I SÉRIE — NÚMERO 67
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Sr. Presidente, na nossa vida e na política também, não é muito comum dedicarmos tempo e esforços
significativos, envolvendo meios e pessoas, a produzir algo que, esperamos, não tenha efeito útil.
Esperamos que esta lei seja uma das leis mais inúteis da democracia portuguesa, seja porque se consiga
chegar a um acordo com o Reino Unido, seja porque o próprio Brexit não se venha a verificar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, para uma intervenção, a Sr. Deputada Isabel Pires, do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Secretária de Estado, Srs. Membros dos Governo, Sr.as e
Srs. Deputados: Hoje, vamos discutir e votar a proposta de lei do Governo relativa ao plano de contingência e,
na verdade, não é a primeira vez que estamos a falar deste plano no Parlamento. Obviamente, não podemos
deixar de referir que estamos perante um processo legislativo bastante anómalo e, aliás, ontem mesmo,
discutimos e votámos um texto de substituição para que hoje estivesse também aqui em debate.
Desde o início, soubemos todas e todos que, dado o resultado do referendo, as dúvidas surgiriam e aqui, no
Parlamento, muitos de nós, e por muitas vezes, temos vindo a questionar como é que o Governo português irá
lidar com a situação. Não necessariamente do ponto de vista negocial com o Reino Unido, porque isso nunca
se colocou em cima da mesa — essa seria tarefa a ser feita entre a União Europeia e o Reino Unido —, mas
sim sobre um processo que se queria com mais certezas do que incertezas e que se tornou numa roda-viva;
sobre o acordo e como é que ele seria; sobre se o acordo seria aceite ou não seria aceite; agora, sobre para
quando é que se adia, ou não, o Brexit —hoje mesmo, aliás, houve já a informação de que se fala, com mais
seriedade,na possibilidade de um novo referendo. Portanto, desse ponto de vista, politicamente, a incerteza
mantém-se.
Independentemente destes avanços e recuos, havia algo que os governos, a nível nacional, podiam e deviam
ter feito, que era dar garantias sólidas aos seus cidadãos sobre o que esperar desse mesmo processo. E esse,
do nosso ponto de vista, foi o ponto onde o Governo fraquejou. O plano de contingência, que só hoje iremos
votar, é o retrato desse atraso, desse deixar para a última hora, com o argumento de que teríamos de ver o que
iria acontecer para saber o que iríamos propor.
Mas já há vários meses era mais que previsível que a indecisão se iria manter por mais tempo do que aquele
que estava inicialmente previsto e alertámos, em várias ocasiões, inclusivamente o Sr. Ministro dos Negócios
Estrangeiros, para a necessidade de se tomarem estas medidas.
Mais, no Orçamento para 2019, fizemos uma proposta, que foi chumbada, para garantir, desde logo, um
reforço de pessoal consular que é um ponto de contacto fundamental para quase meio milhão de portugueses
e portuguesas no Reino Unido. Ainda hoje se verifica — ontem mesmo tivemos oportunidade de o verificar com
o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros — que este será um problema muito sério.
Sobre a proposta do texto de substituição que temos hoje para votação, foram ontem feitas várias alterações
relevantes, tendo sido algumas delas já aqui explanadas, mas parece-nos que a grande importância que este
plano tem prende-se com a questão da reciprocidade, que, na verdade, não ficou como reciprocidade, mas sim
como princípio do tratamento equivalente. Essa matéria também foi, desde do início, uma das grandes
preocupações levantadas pelo Bloco de Esquerda junto do Governo.
Lembramos que o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros disse, neste Parlamento, várias vezes, que os
direitos dos cidadãos eram a grande prioridade e que, mesmo que tudo corresse pelo pior, tinha a palavra de
Theresa May sobre o cumprimento desse princípio.
Já na altura, considerámos que era demasiado ingénuo fazer depender uma coisa tão importante da palavra
da Primeira-Ministra britânica. Aliás, mais recentemente, o próprio Governo português contradisse exatamente
isso, para explicar a importância deste plano de contingência.
O Sr. Presidente: — Tem de terminar, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Isabel Pires (BE): — Para terminar, Sr. Presidente, direi que é importante que possamos ter agora um
documento que assegure os direitos dos portugueses no Reino Unido e é importante, acima de tudo, que o