I SÉRIE — NÚMERO 47
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O Índice de Saúde Sustentável relativo a 2017 é inequívoco: nesse ano, 540 000 consultas hospitalares —
repito, 540 000 consultas hospitalares — ficaram por realizar por causa do preço dos transportes, ou seja, as
pessoas faltaram à consulta porque não podiam pagar o transporte não urgente, e outras 260 000 consultas
ficaram por realizar por fatores cruzados, entre taxas moderadoras e preço dos transportes. Não pode ser assim!
Não podemos permitir que assim seja!
Por isso, o Bloco de Esquerda apresenta este projeto de lei, para garantir que o preço do transporte não
urgente de doentes deixa de ser uma barreira no acesso à saúde.
A atual lei diz que pode estar isento do pagamento do transporte não urgente quem se encontrar em situação
clínica incapacitante e em situação de insuficiência económica, ou seja, estes dois critérios são cumulativos.
Contudo, alguém que esteja em situação clínica incapacitante mas não em situação de insuficiência económica
paga esse transporte e alguém que esteja em situação de insuficiência económica mas não em situação clínica
incapacitante também paga esse transporte. Portanto, o pagamento de transporte continua a ser uma barreira
para milhares, e milhares e milhares de pessoas em Portugal.
O que o Bloco de Esquerda propõe, com este projeto de lei, é que estes critérios deixem de ser cumulativos:
quem estiver em situação de insuficiência económica não paga — ponto final —, assim como quem estiver em
situação clínica incapacitante que justifique a necessidade de transporte não urgente não paga — ponto final.
O que propomos, com este projeto de lei, é da mais elementar justiça e vai no sentido de garantir o acesso
à saúde, para que, em Portugal, não fiquem centenas de milhares de consultas por realizar, devido a
incapacidade de pagar o transporte, e para que não haja milhares e milhares de utentes sem acesso à saúde
por não poderem pagar o transporte não urgente até ao hospital.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Luís Ferreira, de Os Verdes.
O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Ao longo dos
anos, ao longo do tempo, o transporte não urgente de doentes tem estado sujeito a várias alterações legislativas,
refletindo, aliás, as políticas de cortes e desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde e causando situações
dramáticas na vida de milhares de doentes.
Com efeito, os cortes efetuados na atribuição de credenciais de transporte representaram mais um golpe no
acesso dos utentes aos cuidados de saúde, promovendo graves injustiças sociais e comprometendo a natureza
universal dos cuidados de saúde e a respetiva acessibilidade.
De facto, a partir do momento em que as alterações realizadas passaram a garantir a isenção do pagamento
do transporte não urgente de doentes apenas nos casos em que, simultaneamente, se verificassem os
pressupostos da justificação clínica e da insuficiência económica, vários foram os casos denunciados pelos
próprios médicos, cujos doentes faltavam às consultas por incapacidade económica para pagar o respetivo
transporte.
Falamos de um problema que ganha especial dimensão nas regiões onde as condições socioeconómicas
das populações são inferiores e as distâncias impõem maiores dificuldades, o que, com a sentida falta de
transportes públicos, agrava ainda mais a situação dos utentes economicamente mais vulneráveis.
Acresce que o encerramento de dezenas de serviços de saúde, nomeadamente ao nível das extensões e
unidades de cuidados primários, em especial nas zonas do interior do País, e a consequente concentração de
especialidades hospitalares nos grandes centros urbanos obrigam a um esforço por parte dos utentes para
conseguirem comparecer nas consultas de que necessitam.
Isso é verdadeiramente inaceitável, sobretudo quando vários estudos, nacionais e internacionais, apontam
para a necessidade de se removerem os obstáculos financeiros no acesso aos cuidados de saúde no nosso
País. Mais: através do Índice de Saúde Sustentável 2017, apresentado pela Universidade Nova de Lisboa,
ficámos a saber que o impacto dos custos do transporte no acesso às consultas externas é quase o dobro do
impacto dos custos das taxas moderadoras, levando mais de meio milhão de utentes a faltar às consultas
externas nos hospitais exatamente por não conseguirem suportar os custos dos transportes.
Se é verdade que, no novo quadro parlamentar, foram já tomadas algumas medidas, como a reposição de
várias isenções ao nível do transporte de utentes ou a redução dos valores das taxas moderadoras, também é