I SÉRIE — NÚMERO 13
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e sucessórios. Veja-se, Sr.as e Srs. Deputados, a imprevisibilidade que estas situações podem gerar no direito
sucessório.
O pai é, por definição, alguém presente na vida de um filho desde o seu nascimento e isso constitui um direito
elementar da criança do qual não podemos alhear-nos. Enquanto sociedade temos o dever de zelar pelos
direitos das crianças, conforme obriga e dispõe o artigo 3.º da Convenção sobre os Direitos das Crianças.
Por mais respeitabilidade e solidariedade que tais projetos parentais nos mereçam — e merecem! — e aos
quais somos até sensíveis, estes não podem nem devem sobrepor-se aos direitos da criança que serão, e têm
de ser sempre, o objeto da nossa maior proteção.
Dissemos também na altura, em sede de discussão na especialidade, que tínhamos sérias reservas em
relação à ausência de formalismos legais para a prestação do consentimento, em especial no regime transitório
que o decreto prevê, de aplicação retroativa, estabelecido apenas com o único propósito de acomodar um caso
concreto.
Sr.as e Srs. Deputados, dissemos tudo isto há precisamente um ano e mantemo-lo. Dissemos tudo isto
debaixo das acusações do Partido Socialista, que nos apelidava de «retrógrados» — vejam bem! —, como se
tratasse de uma questão de mera atualidade. Dissemos e tínhamos razão, porque todas estas questões foram
exatamente as questões suscitadas pelo Sr. Presidente da República, que solicitou à Assembleia uma maior
ponderação e reflexão sobre elas.
Acontece que exatamente hoje, por volta do meio-dia, nos chegou uma proposta de alteração,
consensualizada com o PCP, com o PEV e com o PAN que, em vez de estarem a procurar consensos naquilo
que diz diretamente respeito ao País e que é mais imediato, nos apresentam um consenso em cima do joelho
sobre as alterações a este decreto que implicam modificações ao Código Civil e que não respondem, de todo,
às interrogações que nos foram presentes pelo Presidente da República. Tratam, assim, este assunto com
absoluta banalidade, sem a ponderação de valores que o mesmo encerra.
Sr.as e Srs. Deputados, não é de somenos importância o salto que pretende dar-se ao permitir-se o
nascimento de uma criança de um pai que já faleceu, recorrendo a material criopreservado e ocorrendo o
nascimento depois da morte do pai. Por tudo isto, não pode o PSD acompanhar estas alterações, aliás, como,
de resto, não acompanhou sequer este decreto.
Aplausos do PSD.
A Sr.ª Presidente (Edite Estrela): — Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Bebiana Cunha, do Grupo Parlamentar do PAN.
A Sr.ª Bebiana Cunha (PAN): — Sr.ª Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Depois de ouvir estas duas últimas intervenções, nesta intervenção do PAN temos de lembrar que o recurso a técnicas de procriação medicamente
assistida, através da inseminação post mortem, após a morte do dador, surge de um movimento civil que traz a
esta Casa uma difícil situação pessoal e familiar, que é exigente, é certo, do ponto de vista legislativo.
Felizmente, houve quem, nesta Casa, procurasse dar a devida atenção a este problema e procurasse discuti-lo
e, após várias audições, encontraram-se as melhores redações possíveis para podermos, de facto, fazer
avanços numa nova visita à Lei n.º 32/2006.
Sr.as e Srs. Deputados, como sabemos — nunca é de mais lembrá-lo —, esta lei já permitia, felizmente, que
uma mulher recorresse a material genético de um dador anónimo, desconhecendo se o dador se encontrava
vivo, aquando da realização da técnica de procriação. Por outro lado, impossibilitava-se o mesmo procedimento
se o dador fosse alguém ou algum companheiro com quem tenha partilhado um projeto de vida comum e que
tivesse, de forma expressa, consciente e clara, consentido a conceção de um filho ou de uma filha.
Posso dizer que, felizmente, nesta Casa, houve partidos que procuraram fazer a correção necessária da lei,
prevendo, inclusivamente, a integração de um tempo mínimo para uma tomada consciente da decisão e,
também, devidamente apoiada neste processo, garantindo o direito de a pessoa nascida conhecer a sua
identidade, a sua historicidade e, também, o seu património genético.
Depois da pronúncia do Sr. Presidente da República, a verdade é que voltámos ao trabalho e procurámos
garantir e salvaguardar as preocupações essenciais vertidas no veto, nomeadamente as que se prendem com
as questões ligadas ao direito sucessório. Portanto, consideramos que, a partir do momento em que este