I SÉRIE — NÚMERO 7
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A Sr.ª Catarina Martins (BE): — Vamos ver se nos entendemos.
Hoje de manhã, o Secretário de Estado da Cultura dizia que um dos problemas de financiamento da
Cinemateca era o universo das receitas ser pequeno face à alteração que houve e que é preciso alargar.
A proposta do Bloco de Esquerda hoje em discussão — não é a única que defendemos, mas é uma parte
— seria aquela, se as vossas palavras valessem alguma coisa, que os senhores e as senhoras teriam de
aprovar, porque é exatamente o que o Sr. Secretário de Estado da Cultura defendeu esta manhã. Não
quererem aprovar esta proposta significa somente que as vossas palavras não valem nada! São ações, sim! A
vossa omissão está a matar a cultura e as vossas palavras não valem absolutamente nada!
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Sr. Deputado Miguel Tiago, tem a palavra para uma intervenção.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: O PCP, Sr.ª Deputada Conceição Pereira,
entende a cultura como um direito e exatamente na mesma medida em que entendemos os restantes direitos
constitucionais. E, portanto, entendemos que também o Estado deve, através do Orçamento do Estado,
assegurar o financiamento da cultura.
É por isso — e a Sr.ª Deputada sabe que é por isso — que atribuíamos ao Estado uma responsabilidade
neste projeto de lei, que pode, por essa via, tornar mais gradual a entrada dos privados nesse financiamento.
Para o PCP valem mais, por exemplo, os 20% para a Cinemateca, que o PCP propõe, de um orçamento que
existe, que é o Orçamento do Estado, do que os 100% de um orçamento que não existe, que é a taxa que o
Governo ainda se recusa a cobrar.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exatamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Srs. Deputados, que fique claro o seguinte: os senhores propõem 3,5 €, para
já, a cobrar a um mercado (e que dependem da boa vontade desse mercado, como vemos, porque até agora
não mostrou grande boa vontade e, portanto, não há financiamento para ninguém); o PCP propõe que o
orçamento seja composto por 2,5 € a obter por essa via e por mais 2,5 € provenientes do Orçamento do
Estado, o que totaliza 5 €. Portanto, a Sr.ª Deputada não foi séria porque escamoteou o facto de o orçamento
que o PCP propõe ser ainda superior àquele que a atual lei consagra.
Srs. Deputados, julgamos que da parte do PSD e do CDS acabou por não ser dada aqui nenhuma resposta
para o problema: a Cinemateca, neste momento, está limitada ao seu espólio, inclusivamente não consegue
exibir obras de que poderia usufruir por empréstimos de outras instituições congéneres porque não tem sequer
meios para as trazer a Portugal; o Arquivo Nacional das Imagens em Movimento não está capaz de assegurar
a conservação do cinema que é produzido hoje em Portugal porque tão-pouco tem os instrumentos
tecnológicos necessários para abrir os discos rígidos gravados em digital, pelo que nem sequer pode ser
apurado o conteúdo que contêm.
Portanto, a resposta que se exigiria é bastante diferente daquela que o CDS e o PSD hoje vieram dar,
tentando até responsabilizar a própria Cinemateca e a sua administração pela situação.
Srs. Deputados, antes ainda do verão, em representação do PCP, eu próprio me desloquei à Cinemateca e
ao ANIM numa visita, e já nessa altura me foi dito que às várias tentativas para chegar a conversa com o
Governo, como Secretário de Estado e com as instituições da tutela nenhuma resposta tinha sido dada. Aliás,
a uma pergunta escrita do PCP, formulada nessa altura, o Governo responde apenas que irá resolver a
questão, nem sequer dizendo como.
O certo é que passaram julho e agosto e o problema não estava resolvido. A resposta foi precisamente a
luta, e o Governo rapidamente a tentou apagar. Esperemos que, desta feita, a Assembleia da República
reconheça que o Estado tem um papel perante a cultura e que o cinema é parte integrante da cultura. Aliás,
expressão também das conquistas do socialismo foi a grande dimensão e o grande alcance que ainda hoje
têm as obras de muitos realizadores soviéticos.