19 DE ABRIL DE 2014
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Ao longo dos anos, o PCP tem
trazido à Assembleia da República inúmeras propostas no sentido de enfrentar um problema que, não sendo
novo, tem sofrido significativo agravamento — refiro-me à ideia de existência de situações que configuram
promiscuidade entre o exercício de funções políticas, não só na Assembleia da República mas também no
Governo ou noutros espaços de exercício dessas funções políticas, e outro tipo de interesses que nada têm
que ver com os interesses que deviam nortear as decisões políticas, nomeadamente interesses económicos.
Esta ideia de promiscuidade entre os interesses económicos e o poder político é, de facto, uma ideia que
nem contribui para a melhoria da qualidade da democracia, nem contribui para que a democracia se reforce
aos olhos dos cidadãos.
O PCP, ao longo dos anos, tem apresentado propostas na Assembleia da República no sentido de garantir
que a lei impeça a existência destas situações, que, aos olhos dos cidadãos, são consideradas como
reveladoras de promiscuidade entre os interesses económicos e o poder político.
Temos sucessivamente apresentado propostas de alteração legislativa na Assembleia da República com a
noção de que nenhuma lei, por mais perfeita que seja, poderá evitar por completo a ocorrência dessas
situações. Obviamente, é necessária uma componente de prática pessoal para garantir que tais situações não
ocorram, mas o que sabemos também é que quanto pior for a lei, quanto mais insuficiente for a lei, mais
espaço haverá para que essas situações ocorram e para que, verdadeiramente, a promiscuidade entre
interesses económicos e poder político condicione as decisões políticas e as influencie no sentido de
beneficiar interesses económicos, interesses que não os do destinatário das decisões políticas, que é, afinal
de contas, o povo.
Sr.as
e Srs. Deputados, ao longo de anos, temos vindo a confrontar-nos com situações concretas que dão a
exata dimensão destes problemas. Por exemplo, situações de titulares de cargos políticos que, estando
impedidos de exercer uma determinada atividade ou de praticar determinados atos económicos, por via de
sociedades de advogados acabam por poder praticá-los, ou por via da sua participação em sociedades
gestoras de participações sociais (SGPS) acabam por fazer aquilo que a lei não permite que façam por si só.
Ora, esta é uma dimensão das propostas que hoje aqui trazemos.
As alterações que apresentamos ao Estatuto dos Deputados têm como objetivo impedir que por interposta
pessoa, por uma sociedade advogados ou por uma outra entidade, nomeadamente uma SGPS, os Deputados
possam fazer aquilo que, individualmente, o Estatuto dos Deputados não lhes permite.
Apresentamos propostas no sentido de desconsiderar a natureza jurídica da entidade por intermédio da
qual esses atos são praticados e de relevar, sim, o ato em si, impedindo que ele aconteça.
Apresentamos também uma proposta para alterar o Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos
dos Titulares de Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos no sentido de alargar de três para cinco anos o
período de impedimento do exercício de atividades privadas por quem exerceu funções públicas, isto é, o
período em que, depois, não pode exercer funções privadas no âmbito de empresas ou outras entidades com
as quais teve contacto ou com as quais teve de lidar no exercício das funções políticas.
Não é admissível que um ministro ou um secretário de Estado, a partir do momento em que deixa de
exercer essas funções, possa ser contratado por uma empresa com a qual teve de lidar no âmbito dessas
funções políticas. A verdade é que a lei já hoje não o permite por um período de três anos. O que propomos é
o alargamento desse período de três para cinco anos, evitando uma situação de ligação direta entre as
decisões políticas e a atividade económica ou o benefício económico.
Em matéria de impedimentos, estendemos as limitações que já hoje existem para empresas
maioritariamente públicas e institutos públicos a todos os seus órgãos sociais e não apenas a uma parte deles,
como acontece hoje. Clarificamos ainda a intenção de alargar a incompatibilidade que existe hoje no que toca
à presença em conselhos de gestão de empresas públicas, ou maioritariamente públicas, a todas as empresas
em que o Estado tenha parte do capital, mesmo que seja acionista minoritário, e determinamos que,
independentemente daquilo que possa ser a participação relevante, essa participação seja considerada,
mesmo sem a titularidade de 10% do capital social, para efeitos de aplicação do Estatuto dos Deputados,
nomeadamente em matéria de incompatibilidades.
Portanto, Sr.as
e Srs. Deputados, apresentamos um conjunto de propostas concretas que visam resolver o
problema da subversão do princípio constitucional de que o poder económico deve submeter-se ao poder
político. Efetivamente, com as situações de promiscuidade a que temos vindo a assistir são legítimas as