I SÉRIE — NÚMERO 75
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O Sr. Presidente (António Filipe): — Queira concluir, Sr. Deputado.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — … mas para funções de natureza privada, por exemplo. E é isso que faz
toda a diferença entre o vosso pensamento relativamente à sociedade e o nosso. O nosso é de homens e de
mulheres livres; o vosso não sei, tenho dúvidas.
Aplausos do PSD.
Protestos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Periodicamente, sobe ao Plenário
da Assembleia da República o debate sobre as incompatibilidades de Deputados e de altos cargos públicos e
a cena repete-se, e repete-se com a perda de força que resulta do facto de haver uma discussão sem ilação,
de haver uma discussão sem votação que culmine numa lei aprovada por uma maioria mais ou menos larga.
Aconteceu isso quando o projeto do Partido Socialista, no início da Legislatura — é no início da Legislatura
que estas coisas se resolvem para toda a sua duração ou, então, no fim da anterior —, que visava o reforço
das incompatibilidades, foi aprovado na generalidade, mas depois soçobrou, naufragou, na especialidade, na
1.ª Comissão, enfim de forma mais discreta, mas de forma eficaz.
A reforma proposta era no sentido de reforçar as incompatibilidades. E o debate na generalidade é
comovente — estive a relê-lo: houve, por parte de todas as bancadas, uma espécie de convergência positiva e
virtuosa, que depois se traduziu numa divergência, na hora de detalhar e de decidir, sem explicação bastante.
Ora, não é assim que as coisas se devem fazer.
Mas também não é deste outro modo: verifiquei, por uma rápida sondagem entre os elementos da
comunicação social, que estava muito espalhada a ideia de que o projeto do PCP e do Bloco de Esquerda
visava aplicar já uma série de restrições e impor já uma exclusividade a todos.
Lendo o projeto, tenho de fazer uma interpretação conforme à Constituição e entender que não visa aplicar-
se nesta Legislatura. Mas a dúvida pairou, e as pessoas perguntavam-me: «Diga lá, José Magalhães, se o PS
é a favor ou não de que se acabe já a situação de acumulação e que passe a haver Deputados em full-time e
a todo o vapor, todos e todas, sem exceção, com o mesmo regime». E eu respondia, sendo, em certo sentido,
o porta-voz dos autores do projeto: «Não, não, eles não têm essa ideia, isso é só para a próxima Legislatura».
Mas se é para a próxima Legislatura, para quê fazer esse debate agora?! Se é para a próxima Legislatura,
teremos ocasião de discutir muitos temas, designadamente estes, da reforma do sistema político, que
merecem discussão, mas não em cima de eleições, que são sempre más conselheiras, que fazem perder a
cabeça. Então, se o Governo anda de cabeça perdida, vamos deixar-nos contagiar?! Não, não nos deixemos
contagiar!
Portanto, a nossa ideia quanto a essa matéria é a de que esta é uma discussão absolutamente necessária
(tão necessária que nós próprios a trouxemos a Plenário na altura própria, e lamentamos muito que se tenha
perdido tanto tempo para chegarmos a um veredicto positivo), mas o Parlamento — e que, na sua génese,
está bem descrito na exposição sobre o 25 de Abril ontem inaugurada, e bem — não pode deixar que lhe
colem a imagem de que corta reformas, mas não é capaz de cortar privilégios. Seria injusto, porque temos
conseguido fazer reformas que cortam privilégios, e esse é o primeiro problema destas iniciativas. Não é
verdade que, nos últimos anos, não se tenham aprovado restrições importantes. Houve uma mudança positiva
e ela pode, dizemo-lo nós, ser ainda aperfeiçoada. E não nos limitamos a dizê-lo; propusemos iniciativas
nesse sentido e achamos que sabemos o que devemos propor para que isso melhore. Isso é muito importante,
mas é necessário ir mais longe.
Um segundo problema que se coloca é que o debate é feito com alguns cavando um fosso, que é um fosso
francamente desagradável e artificial, entre bancadas. É uma coisa do tipo: de um lado está toda a virtude e
do outro lado está todo o pecado — isto que estou a dizer é casual. É que, na realidade, não há fosso, aqui
não há fosso nessa matéria; Há divisões, há pontos de vista diferentes, mas não há fosso.