I SÉRIE — NÚMERO 110
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«O avião do Presidente da Bolívia, Evo Morales, proveniente de Moscovo com destino a La Paz, foi
impedido na passada terça-feira, 2 de julho, de fazer escala nos aeroportos nacionais, depois de ter sido
autorizado a aterrar para abastecimento, de acordo com o plano de voo, aprovado em 28 de junho, pelas
autoridades aeronáuticas portuguesas.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros, de forma vaga, alegou «considerações técnicas» para impedir
essa escala, ignorando o facto de se tratar da aeronave que transportava o Presidente de um país soberano
com o qual Portugal sempre teve as melhores relações.
A situação fere o direito internacional público e criou um incidente diplomático absolutamente
desnecessário, tanto mais grave porque atinge não apenas as relações com a Bolívia, mas também as
existentes com outros países da América Latina com os quais temos um relacionamento de profunda
cooperação e amizade, como é o caso do Brasil e da Venezuela, que num ato de solidariedade se sentiram
também atingidos pelo infeliz episódio. Acresce que organizações como a União das Nações Sul-Americanas
(UNASUL) ou a Organização dos Estados Americanos (OEA), bem assim como vários chefes de Estado,
individualmente, de países latino-americanos, manifestaram o seu repúdio e exigiram esclarecimentos pelo
sucedido.
Portugal não pode pôr em causa as suas relações diplomáticas com países com os quais a cooperação, a
par das excelentes relações comerciais, económicas, culturais e políticas, tem vindo, nos últimos anos, a
ganhar relevo e a intensificar-se em benefício mútuo.
Este lamentável incidente necessita de ser cabalmente esclarecido e, sobretudo, exige uma ação
diplomática imediata que permita ultrapassar de forma inequívoca o incómodo agora criado, não só em relação
à Bolívia como aos vários países da América Latina, com os quais é imperioso mantermos uma relação de
confiança e amizade, como sempre tem acontecido.
A Assembleia da República, reunida em sessão plenária, manifesta a sua incompreensão pela decisão do
Governo de proibir a aterragem nos aeroportos nacionais da aeronave que transportava o Presidente do
Estado Plurinacional da Bolívia e espera do Governo da República as explicações necessárias e devidas aos
portugueses e aos Estados amigos de Portugal, entre os quais a Bolívia, afetados com tal ocorrência.»
A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, vamos, então, votar o voto n.º 142/XII (2.ª), que acaba de ser lido.
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD e do CDS-PP e votos a favor do PS, do PCP,
do BE e de Os Verdes.
Segue-se o voto n.º 143/XII (2.ª) — De condenação pela atitude do Governo português de recusar o
sobrevoo e aterragem do avião presidencial da República da Bolívia em território nacional (PCP).
Peço ao Sr. Secretário, Deputado Jorge Machado, o favor de proceder à respetiva leitura.
O Sr. Secretário (Jorge Machado): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, o voto é do seguinte teor:
«A decisão das autoridades portuguesas de recusar o sobrevoo e a aterragem em território nacional do
avião presidencial da República da Bolívia, em que viajava o Presidente Evo Morales, provocou um incidente
político e diplomático de imensa gravidade.
Tal decisão, em linha com as decisões de outros países como França, Espanha e Itália, pôs em perigo a
segurança e a vida do Presidente Evo Morales — cuja aeronave onde viajava se viu obrigada a realizar uma
aterragem de emergência em Viena, após três horas e meia de voo —, consubstanciando um escandaloso ato
de provocação internacional e de intimidação contra o Presidente de um país soberano e um ato ilegal, à luz
da Constituição da República, das convenções internacionais sobre tráfego aéreo a que Portugal está
obrigado, bem como do direito internacional e dos acordos internacionais que dele decorrem sobre imunidade
diplomática dos chefes de Estado.
As alegações usadas para tentar justificar este ato, de que Edward Snowden estaria a bordo da aeronave
presidencial, são totalmente inaceitáveis e deploráveis.
A situação de crise política em que o País vive não pode servir de pretexto para a ausência de cabais
explicações, por parte do Governo português e do Ministro Paulo Portas, nem poderá servir para que não se
apurem todas as responsabilidades políticas e legais desta decisão.