19 DE DEZEMBRO DE 2020
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Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para apresentar os projetos de lei do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda e participar no debate, tem a palavra a Sr.ª Deputada Maria Manuel Rola.
A Sr.ª Maria Manuel Rola (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A crise habitacional que já se fazia sentir foi agravada por esta pandemia.
Mas, se pedimos às pessoas que levem uma vida mais caseira e que tenham uma série de cuidados no
contacto com o exterior, só com a garantia de uma habitação digna é que terão condições para o fazer.
Imaginamos sequer o que é viver numa casa com infiltrações ou sem água ou luz? Ou a pagar valores tão
altos, que tememos a cada dia não ter onde dormir? Esta é a realidade vivida, e não imaginada, de um largo
conjunto de pessoas no nosso País. E esta é também uma falha nossa.
A habitação e as nossas cidades nunca deveriam ter ficado entregues ao mercado. O direito a viver
condignamente não se entrega aos mercados. Foi por isto que, em setembro, por proposta do Bloco de
Esquerda, aprovámos o prolongamento de vários prazos que regulam os contratos de arrendamento até 31 de
dezembro de 2020.
Esta não teria sido a nossa opção inicial. Mas, de facto, o Partido Socialista não esteve disponível, na altura,
para o que agora se constata ser evidente e uma urgência: à incerteza da pandemia temos de responder com a
certeza da proteção social.
Saudamos o Governo por ainda o ter constatado a tempo. Se Portugal é o país da Europa onde se fez sentir
maior perda de salário nos setores mais frágeis, também tem sido o país com menor mobilização de apoios.
Sentimos cada vez mais intensamente os efeitos de uma crise económica e só agora o Governo constata que a
pandemia não é facilmente controlável.
O Sr. Ministro Siza Vieira disse, neste Parlamento, na nossa última sessão plenária, que as decisões que
tomamos podem ter um impacto adverso que não calculamos, mas não decidir e não interferir tem também
impactos que o Governo não calculou. O Governo decidiu, assim, não apoiar as rendas comerciais das inúmeras
lojas no nosso País altamente dependentes do turismo. Controlou, e bem, os seus horários, mas não criou
nenhuma regra que reduzisse a especulação imobiliária e permitisse baixar o valor das rendas nesse mesmo
período.
É que, ao mesmo tempo que o País parava, que as pessoas ficavam sem trabalho, que os turistas não
vinham ou que as pessoas não gastavam, a especulação imobiliária continuou a faturar. No comércio ou na
habitação, os vistos gold estão como antes e os fundos imobiliários quiseram manter as suas rendas, a sua
voracidade. As empresas e os trabalhadores que criam riqueza em Portugal foram deixados às mãos dessas
entidades.
E perguntamos: é esta a economia frágil e desigual que queremos? O que aprendemos com a vulnerabilidade
agora evidente? Pois não podem os rentistas continuar a ganhar como se nada fosse, num país a braços com
uma brutal contração económica.
É isto que propomos: seja no comércio de rua ou no dos centros comerciais, se não há fruição do local
arrendado, é evidente que não se pode manter o nível de ganho com as rendas. Para além disto, não podemos
deixar o comércio nas mãos de entidades especulativas com poder de chantagem. Estender o período dos
contratos na mesma medida do tempo da redução da atividade económica não é apenas justo, Sr.as e Srs.
Deputados, é essencial para que estas empresas possam retomar a sua atividade sem a guilhotina do despejo
sobre os seus pescoços no período da retoma.
Salvar as empresas e os comerciantes do despejo, dar-lhes tempo e espaço para terem o mínimo de
capacidade negocial é também salvar a economia. Por fim, e porque o conflito e a ameaça têm sido uma
constante nestes processos de arrendamento, vemo-nos hoje chamados também a clarificar uma norma que
esta Assembleia aprovou, tornando claro que esta se aplica desde o início do primeiro estado de emergência.
Sr.as e Srs. Deputados, nada do que aqui discutimos hoje é novidade para nós. A necessidade de intervenção
do Estado está mais do que nunca evidente, da direita à esquerda. Ora, o que não se compreenderia era que
desperdiçássemos este momento, agora que está nas nossas mãos garantir justiça e proteção a quem vive e
trabalha em Portugal.