16 DE OUTUBRO DE 2020
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O Sr. Ricardo Vicente (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: Hoje, debatemos na Assembleia da República medidas concretas para responder ao desperdício alimentar. Mas, mais do que
encontrar soluções para absorver os desperdícios gerados pelo atual sistema alimentar, da produção ao
consumo, o que é verdadeiramente importante é debater o sistema alimentar que queremos para futuro.
Para o Bloco de Esquerda, este é o caminho da soberania alimentar, que se constrói com a democracia e
com a política pública que permita a regulação da produção e do mercado de bens alimentares.
À entrada de mais um quadro comunitário, sendo necessário definir uma estratégia para a aplicação da
Política Agrícola Comum em Portugal, o País terá de tomar decisões que terão consequências diretas sobre os
níveis de desperdício alimentar e sobre o ordenamento do território.
Defendemos a soberania alimentar com prioridade para os circuitos curtos. Lutamos por sistemas de
produção e processamento de alimentos de proximidade, que garantam a redução de desperdícios, a resiliência
do território e a mitigação das alterações climáticas. Propomos agriculturas diversificadas, com rotações e
consociações, e não podemos aceitar que se reduza a política agrícola à monocultura do olival, da vinha e dos
frutos vermelhos destinados ao mercado de exportação, promovendo a importação de tudo o resto. Os recursos
são finitos e, por isso, é preciso fazer escolhas claras.
No debate, na especialidade, do passado Orçamento do Estado, o Bloco de Esquerda propôs a criação de
um programa de reabilitação de mercados e feiras municipais, com a dotação mínima de um terço da área para
produtores locais, mas a proposta foi chumbada com os votos contra do PCP, do PAN e do PS.
O Bloco propôs também a obrigatoriedade de uma agricultura diversificada, com rotações e consociações
em todos os investimentos públicos de regadio. A proposta foi chumbada pelo PCP, pelo PS e por toda a direita.
Recentemente, propusemos o delineamento de um programa de transição ecológica e o fim do financiamento
público da agricultura intensiva e superintensiva. A proposta foi chumbada pelo PCP, pelo PS e por toda a direita.
Propusemos medidas de regulamentação do mercado para acabar com o abuso da grande distribuição, que
vende caro aos consumidores e paga miseravelmente aos produtores. A proposta foi chumbada com os votos
contra do PS, do CDS e do Iniciativa Liberal, enquanto o PAN, o PSD e o Chega ficaram a «ver a banda passar»
com a sua abstenção.
O debate do desperdício alimentar não se pode desligar destas escolhas estruturais sobre o sistema
alimentar que pretendemos para o futuro.
Hoje, entregámos um novo projeto resolução, também sobre medidas estruturais. Em 2012, o desperdício
alimentar por pessoa, na União Europeia, era de 173 kg por ano, representando 20% da produção alimentar
anual. O consumo doméstico e o processamento representavam 72% dos desperdícios alimentares.
Assim, as propostas agora apresentadas pelo Bloco de Esquerda têm mais duas dimensões: a primeira é a
de fortalecer o Serviço Nacional de Saúde para garantir o acesso e fortalecer as consultas de nutrição em todos
os centros de saúde, promovendo uma alimentação saudável e o melhor planeamento das refeições; a segunda
é a realização de estudos sobre a ocorrência de desperdícios ao longo da cadeia e seus potenciais de
reutilização e valorização, nomeadamente através da promoção de microindústrias de transformação,
conservação e valorização de alimentos que incorporem desperdícios alimentares.
A Sr.ª Alexandra Viera (BE): — Muito bem!
O Sr. Ricardo Vicente (BE): — Quanto aos projetos hoje em discussão, contarão com os votos favoráveis do Bloco de Esquerda, sendo que o projeto de lei do PAN deve ser revisto em vários domínios, em sede de
especialidade, nomeadamente nos artigos referentes à política fiscal.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Clarisse Campos, do Grupo Parlamentar do PS.
Faça favor, Sr.ª Deputada.