19 DE ABRIL DE 1997
573
Diga-se que a solução encontrada pela maioria dos municipios parece ser a mais consentânea com a exigencia da sua capacidade financeira e respectiva viabilidade, nomeadamente quando exigem, por um lado, e tratando--se de empresas que tenham como objecto social o exercício da actividade de aluguer, que tenham a sua situação contributiva regularizada perante o Estado Português, quer no âmbito fiscal quer da segurança social, e, tratando-se de empresário em nome individual, que a pessoa colectiva se encontre colectada para liquidação de IRS.
Determinação do regime de acesso à actividade profissional de condutor de transportes de aluguer em veículos ligeiros de passageiros:
Desde logo, no artigo 7.° a autorização para o exercício da profissão de condutor de transportes de aluguer só pode ser concedida a quem possuir certificado de aptidão profissional emitido pelo MEPAT nos termos a regulamentar.
No entanto, a acrescer aos demais impedimentos, fica igualmente inibido de exercer a profissão quem tenha sido condenado por crimes que, nos termos do Código da Estrada, impliquem a perda da licença de condução ou de condenação definitiva em pena de prisão por período não inferior a seis meses por roubo, burla, abuso de confiança, ofensa ao pudor, infracção à legislação em matéria de estupefacientes ou por ofensas à integridade das pessoas.
Se bem que, face às infracções sancionáveis pelo Código da Estrada, se reconheça a necessária conexão, já no que respeita aos impedimentos pelas demais condenações parece ser excessivo que as mesmas constituam impedimento, a não ser em casos extremamente graves e manifestos.
É que a restrição assim feita parece colidir com o disposto no artigo 47.° da Constituição, que estabelece o princípio da liberdade de .escolha da profissão, com o princípio da proporcionalidade (ao estender-se os impedimentos à aplicação de sanções, algumas delas acessórias da pena principal), ao princípio da não discriminação (por não graduar as medidas e a gravidade das mesmas) e, ainda, dos princípios sociais da ressocialização e da integração dos Cidadãos na vida acúva de forma a permitir o restabelecimento de uma vida comum.
De salvaguardar ainda que, nos termos do disposto nos artigos 150.° e 151.° do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 114/94, de 3 de Maio, há sempre possibilidade de obter nova carta ou licença se o indivíduo for aprovado em exame especial, o que comprova que a própria lei em vigor entendeu por bem estabelecer um regime flexível em matéria de licenciamento de condução.
O artigo 9.° prevê a aplicação de um regime de «exclusividade» ao condutor de transportes de aluguer, ao proibir que o mesmo exerça qualquer outra actividade remunerada por conta própria ou por conta de outrem.
Estando em causa o exercício de uma actividade que se pretende seja exercida de uma forma segura e zelosa, livTe de excessos e arbítrios, parece, no entanto, ser excessivo e conflitual com o direito ao trabalho pretender que a mesma seja exercida em regime de exclusividade.
O projecto em apreço remete para diploma a aprovar pelo Ministério do Equipamento, .do Planeamento e da Aàmwnslração do Território o regulamento dos direitos e deveres do condutor de transportes de aluguer e respectivo regime sancionatório.
Nos demais artigos — 11.° a 15.°— estabelecem-se disposições relativas à exibição do certificado de aptidão, o qual deverá, no entanto, ser restituído logo que o seu titu-
lar cesse a actividade, devendo ainda o referido Ministério possuir um registo actualizado dos certificados emitidos.
Os dois últimos artigos dispõem, respectivamente, sobre quais as entidades competentes para proceder à fiscalização — artigo 14.° (DGTT, GNR e PSP) — e sobre a data da entrada em vigor do diploma e respectiva regulamentação— artigo 15.°, que, por lapso, ficou como sendo o artigo 19.°
II — Do enquadramento legal e constitucional
O projecto de lei n.° 308/VII, tendo como escopo principal a definição do quadro legal de acesso à profissão de condutor de transportes de aluguer em automóvel ligeiro de passageiros e à actividade profissional de transportador, visa igualmente, como transparece da respectiva exposição de motivos, «contribuir para a dignificação da actividade profissional tanto de "transportador como de condutor de táxis/carros de praça, eliminando a rede de transportes clandestinos que prolifera no sector e que contribui, muitas vezes, para situações de insegurança e menor prestígio de uma actividade necessária aos cidadãos».
Sobre a matéria, e ainda que com espectro mais largo do que o presente projecto de lei, estão em vigor o Decreto-Lei n.° 319/95, de 28 de Novembro, e a Lei n.° 10/90, de 17 de Março (Lei de Bases do Sistema de Transportes Terrestres).
Ò supracitado decreto-lei tem sido objecto de generalizada controvérsia, designadamente em matéria de conformidade constitucional, o que originou a recente apresentação pelo Governo da proposta de lei n.° 75/V11, em que se solicita autorização para legislar, entre outras, sobre a criação de regras específicas acerca do acesso à profissão de motorista de táxis, e visando igualmente a revogação do citado Decreto-Lei n.° 319/95, de 28 de Novembro, com repristinação das normas anteriores à publicação daquele e que expressa ou tacitamente tenham sido por ele revogadas.
Já em matéria de conformidade constitucional suscita--nos algumas dúvidas o teor dos artigos 8." e 9." do projecto de lei n.° 308/VII. De facto, a criação de impedimentos e incompatibilidades para o exercício da profissão de motorista de transportes de aluguer, ainda que condicionada à segurança de pessoas e bens, tal qual como surge normativizada no diploma em apreço, pode conflituar com o, princípio constitucional da liberdade de escolha da profissão (artigo 47.° da Constituição), que é, por sua vez, uma componente fundamental da liberdade de trabalho e que a doutrina vem considerando, sem discordância, decorrer indiscutivelmente do princípio do Estado democrático.
É que, não obstante a liberdade de escolha de profissão se considerar sob reserva de lei restritiva (artigo 47.°, n.° 1, da'Constituição), a verdade é que a conformidade legislativa sempre dependerá do nível e do interesse em que a restrição se verificar. Ou seja, as pressupostos exigidos para o ingresso ou exercício de determinada profissão não poderão violar o princípio da proibição do excesso e sempre terão de compaginar-se com os princípios de necessidade, exigibilidade e proporcionalidade.
Tudo, no entanto, questões que parecem, ser perfeitamente superáveis em sede de posterior aperfeiçoamento na discussão na especialidade e que não põem em causa o cerne essencial de conformidade legal e constitucional do projecto de lei em apreço.