I SÉRIE — NÚMERO 70
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receando os resultados que podem advir da execução de medidas desta natureza, e outros, aparecem não
tendo a força suficiente para as defender.
Seja como for, a verdade é que esse trabalho é muito exaustivo. A Comissão recebeu nesse relatório não
propostas de decisão para futuro, porque os especialistas reconhecem que essa é uma matéria de decisão
política dos Estados que compõem a União Europeia, mas a análise dos termos em que pode funcionar cada
uma destas soluções. A saber, a criação de um fundo de redenção para poder fazer uma emissão solidária, a
longo prazo, da dívida que excede os 60% do rácio de dívida de cada país e soluções para a emissão de euro-
obrigações no curto prazo, ou seja, a um ou dois anos. Todas estas medidas vêm estudadas no relatório. Não
me cabe, evidentemente, estar a fazer uma análise pormenorizada de cada uma destas matérias, mas é muito
importante que o relatório, estando acessível e sendo público, possa ser objeto de estudo e de reflexão por
parte de todos os interessados.
Quero apenas ater-me às suas principais conclusões, que, julgo, são importantes para orientar a discussão
e as decisões que possamos vir a tomar.
Em primeiro lugar, as conclusões reconhecem que há um problema de herança pesada em matéria de
dívida soberana, que resultou de escolhas imprudentes feitas no passado e que foi aumentada, potenciada,
pela crise económica e financeira de 2008. Essa dívida, apesar dos mecanismos que foram encontrados no
seio da União Europeia, permanece como uma herança pesada. Indiscutivelmente, o que ajudaria à
normalização e à estabilização dos mercados financeiros e ao esforço que os países mais endividados
deveriam fazer para poder reduzir as suas dívidas seria a possibilidade de um fundo de redenção nestes
termos para poder ser adotado no futuro.
No entanto, as considerações principais feitas a este propósito — e deixo a questão das euro-obrigações
para o resto do debate — são as seguintes:
Em primeiro lugar, uma solução deste tipo, nas várias modalidades que foram avaliadas, só pode ser
prosseguida através de alterações aos tratados ou através de um tratado intergovernamental, isto é, à margem
do Tratado de Lisboa, sendo que, nesse caso, os problemas de natureza política que dificultarão a sua
execução são ainda maiores.
Em segundo lugar, qualquer um destes esquemas, fundo de redenção ou euro-obrigações, só pode
funcionar se existirem mecanismos robustos que impeçam ou diminuam o risco moral. Quer dizer, risco moral
entendido como o problema que pode surgir quando alguém altamente endividado escolhe as condições de
risco a que deve fazer a emissão da dívida e quando os que não estão mais endividados aceitam o peso, o
custo de suportar o seu pagamento, caso esses riscos se venham a concretizar.
Dizendo de outra maneira, não há uma solução sem a outra, ou seja, nenhum destes mecanismos pode ser
adotado sem se encontrar, em simultâneo, soluções que impeçam o risco moral. Para esse efeito, o relatório é
muito claro e, desse ponto de vista, também é unânime. Seria necessário encontrar condições muito
relevantes em termos de pré-requisitos e de disciplina orçamental para que um entendimento se gerasse em
torno desta matéria e para que este fundo de redenção pudesse funcionar.
Dito ainda de outra maneira, é claramente afirmado que princípios como a possibilidade de veto dos
Orçamentos aprovados nos parlamentos, a transferência de soberania — importante para a esfera europeia —
, de modo a penalizar, quer através de mecanismos automáticos de penalização e aumento das taxas de juro
para os incumpridores, quer de mecanismos ex ante que estabeleceriam um período de avaliação que os
países candidatos a esse fundo teriam de se submeter, todas estas condições dão uma noção clara de que
estes mecanismos, para poderem funcionar, têm de estar casados com mecanismos associados que preveem
a transferência de soberania (importante na área orçamental e económica) para Bruxelas e, ao mesmo tempo,
preservem a disciplina orçamental.
Assim, as duas principais conclusões-resumo aparecem no começo e no fim das conclusões.
Aparecem no começo das conclusões, quando se diz com clareza que estas soluções, estes mecanismos
de controlo da disciplina não podem dispensar durante muitos anos, nem substituir o esforço de redução dos
défices orçamentais e a criação de excedentes primários nos países mais endividados. Quer dizer, nenhuma
solução de fundo de redenção pode ser vista em alternativa aos esforços de redução dos défices e, portanto, à
necessidade de exibir défices primários positivos, excedentes primários.
A segunda conclusão, mesmo a fechar, é a de que, antes de avaliar devidamente os benefícios dos novos
mecanismos entretanto instituídos ao longo destes anos ao nível da zona euro e que, nomeadamente,