19 | I Série - Número: 064 | 24 de Março de 2007
O Sr. José Manuel Ribeiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O diploma do Partido Ecologista «Os Verdes» que hoje debatemos tem indubitavelmente algumas boas intenções, mas é imperfeito e está mal construído sob vários pontos de vista: jurídico, técnico e socioeconómico.
Na óptica jurídica, deve ser referido que se trata de um diploma que vem sobrepor-se a diversos instrumentos legais em vigor, relativos especificamente à conservação dos valores naturais. Sobrepõe-se ao Plano Sectorial da Rede Natura 2000, que estabelece as medidas de gestão mais adequadas para os diferentes habitats localizados nos sítios da Rede Natura.
As espécies isoladas ou de formação constantes do projecto de lei fazem parte integrante dos sítios da Rede Natura, pelo que medidas adicionais de protecção, a justificarem-se, estão plasmadas no plano que mencionei.
Nas demais áreas classificadas aplica-se o mesmo princípio: a carecerem de medidas específicas de protecção, estas encontram-se nos respectivos planos de ordenamento.
A negação dos princípios e trabalhos que estiveram na base da definição da Rede Natura 2000 é a negação da competência do ICN e do fundamento e aplicação da própria Directiva Habitats.
No caso de as referidas espécies se encontrarem fora de áreas classificadas, quer os planos de ordenamento florestal, quer medidas específicas, nomeadamente a protecção das galerias ripícolas, a protecção do sobreiro, da azinheira, do azevinho, etc., já prevêem a sua protecção.
Por outro lado, o diploma propõe a consignação de uma verba no Fundo Florestal Permanente para vários programas, dos quais chamo a atenção para dois: o «programa de reflorestação e manutenção de espécies autóctones, destinado a apoiar o fomento e a protecção dos povoamentos florestais de espécies protegidas da flora autóctone portuguesa, bem como a reflorestação de novas áreas, incluindo áreas ardidas, afectadas por doença, desérticas ou em processo de desertificação ou de erosão» e o «programa de subsidiação à plantação de espécies protegidas, a fim de incentivar o seu fomento por parte dos produtores florestais».
Contudo, deve ser referido que este projecto de lei colide com o Programa de Desenvolvimento Rural, pois, se a mesma fosse aprovada, assistiríamos à existência de duas medidas para a mesma acção no mesmo território, situação que, a verificar-se, irá contra um dos princípios basilares da atribuição de fundos comunitários.
A sobreposição de legislação poderá aumentar a miríade de diplomas que actualmente impendem sobre a floresta e espaços naturais, que têm tido como resultado repetidas interpretações jurídicas, por vezes dúbias e frequentemente contraditórias.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Mas as nossas divergências prendem-se também com razões técnicas, que seguidamente explanarei.
A responsabilidade de conservar e melhorar o nosso património de diversidade biológica deve ser um acto de lucidez, assumindo-se que alguns elementos daquela são mais importantes do que outros e que é irrealista pensar-se que todos os elementos de uma biota podem ser reabilitados e preservados.
As espécies a que o projecto de lei se refere, em qualquer das situações referidas no seu artigo 3.°, com interesse para a conservação por representarem ou integrarem sistemas naturais de valor ambiental relevante, foram identificadas no âmbito da transposição da Directiva Habitats, que já referi, tendo servido de base, entre outras, à delimitação dos sítios da Rede Natura 2000.
Os exemplares isolados que apresentam características individuais únicas ou raras encontram-se na lista de Árvores Monumentais que a Direcção-Geral dos Recursos Florestais mantém, sendo objecto de despacho do Director-Geral, publicado em Diário da República. A sua inclusão na lista é feita quer por identificação dos próprios serviços florestais, quer a pedido de particular ou de qualquer outra entidade, ou seja, já são objecto de medidas especiais de protecção.
Na perspectiva da exploração sustentável dos recursos naturais florestais agrícolas, deverão ser os planos de gestão florestal a determinar as medidas de gestão sobre as espécies abrangidas pelo projecto de lei. Estes planos de gestão são obrigatoriamente aprovados pela Direcção-Geral dos Recursos Florestais, pelo que não se justifica, nem abona para o bom funcionamento da Administração Pública e sua relação com os cidadãos, multiplicar a emissão de pareceres sobre o mesmo processo.
Obviamente, subentende-se que estes planos promovem a aplicação dos critérios e indicadores do processo Pan-Europeu, assegurando a gestão florestal sustentável, no respeito pela manutenção e melhoria da diversidade biológica, em harmonia com a sua viabilidade económica.
Acrescem também as nossas divergências socioeconómicas. Na verdade, a obrigatoriedade de reconhecimento de interesse relevante para a economia local nunca irá abranger os pequenos agricultores, que, no seu conjunto, são muitas vezes a própria economia local, porquanto se trata de agricultores em nome individual e/ou de empresas familiares.
Os critérios propostos para reconhecimento do interesse relevante para a economia local dificilmente poderão ser alcançados pelos agricultores, em particular aqueles que se referem ao número de novos postos de trabalho criados e à obrigatoriedade de parecer pelo Conselho Consultivo Florestal.
Compreendemos o projecto de lei do Partido Ecologista «Os Verdes». Tenta, mas sem o conseguir, preencher a incapacidade e a irresponsabilidade do Governo, em especial do Ministro da Agricultura.