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II SÉRIE-A —NÚMERO 51

PROJECTO DE REVISÃO CONSTITUCIONAL N.fi 5/VI

Preâmbulo

O debate que decorreu na Assembleia da República, em 18 de Dezembro de 1986, sobre a ratificação do Aclo Único Europeu disse respeito ao ponto final da proeminência da lógica de mercado que anünou a CEE. Notámos, então, ser de «sublinhar ainda que a decisão que finalmente viabilizou a conclusão do Acto Único foi tomada contra a vontade de três países membros, uma novidade no sistema de integração europeia: Inglaterra, Grécia e Dinamarca.

Poderá isto significar que o sistema adquiriu uma lógica própria, que a assinatura necessariamente unânime do Acto confirma? Se esta pudesse ser uma conclusão do exame do processo, talvez devesse ser considerada a mais importante, porque seria um daqueles factos normativos contra os quais não podem, ou podem menos, teimar as ideologias, mesmo as constitucionais. Não existem, porém, neste domínio, conclusões seguras sem a confirmação da experiência posterior. E se o Acto Único aperfeiçoa um processo, não pode, todavia, garantir um futuro evidentemente condicionado por variáveis exteriores que o sistema não domina.» Foi essa uma das razões pelas quais se insisüu na necessidade de um debate nacional, dizendo: «O Acto Único Europeu, que motivou este debate, é um passo numa marcha que ainda será longa, porque ele não abrange a Europa toda, não inclui toda aquela que corresponde a definição de valores que proclama, nem aquela que está violentamente impedida de proclamar os mesmos valores. A nova maneira de ser Europa está longe de uma definição, por isso mais devemos reverenciar a coragem dos que não desistiram quando tudo parecia perdido, aproveitando o seu realismo para avaliar os resultados conseguidos. Nesta avaliação parece que devemos distinguir aquilo que respeita ás Comunidades, que vão constituindo a sua estrutura com experiência e prudência, e aquilo que diz respeito a Portugal, como país que enfrenta uma experiência nova. É nesta perspectiva que o debate aqui iniciado se deve alargar a um debate nacional, já que o acidentado percurso da adesão portuguesa foi dominado por exigências políticas que não deram espaço e tempo as reflexões que este debate deve ter a ambição de provocar.»

Por então o espaço privilegiado da pequena Europa das Comunidades estava protegido pela estrutura bipolar das alianças, que absorvia os debates ideológicos, e pareceu frequentemente uma reserva para o exercício resguardado da eurocracia. Todavia, a queda do Muro em 1989, retirando o amparo a que essa pequena Europa se encostava, fez com que ela caísse de novo no inundo, do qual a tinham retirado no «Ano Zero» europeu de 1945. A memória do prwesso histórico regressou à actualidade, e uma nova lógica, a lógica da segurança e da defesa, veio alterar qualitativamente os termos de referência, com um desafio concreto, que foi o da intervenção contra o Iraque. Ganhou consistência um discurso que aplicava á Europa todos os conceitos historicamente usados para dinamizar os orgulhos nacionais, omitindo sempre que essa Europa, com unidade política e, eventualmente, com tambor e bandeira, não existia. Era um nominalismo e, talvez, o anúncio de um projecto.

Desde então o CDS fem mantido a linha que a seguir repete:

Tendo presente o que se passa com a dissolução da Jugoslávia, parece oportuno lembrar que o grande tema secular de sociedade política europeia foi o de conseguir eliminar as causas da guerra entre os seus povos, essa guerra civil que, por duas vezes, foi chamada mundial pelos efeitos e não pelas causas e agentes.

Também por isso não vale a pena esquecer que o primeiro dos objectivos do europeísmo pragmático foi o de tomar impossível um novo surto de agressividade.

No discurso de 19 de Setembro de 1946, Winston Churchill, então simples deputado, dizia: «Os combates cessaram, o perigo não desapareceu. Se devemos criar os Estados Unidos da Europa —qualquer que seja o nome que lhe derem —, devemos começar imediatamente. Vou dizer-vos qualquer coisa que vos espantará: o primeiro gesto de reconstrução da família europeia deve ser uma aliança entre a França e a Alemanha.» A mesma linha em que, no discurso de 15 de Maio de 1962, De Gaulle, o da Europa d;is Pátrias, declarava que a segurança da França e da Alemanha dependia da sua solidariedade e que desta dependia «toda a esperança de unir a Europa tanto no domínio político e no domínio da defesa, como em termos económicos».

Foi a mesma questão que determinou a criação, ein 1946, da Autoridade Internacional do Ruhr, encarregada de assegurar a repartição internacional do carvão e a desnazificação dos Europeus, e que levou Robert Schuinann, no seguimento das propostas de André Philip, a querer a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, que agrupou, pelo Tratado de 18 de Abril de 1951, a Alemanha, a França, a Itália e o Benelux: «Deste modo se retirava à soberania alemã a gestão do arsenal de guerra que a França temia, assegurando, porém, uma igualdade de direitos que salvaguardava os melindres nacionalistas na medida do possível.»

Não é necessário gastar mais algum do nosso tempo a recordar o processo, porque é suficiente deixar claro que o movimento unificador europeu leve a segurança e defesa entre as causas primeiras, para nos ajudar na percepção de que o salto qualitativo da agora tem a segurança e defesa entre as questões principais. O retomo dos nacionalismos, das incompatibilidades étnicas, culturais e religiosas, ao mesmo tempo que crescem sinais de desagregações comuiialistas de Estado que supunham definitiva a unidade política alcançada, aconselham contra o lunhicnle de feliz fim tecnocrático da História com que algum discurso oficial parece reduzir os problemas à política orçamental, ás taxas de câmbio, à inflação renunciada, à inoeda única, à original caracterização da espécie de federalismo político em perspectiva pela percentagem dos custos comunitários sobre o produto.

Foi a questão do carvão e do aço que inspirou a Jean Monnet a primeira resposta eficaz para redefinir a soberania, que foi a das autoridades funcionais. Para tirar à Alemanha a base da reconstituição de um novo complexo militar industrial, a Alta Autoridade assume a gestão dos interesses retirados à soberania, mas o poder que exerce não é soberano. Porque o método de aliança clássica veio • responder aos problemas dc segurança e defesa atlânticas, foi possível adiar a questão da soberania. Tiúvcv. pwssa. dizer-se que. ao tentar racionalizar a situação com o recurso aos nominalismo*, a nova etapa, como que desleiteando a longa doutrinação europeísta, parece às vezes caracterizada agora por uma política à procura de uma ideologia.