6 | I Série - Número: 072 | 17 de Abril de 2008
Posto isto, vamos, então, dar início à discussão do projecto de lei n.º 509/X, para o que dou a palavra ao líder da bancada do PS, Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O casamento é, nos termos da lei, um contrato pessoal de quem pretende constituir família mediante plena comunhão de vida. Esta relação contratual, que assenta num princípio de igualdade entre as partes, tem como resultado que a sociedade conjugal deve manter-se enquanto for essa a vontade dos seus membros e tendo como consequência lógica que ninguém deve permanecer casado contra a sua vontade se se verificar uma ruptura definitiva das condições de vida em comum.
É este o quadro referencial do projecto de lei que apresentamos e que procura retomar o espírito renovador, aberto e moderno, que marcou há quase 100 anos a 1.ª República, e por isso adequamos a lei do divórcio ao séc. XXI e às realidades das sociedades modernas.
O Sr. José Junqueiro (PS): — Muito bem!
O Sr. Alberto Martins (PS): — Assim, em primeiro lugar, elimina-se a culpa como fundamento do divórcio sem o consentimento do outro, tal como ocorre na maioria das legislações da União Europeia, e alargam-se os fundamentos objectivos da ruptura conjugal.
Em segundo lugar, assume-se de forma explícita o conceito de responsabilidades parentais como referência central, afastando precisamente a designação hoje desajustada de «poder paternal», ao mesmo tempo que se define a mudança no sistema supletivo do exercício das responsabilidades parentais, considerando ainda o seu incumprimento como crime.
Finalmente, e reconhecida a importância dos contributos para a vida conjugal e familiar dos cuidados com os filhos e do trabalho despendido no lar, consagra-se, pela primeira vez na lei e em situação de dissolução conjugal, que poderá haver lugar a um crédito de compensação em situação de desigualdade manifesta desses contributos com vista a uma partilha equitativa e consistente.
Destacaremos agora, designadamente, as alterações mais importantes relativas ao regime vigente.
Primeiro, com a consagração da mediação familiar estimula-se a divulgação dos serviços de mediação familiar impondo uma obrigação de informação aos cônjuges por parte das conservatórias e dos tribunais.
Segundo, em relação ao divórcio, a grande diferença entre os dois modelos que agora propomos tem a ver com a existência ou falta de mútuo consentimento. Havendo mútuo consentimento, a ruptura definitiva da vida em comum é fundamento implícito e presumido. Não havendo mútuo consentimento, essa mesma ruptura deverá ser alegada, explicitando-se que radica numa das situações elencadas na lei e que passam a constar do artigo 1781.º No divórcio por mútuo consentimento elimina-se ainda a necessidade de fazer uma tentativa de conciliação, pois se havia motivos para duvidar da eficácia da exigência legal, essas dúvidas parecem mais consistentes quando os cônjuges estão de acordo na dissolução do casamento.
Os cônjuges não terão, por sua vez, de alcançar «acordos complementares» como requisito do divórcio, como hoje acontece. A dissolução do casamento passa a depender agora apenas do mútuo acordo sobre o próprio divórcio, cabendo a homologação desse acordo ao conservador do registo civil.
No regime actual, quando falta qualquer dos acordos ou pressupostos complementares, o pedido de divórcio é indeferido. Na realidade prática, os cônjuges que não logram obter algum dos acordos complementares simulam-no muitas vezes para não perderem a via do mútuo consentimento. Isto explica seguramente a razão por que muitos dos «acordos complementares» não são na prática, e mais tarde, cumpridos.
No regime proposto, o divórcio por mútuo consentimento assenta exclusivamente no acordo principal sobre a dissolução do casamento. Os «acordos complementares» deixam de ser condição de deferimento do pedido de divórcio. Faltando algum dos «acordos complementares» ou, caso algum dos acordos obtidos apreciado seja tido como insatisfatório, o pedido de divórcio tem de ser apresentado no tribunal para que, além de determinar a dissolução com base no mútuo consentimento, o juiz decida as questões sobre as quais os cônjuges não conseguiram entender-se, como se se tratasse de um divórcio sem consentimento de um dos cônjuges nas partes respectivas e relativas aos acordos complementares.