I SÉRIE — NÚMERO 14
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O Sr. André Ventura (CH): — O que é que Mário Soares diria disto?!
O Sr. Presidente (António Filipe): — Tem a palavra, para uma intervenção, pelo Bloco de Esquerda, o Sr. Deputado José Manuel Pureza.
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Disputar o passado é disputar o presente e o futuro. Este debate é sobre isso. É uma disputa retroativa do alcance da transformação da
sociedade portuguesa aberta pelo 25 de Abril que o CDS e o Chega querem fazer ao apresentarem, hoje,
estas propostas.
O Bloco de Esquerda aceita, com entusiasmo, esse desafio.
A ênfase celebratória dada pela direita ao 25 de Novembro é a forma que a direita tem de diminuir aquilo
que celebramos no 25 de Abril.
O que a direita pretende com o destaque celebratório do 25 de Novembro é que celebrar o 25 de Abril seja
celebrar um dia, mas não a rutura que esse dia abriu.
A direita nunca perdoou as mudanças fundas começadas em Abril. Nunca perdoou que a conquista de
direitos pelos de baixo não tenha sido apenas uma concessão limitada de direitos pelos de cima. Nunca
perdoou que essa conquista tenha sido, como sempre tem de ser, fruto de uma revolução com tudo o que as
revoluções têm de turbulência, de desinstalação, de crítica consequente dos poderes — os macro e os micro
poderes — instalados.
A direita nunca perdoou que o poder económico dos de sempre, que a dominação cultural dos de sempre,
que a quietude política pretendida pelos de sempre tenha sido radicalmente posta em causa.
Celebrar o 25 de Novembro a par da celebração do 25 de Abril é a expressão de uma vontade da direita de
apagar a Revolução, de a apagar no passado para poder mais facilmente apagar o que ela deixou para o
presente que temos e para o futuro que queremos.
A esse olhar revanchista nós opomos a lucidez corajosa que fez Jorge Sampaio cunhar com uma palavra
de ordem o mais ambicioso dos programas para a sociedade portuguesa: 25 de Abril sempre!
Nós não nos arrependemos dos caminhos de transformação caminhados depois de Abril, orgulhamo-nos
deles. Na habitação, nos direitos das mulheres, nas práticas educativas, no Serviço Nacional de Saúde, no
trabalho, nos bairros e nas aldeias, na política da terra, na determinação da vida de cada um e de cada uma,
as mudanças que foram conquistadas, e que a direita sempre abjurou, foram a liberdade a passar por aqui.
Sim, a direita combateu sempre — e combate aqui hoje outra vez — o sentido desafiante do que a canção
proclama: «Só há liberdade a sério quando houver a paz, o pão, habitação, saúde, educação. Quando
pertencer ao povo o que o povo produzir».
Não, os caminhos que andámos para se cumprir este enunciado não foram desvios ao 25 de Abril, foi o 25
de Abril a fazer-se.
A história que o CDS e o Chega querem entronizar com estas propostas é a história da normalização do
poder económico e social que foi abalado nas semanas e meses depois de Abril.
O que o CDS e o Chega querem que celebremos é o resgate do poder das famílias que eram donas do
País e que as privatizações trouxeram de volta, atapetando o caminho para a desvergonha de cambalachos
gigantescos, como o do BES (Banco Espírito Santo), que o País pagará durante décadas com o dinheiro dos
salários, das pensões e dos serviços públicos.
O Sr. João Cotrim de Figueiredo (IL): — Como a TAP!
O Sr. José Manuel Pureza (BE): — Quando Portugal se abeira de ter mais tempo de democracia do que de ditadura e se abeira do cinquentenário do 25 de Abril, é a história de uma Revolução, em toda a sua
dimensão, que somos chamados a celebrar. Sem nenhum pedido de desculpa. E com toda a determinação em
derrotar democraticamente os que gostariam que a Revolução, enquanto processo de mudança grande, não
tivesse acontecido. Mas aconteceu. E é isso que, deste lado, celebramos.
Aplausos do BE e do Deputado do PCP João Oliveira.