, o "buraco" dos 9,3 milhões de contos pode vir a ter que ser coberto pela empresa a privatizar, embora os controladores fiquem na outra empresa.
O insólito desta operação, a ser confirmada, é ver este Governo tão cioso dos resultados das suas privatizações poder vir a imputar a uma empresa que cria para ser privatizada um encargo de 9,363 milhões de contos que não lhe pertencem!
Todo este processo está claramente mergulhado num mundo de interrogações e de falta de transparência e só se compreende que tenha ido para a frente nestas condições a troco de alguma coisa: seguramente, em nossa opinião, a troco de garantias para os interesses envolvidos. E essa "alguma coisa" bem pode ser o negócio dos terrenos do Aeroporto da Portela, em plena Lisboa, associado à construção do novo aeroporto.
Vejamos: a nova ANA, S.A. a privatizar será detentora de 90% do capital da NAER, S.A., a empresa responsável pela implantação, gestão e exploração do novo aeroporto. E é evidente que a viabilização do financiamento do novo aeroporto poderá ter que vir a passar pelo encerramento