0008 | I Série - Número 009 | 07 de Outubro de 2006
O Orador: - Acabou de dizer o Sr. Secretário de Estado quão preocupado está com as doações de pais para filhos e com a venda de imóveis que reverterá depois para os pais para não pagarem IRS.
Tomemos este caso concreto. Em que é que a proposta do Governo responde a esta fraude fiscal de que o Sr. Secretário de Estado está aqui a falar?
O Sr. Honório Novo (PCP): - Em nada!
O Orador: - Responderá que a proposta só é útil num caso: se o pai ou o filho reclamarem de decisão do fisco, que não sabe o que se passou e que, portanto, não pode investigar.
Não era possível, Sr. Secretário de Estado, em seis minutos dar-nos uma prova mais clara da incompetência técnica e da irrazoabilidade da proposta que o Governo faz!! O Governo justifica esta proposta de duas formas: ela pode reduzir a litigância de má-fé - mas não consta que haja abuso de litigância e, portanto, parece irrelevante desse ponto de vista; em segundo lugar, ela dá mais informação ao fisco - mas só quando o contribuinte suscita o acto investigatório através da sua reclamação. No caso que o senhor aqui referiu, desta fraude de que deu exemplo, a sua proposta de lei é absolutamente irrelevante!!
Mas vamos mais fundo. O Presidente da República, ontem, falou de corrupção e muitos juristas e muitos Deputados têm, com toda a razão, insistido no combate à corrupção. Sr. Secretário de Estado, pensemos alto sobre esse assunto: quando é que um corrupto é apanhado na rede tecida por esta proposta de lei? Só será apanhado caso reclame da decisão do fisco acerca do IRS que lhe é cobrado. Mas se o corrupto tiver a perspicácia de não protestar, de não reclamar ou de não impugnar, nunca a sua conta, que não bate certo com a do IRS, será identificada!!
Quando é que o narcotraficante será apanhado pelo levantamento do segredo bancário? Ou mesmo o utilizador do private banking, que recorre a fundos estrangeiros ou ao "off-shoring" para não pagar impostos? Quando é que esta lei permite diminuir os níveis de evasão ou de fraude fiscais em Portugal? Nunca! A não ser que o defraudador tenha a boa vontade de se "oferecer" ao fisco e de dizer: "Cá estou eu à espera que venham às minhas contas!"
O Sr. Paulo Rangel (PSD): - Isso é verdade!
O Orador: - Esta lei é gravíssima e os Deputados do Partido Socialista, que foram eleitos na base de um programa que dizia que no combate à fraude fiscal se aplicariam as melhores regras europeias, vão escolher precisamente as piores regras europeias?! Por que é que, quando há uma oportunidade única neste Parlamento para o que poderia ser um acordo entre quatro quintos da Câmara sobre um princípio sério de levantamento do segredo bancário, o Governo recua em relação ao que prometeu na campanha eleitoral, recua em relação ao que é pedido pela OCDE, recua em relação ao que é feito na maior parte dos países europeus e adopta um procedimento que sabe necessariamente que é incompetente?
O Sr. Luís Fazenda (BE): - Muito bem!
O Orador: - O Governo só tem um argumento para propor neste Parlamento, com vista à aprovação desta proposta de lei: "Aprovemos a incompetência!"
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Rangel.
O Sr. Paulo Rangel (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: O dia de hoje passará para os anais desta Assembleia como uma página negra na história do Estado de direito em Portugal. Insisto e repito, para que não sobeje qualquer dúvida: uma página negra para o princípio do Estado de direito.
A pretexto de melhorar o combate à fraude e à evasão fiscais, o Governo adianta a seguinte medida: sempre que um cidadão conteste uma decisão do fisco, porque a considera errada ou ilegal, e, em consequência, exerça o seu direito de reclamação administrativa ou de impugnação judicial, a administração fiscal pode, sem mais e só por isso, levantar o segredo bancário. Trata-se, do ponto de vista das garantias dos cidadãos, de uma medida intrinsecamente discriminatória e intimidatória, que viola ostensivamente o princípio da proporcionalidade.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Muito bem!
O Orador: - Trata-se de uma lei inaceitável, de uma lei intolerável, para recorrer à expressão dos homens da revolução americana perante a opressão e repressão fiscal do Parlamento inglês.