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1765 | I Série - Número 040 | 09 de Julho de 2005

 

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, devo dizer-lhe que grande parte da sua intervenção foi um verdadeiro exercício de mistificação. É que todos nós sabemos o que está em causa. O que está em causa para o Partido Socialista não é uma qualquer questão geral relativamente aos prazos referendários. É, sim, em primeiro lugar, não querer alterar a lei da interrupção voluntária da gravidez - esta é a primeira questão, a questão de fundo!
A segunda é querer pressionar o Presidente da República com uma alteração de prazos que permita colocá-lo perante o seguinte dilema: ou convoca o referendo nos termos em que o Partido Socialista alegadamente pretende ou fica responsável por não haver referendo até ao final do ano.
Se não fosse assim, por que é que os senhores iam alterar a lei eleitoral para o Presidente da República? Se o problema fosse apenas o dos prazos do referendo, por acharem que são demasiado extensos - e não se percebe como é que os senhores acham que são demasiado extensos e depois prevêem que possa ser convocado ao fim de 180 dias… -, então, por que é que alteravam os prazos para a eleição presidencial? Obviamente porque o que está aqui em causa não é um problema da lei do referendo ou da lei eleitoral para o Presidente da República mas as tácticas do Partido Socialista. Isto é, alteram-se os prazos em função das conveniências e das tácticas.
Simplesmente, fico com a sensação de que o Partido Socialista está tão tacticista que até tropeça nas próprias tácticas. Efectivamente, não se consegue perceber, mesmo com todas estas alterações de prazos - e talvez valesse a pena os senhores procurarem fazer um exercício prático dessa demonstração -, quando é que era possível realizar um referendo. É que, mesmo com todo este encurtamento de prazos e mesmo que toda a gente estivesse de acordo em prescindir de todos os seus prazos - quer o Presidente da República, não usando os prazos que tem para decidir, quer o Tribunal Constitucional, não usando o prazo que tem para se pronunciar sobre a constitucionalidade -, mesmo assim, fazendo essas contas todas, o que os senhores aqui vêm propor é a possibilidade de realizar um referendo na semana do Natal ou do Ano Novo. A não ser que os senhores demonstrem que não é assim.
E, então, pergunto: em que é que os senhores contribuem para a participação dos cidadãos - e importa lembrar que o referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez não foi convocado pelo Sr. Presidente da República, da última vez que lhe foi proposto, precisamente invocando a necessidade de assegurar que os cidadãos pudessem participar mais e melhor, através de um debate esclarecedor e atempado, num referendo de âmbito nacional, tendo em conta as experiências do passado, que não foram positivas em relação à participação -, propondo um referendo que, segundo pretendem, deve realizar-se ainda este ano, mas que, obviamente, mesmo "queimando" todos os prazos, não será possível realizar-se antes da semana festiva do Natal e do Ano Novo? Os senhores acham que há condições para poder realizar-se um referendo, sobre essa matéria, nessa altura?
Ou os senhores, mais uma vez, querem arranjar um subterfúgio para não decidir aquilo que tem de ser decidido, que é a Assembleia da República usar as competências e a legitimidade que detém para alterar a lei da interrupção voluntária da gravidez e acabar de uma vez por todas com aquela vergonha nacional que é as mulheres continuarem a ser levadas à barra do tribunal acusadas da prática do crime de aborto?
Esta é que é a questão e a esta é que gostava que os Srs. Deputados respondessem de uma vez por todas.

Aplausos do PCP e de Os Verdes.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Madeira Lopes.

O Sr. Francisco Madeira Lopes (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Vitalino Canas, estive a ouvir a sua intervenção e não posso deixar de concordar com o Sr. Deputado António Filipe, porquanto foi o próprio Partido Socialista, em declarações à comunicação social, que assumiu que pretendia alterar estes três diplomas legais com vista a poder realizar o referendo sobre o aborto ainda este ano. Portanto, é isso que verdadeiramente está hoje aqui em causa e não uma alteração a uma lei geral, como deveria ser. É porque, se fosse essa a intenção desta iniciativa, nesse caso, poderíamos discutir seriamente as propostas do Partido Socialista, mas, como o Partido Socialista não seguiu essa via, dificilmente poderemos ter um debate sereno sobre este projecto de lei.
Porém, da mesma forma que o Partido Socialista não conseguirá convencer os portugueses de que só trouxe a esta Assembleia a iniciativa legislativa para reduzir os privilégios dos políticos por trazê-la num contexto político em que reduz direitos dos trabalhadores, também não conseguirá convencer os portugueses de que há outra razão para trazer esta alteração legislativa, neste momento, a esta Câmara que não seja a de querer realizar o referendo sobre o aborto ainda no ano de 2005.
E com isto o Partido Socialista está a enjeitar as responsabilidades que competem a esta Assembleia depois das últimas eleições, com uma maioria clara de esquerda, uma maioria clara de partidos que defendem a despenalização do aborto, e a pactuar com a continuidade da situação vergonhosa em que vivemos.
De facto, depois de dar prioridade ao compromisso eleitoral do referendo em relação ao compromisso