16 DE JANEIRO DE 2021
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No segundo objetivo, tornou-se visível que, com a adoção de «dupla grafia», se geraram muitas
ambiguidades e mesmo um caos linguístico.
Logo, a simplificação foi também um objetivo falhado.
No terceiro objetivo, verificou-se, com base em análises retroativas à sua aplicação, que a «ajuda» para
facilitar a aprendizagem do Português não precisaria de ser muita, dado que os erros ortográficos, de crianças
e de adultos em aprendizagem, não incidiam, com relevo, neste tipo de grafias.
Mas mais: dadas as ambiguidades geradas, os agentes de ensino nunca foram capazes de resolver as
dualidades e dificuldades criadas, tornando muito difícil transmitir informação segura e lógica aos alunos.
Assim, também a ajuda ao ensino foi um objetivo falhado.
Logo, a implementação deste Acordo acaba por se mostrar incompatível com os objetivos a que se propôs,
sendo fundamental proceder-se a uma avaliação da sua aplicação.
Não menos importante é o facto de, até agora, o Acordo Ortográfico de 1990 não ter sido ratificado por todos
os países. No âmbito da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa), o Acordo está em vigor em
Portugal, no Brasil, em São Tomé e Príncipe e em Cabo Verde, enquanto Timor-Leste e Guiné-Bissau apenas
o ratificaram, sem implementar. Falta a ratificação do acordo por parte de Angola e de Moçambique e
relembremos que, no Brasil, surgem várias reservas em relação à aplicação do mesmo.
Neste contexto, importa salientar que a ortografia — e o código linguístico, no geral — é uma das matrizes
de um povo e qualquer alteração desta natureza terá de ser feita de forma bem estruturada, coerente, participada
e acompanhada de uma avaliação séria de todos os seus impactos.
A verdade é que se desconhece qualquer estudo que ateste a viabilidade económica, o impacto social e a
adequação ao contexto histórico, nacional e patrimonial deste Acordo, além de nunca se ter conseguido, até ao
dia de hoje, a sua aceitação plena por largos setores da sociedade.
O que está em causa é a absoluta necessidade de se avaliar a implementação do Acordo Ortográfico de
1990, pois trata-se da defesa da língua portuguesa enquanto património cultural e, portanto, uma questão do
interesse público, devendo esse processo assegurar a participação da comunidade académica e literária e
delinear o caminho a seguir, através da correção dos efeitos negativos e, caso seja essa a conclusão, numa
situação limite, da orientação para a sua suspensão, acautelando todos os procedimentos para o imprescindível
acompanhamento e transição deste processo.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Rita Bessa, do Grupo
Parlamentar do CDS-PP.
A Sr.ª Ana Rita Bessa (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O chamado «Novo Acordo Ortográfico»,
que de novo tem muito pouco, uma vez que já passaram quase três décadas da sua assinatura pelos então sete
países de língua oficial portuguesa, continua, como se vê, a suscitar discussão e a gerar controvérsia.
A dinâmica que se gerou concentra-se em dois grandes blocos: os opositores, que apresentam um conjunto
de críticas relevantes e defendem a sua revogação imediata, e um bloco favorável, de quem considera positivo
e válido o passo dado.
Ao longo do tempo, e talvez pesando os custos da reversibilidade, parece ser crescente o número dos que
defendem a possibilidade, pelo menos, do aperfeiçoamento do Acordo Ortográfico de 1990. Mas, no mínimo,
passados estes anos, passados os problemas já reconhecidos e a falta de ratificação por parte de alguns países,
Portugal deveria ser capaz de avaliar o Acordo, os seus efeitos, a sua adesão e decidir.
Na Legislatura anterior, foi criado um grupo de trabalho para a avaliação do impacto da aplicação do Acordo
Ortográfico de 1990, coordenado pelo Sr. Deputado José Carlos Barros, do Partido Social Democrata.
Destaco, desse grupo de trabalho, três conclusões.
Em primeiro lugar, e apesar de o Acordo ter como objetivo a unificação ortográfica, a verdade é que a
lusofonia está atualmente dividida entre os países que o ratificaram, mas aplicam distintas versões do mesmo;
os que não o ratificaram e mantêm a ortografia de 1945; e os que o ratificaram, mas não o aplicam.
Em segundo lugar, não se conhecem estudos com envolvimento da comunidade científica sobre as
implicações do Acordo Ortográfico no sistema de ensino, no setor editorial e na estabilidade ortográfica nos
serviços públicos e nas publicações oficiais.