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26 DE JUNHO DE 1986

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PROJECTO DE LEI N.° 249/IV ELEVAÇÃO DA VILA DA MAIA A CATEGORIA DE CIDADE

1 — A Maia é indubitavelmente um dos mais velhos esteios da Pátria, cuja afirmação no mundo da história se esvai para além do próprio nascimento de Portugal.

Com efeito, nos dois séculos e meio que se alongam desde o avanço efectivo da Reconquista à linha do Douro até à constituição do Estado nos meados da primeira metade do século xn, a Maia assumiu um importante e significativo papel na vida política e social da região portucalense, intervindo, activa e às vezes decisivamente, nas questões internas da monarquia asturo-leonesa, ou leonesa-castelhana, numa afirmação autonómica que constituiria, como magistralmente inculca Paulo Merêa, o prelúdio da própria formação de um Estado no Ocidente da Ibéria.

E nos sucessos que levaram à autonomia política de Portugal, claramente simbolizados no recontro dos compôs de São Mamede, que teve lugar em 24 de Junho de 1128, «a primeira tarde portuguesa», como tão lapidarmente apelidou o evento o notável artista Acácio Lino, teve ainda a Maia um papel altamente decisivo.

Na verdade, como a história ensina, foram dois homens desta terra, ligados à mais velha aristocracia portucalense, Paio Mendes da Maia e Gonçalo Mendes da Maia, as figuras mais influentes na. organização e execução do golpe de Estado que alçou à chefia do ainda então condado o moço infante Afonso Henriques.

Ê bem conhecido neste contexto o documento celebrado entre o arcebispo Paio Mendes e o filho dos condes portucalenses, para o qual os mais sérios investigadores dos primórdios da história Pátria têm chamado a atenção, e que Alberto Feio, em designação lapidar, apelida de «acta da fundação de Portugal».

«A primeira tarde portuguesa» haveria de ter lugar dias após a subscrição de tal documento, e se o arcebispo da Sé primacial bracarense, Paio Mendes da Maia, se perfilava como o estratega da acção, que de resto vinha urdindo nos últimos anos do governo de D. Teresa e que agora teria o seu desfecho, seu irmão Gonçalo Mendes da Maia seria, como tão bem regista Alexandre Herculano, o chefe operacional que conduziu vitoriosamente a hoste do moço infante à vista do castelo vimaranense.

Portugal, governado e administrado por gente portuguesa, Portugal para sempre autónomo, começava então. E nesses primórdios, dois homens da Maia haviam jogado o papel fundamental na consumação da acção político-militar, que afastava definitivamente a área litoral ao sul do Minho do seio do Estado Leonês, dando corpo às aspirações, fundidas no tempo, dos povos do ocidente da Ibéria, que, ao longo dos séculos, como ensina Jaime Cortesão, haviam criado uma solidariedade própria, distinta dos da restante Península.

Por isso, pode dizer-se que a Maia é, indubitavelmente, um dos esteios mais velhos da Pátria.

2 — Área de grandes e seguras tradições, a Maia assumiu em todo o período da nossa história medieval e moderna um marcante e significativo papel.

Abrangendo então toda a região litoral que das estreitas muralhas do burgo portucalense escorria até ao curso do Ave, bem identificada como «Julgado da Maia» nas Inquirições do rei D. Afonso III a Maia receberia foral em 15 de Dezembro de 1519, concedido por D. Manuel I.

E por todo esse período são notórias as referências à uberidade dos seus campos e ao prolífico trabalho das suas gentes.

Na Maia abundavam os campos de trigo —o «trigo da Maia» — e abundavam os linhares, que criaram desde antanho uma remota e proliferada indústria artesanal, que tecia o velame que levava, mares além, as caravelas portuguesas à descoberta do mundo e ao desenvolvimento da solidariedade universal.

A partir do século xv são seriamente detectáveis correntes migratórias de gente da Maia com evidente interesse. Primeiro para as ilhas dos Açores, em especial para São Miguel, e depois, sobretudo a partir do século xvii, em especial para o Brasil, onde na Baía, no Mato Grosso, nas regiões amazônicas, em São Paulo e no Rio de Janeiro se estabeleceram colónias significativas de maiatos que deram nome a várias povoações do país irmão.

Em 1832 desembarcaram nas costas maiatas de Pampelido as forças liberais comandadas pelo Rei soldado, a esta velha terra, que vira nascer a Pátria nos alvores do século xn, foi a primeira de todas do Portugal eurocontinental a arvorar o pavilhão liberal, que simbolizava o fim do ancien regime e o começo do Portugal novo.

Em Pedras Rubras, Moreira da Maia, se instalou o primeiro acampamento de D. Pedro IV, antes da sua marcha sobre o Porto, que haveria de constituir, sobretudo desde então, o bastião da causa da liberdade, transportada no espírito renovador e aberto dos soldados liberais.

A reforma de Mouzinho da Silveira, concebida no figurino napoleónico, espartilhou o velho concelho da Maia, que viu boa parte da sua área ir engrossar os vizinhos concelhos do Porto, de Matosinhos, de Vila do Conde, de Santo Tirso, de Valongo e de Gondomar, alguns dos quais criados então. Reduzida, no espaço, às suas actuais dimensões nos fins do século xix, a Maia restou como a herdeira de uma rica área histórica e como o centro vivo de uma região cujas gentes sempre mantiveram, e mantêm, um marcado carácter antropológico-cultural.

3 — Ao longo do século passado, e em especial no decurso dos anos vintistas, foi-se transmudando o fácies social e económico do concelho.

Übere região agrícola no seu longo e remoto passado, a Maia foi ganhando progressivamente uma feição diversa.

Com efeito, aqui se criaram e desenvolveram em especial as artes de pedreiro, de carpinteiro e de estu-cador, pertencendo às mãos de inúmeros «artistas» maiatos a maior parcela das grandes obras de construção civil que fazem boa parte do rico e significativo património da vizinha cidade do Porto.

E, sobretudo a partir dos primeiros anos do corrente século, começaram a instalar-se na Maia algumas unidades fabris, então muito especialmente do sector têxtil.

Entretanto, em especial a partir dos anos 50. prosseguiu, cada vez em maior ritmo, a industrialização do concelho, facto que levou a que nos nossos dias