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1763 | I Série - Número 040 | 09 de Julho de 2005

 

Antes, em 1982, havia sido constitucionalmente consagrada a realização de referendos locais.
Com a abertura a instrumentos de democracia semi-directa, a Constituição mostrou sensibilidade à crescente importância desses mecanismos como método de escolha democrática e demonstrou estar à altura do seu tempo.
Desde o primeiro referendo, curiosamente um referendo constitucional, realizado em 1639; na América do Norte sobre as Fundamental Orders of Conneticut, este instituto teve um crescimento sustentado, por vezes perturbado. por usos mais ou menos antidemocráticos, que todavia não conseguiram impedir a sua actual pujança.
Em 1793, os revolucionários franceses incluíram-no na Constituição de então.
Na Suiça, o primeiro referendo nacional teve lugar em 1803. Sobre a Suiça sabe-se, aliás, que é frequente o recurso ao referendo de âmbito nacional. Os números comprovam-no: entre 1991 e 2003 realizaram-se 135 referendos de índole nacional.
Mas o fenómeno não é apenas suíço, é já europeu e mundial. Nesse mesmo período, de 1991 a 2003, repita-se, há registos de pelo menos 497 referendos de âmbito nacional, 301 dos quais efectuados na Europa. Mas assinalam-se, e sublinham-se, os 83 das Américas, os 54 em África, os 30 na Ásia e os 30 na Oceânia.
Mesmo em Estados onde tradicionalmente se considerava o referendo como incompatível com a democracia parlamentar, começaram a realizar-se referendos. Exemplar é a situação do Reino Unido onde, desde 1975, se realizaram sete importantes referendos.
Em Estados onde não há referendo de âmbito nacional, como os Estados Unidos da América ou a República Federal da Alemanha, recorre-se com frequência aos referendos locais. Nos Estados Unidos realizaram-se cerca de 10 000 referendos locais só em 2003, enquanto no Estado alemão da Baviera se efectuaram mais de 700 referendos locais desde 1995.
Olhando para as experiências dos Estados que conquistaram a democracia recentemente, reforça-se a convicção de que o instituto do referendo aparece normalmente associado à instituição da democracia nos tempos modernos.
Muitas das quase 30 constituições resultantes da queda do bloco soviético foram aprovadas por voto popular através de referendo e quase todas elas incluem mecanismos da chamada democracia semi-directa.
Esta pequena nota de índole histórico-constitucional permite comprovar que o nosso texto constitucional e a nossa lei ordinária procuraram acompanhar os ventos de aprofundamento e diversificação democrática que sopram noutros Estados.
Numa época em que por toda a parte se fala de défice democrático, de desprestígio das instituições políticas e de enfraquecimento dos governos nacionais, o referendo e outros instrumentos de democracia semi-directa aparecem como um utensílio incontornável.
Mas a consciência do favor crescente com que se olha para o referendo noutros países também constitui o pano de fundo de urna discussão que deveremos travar em Portugal. Sendo seguro que a nossa Constituição e a lei portuguesa são em termos nominais "amigas" do instituto do referendo, coloca-se uma pergunta: sê-lo-ão também em termos reais?
A verdade é que se conta pelos dedos das mãos o número de referendos locais tentados e realizados desde 1982 e quanto aos referendos nacionais apenas dois se efectuaram desde 1989, um dos quais - o da regionalização - de realização obrigatória.
As razões da reduzida utilização deste instituto serão seguramente de várias ordens - entre elas, porventura, a falta de hábito, alguma insegurança em relação aos seus resultados, suspeita da permeabilidade a manipulações, insuficiente participação nos referendos já efectuados, etc.
No caso do referendo nacional, sem dúvida que também pesa, porventura grandemente, o facto de o processo de convocação do referendo estar onerado e condicionado por uma série de limites materiais, formais e circunstanciais que torna muitas vezes impossível a sua oportuna convocação.
É sintomático que já tenham sido inviabilizados, por razões de ordem essencialmente formal, tantos referendos como aqueles que se realizaram efectivamente.
Atentando apenas nos limites ou trâmites formais, verifica-se que a convocação do referendo faz intervir sempre, pelo menos, três órgãos de soberania.
Tendo em conta os vários prazos previstos na lei para os actos praticados desde que um projecto de resolução de iniciativa do referendo é depositado por Deputados na Assembleia da República (e refiro-me apenas à iniciativa no interior da Assembleia da República), isto é, o prazo regimental para o agendamento em Plenário, a publicação em Diário da Assembleia da República, o prazo para o envio ao Tribunal Constitucional para fiscalização preventiva da constitucionalidade e da legalidade, o prazo para a decisão do Tribunal Constitucional, o prazo para a decisão de convocação pelo Presidente da República e o prazo para a realização do referendo a partir do acto de convocação, o processo de convocação do referendo poderá prolongar-se por cerca de seis meses.
E para isso é vital que a Assembleia da República não gaste muito mais do que os 15 dias regimentais para o agendamento e debate da iniciativa, o que nem sempre é possível, particularmente quando algum dos partidos suscita incidentes processuais que visem o atraso da convocação, como sucedeu recentemente