I SÉRIE — NÚMERO 75
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A exclusividade, Sr.as
e Srs. Deputados, não significa necessariamente mais trabalho ou melhor qualidade
nesse seu trabalho.
A exigência de democracia reside na avaliação que é feita em particular pelo povo da qualidade do trabalho
individual de cada Deputado.
Não pode haver maior erro, por mais justificável que seja, do que confundir a parte com o todo e querer
alterar o sistema representativo por causa de quem não o representa.
Não podemos, não devemos, particularmente nesta matéria, propor restrições desta natureza sem ter uma
justificação objetiva, razoável, proporcional e adequada. E aqui entra a ponderação não só do porquê mas do
para quê.
Sr.as
e Srs. Deputados, pela nossa parte, feita esta reflexão, percebendo que em causa está muito mais do
que o exercício do mandato de Deputado, está toda uma visão de democracia e de sistema representativo,
não temos qualquer melindre em afirmar que, a nosso ver, as soluções propostas — em particular a da
exclusividade — não parecem ser objetivas, razoáveis, proporcionais e, nessa medida, adequadas aos fins.
Partem de uma realidade que, se preocupante, baseia-se mais em perceções do que em factos, pelo que deve
ser lida sempre com algum cuidado.
Assumem um ponto de partida e de chegada persecutórios, uma presunção de culpa, com clara inversão
do ónus da prova em relação ao exercício do mandato de Deputado e à sua subjugação aos interesses
privados e ao poder económico.
Entendem, a meu ver de forma profundamente utópica e demagógica, que a transparência e independência
serão — e apenas podem ser — garantidas estando o Deputado a tempo inteiro e em dedicação exclusiva.
A este respeito o Bloco de Esquerda fala inclusivamente em «tolerância zero». Srs. Deputados e Sr.as
Deputadas, esta para mim, confesso, é uma novidade, pois falar em «tolerância zero» é admitir que o Bloco de
Esquerda reconhece e pratica essa tolerância e, a esse respeito, permitam-me clarificar que, da parte do CDS,
não há, nunca houve, nem nunca haverá, qualquer tolerância nesta matéria.
Resumindo: não nos parece que esta seja a melhor forma de qualificar a democracia. Estas propostas
afiguram-se inadequadas e ineficazes em função dos fins visados.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Anjinho (CDS-PP): — Estas iniciativas procuram legislar sobre algo que se situa no domínio
da ética e, nessa matéria, devemos ter em conta que o direito é e será sempre limitado.
E mais: nesta matéria devemos olhar para os instrumentos que temos e podemos e devemos fazer melhor,
nomeadamente no que se refere a clarificar os registos de interesses, de modo garantir maior acuidade e
transparência na atividade do Deputado e, obviamente, clarificar o exercício dos direitos e deveres dos
Deputados no quadro da fiscalização que decorre do Regimento e do mandato.
Termino, como, aliás, sempre terminei, dizendo que estamos disponíveis para discutir mais regras, mais
transparência, mas não estamos disponíveis, nem nunca estaremos, para restringir indevidamente, de forma
avulsa e incoerente, liberdades fundamentais.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma segunda intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João
Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados, relativamente à matéria da
exclusividade, quero dizer que o Grupo Parlamentar do PCP já apresentou, noutra ocasião, uma proposta
nesse sentido e mantemos a nossa convicção de que o mandato parlamentar deve ser a atividade principal, e
não secundária, de quem é eleito para essas funções e não deve ser instrumental de outras prioridades ou
interesses. Portanto, não discordamos do princípio que é afirmado pelo projeto do Bloco de Esquerda. De
resto, é prática dos Deputados do Grupo Parlamentar do PCP manterem a função de Deputado como a
principal função, e não como a secundária ou subordinada a outros interesses.