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II SÉRIE-A — NÚMERO 33

Quanto aos referendos locais e regionais, a sua convocação e efectivação são regidos pela Lei de 16 de Julho de 1971 e por via do artigo 53.° da Constituição. Estes referendos têm âmbito e objecto especificamente territoriais.

Em França, o interesse crescente pelo desenvolvimento de novas formas de participação popular traduz-se, em certa medida, pela criação da «Associação para o referendo e para as liberdades».

Irlanda

A Irlanda é um país de longa tradição referendária e desde 1937 o recurso ao referendo vem sendo utilizado sempre que se colocam questões de carácter constitucional ou que estejam ém jogo decisões importantes no contexto sócio--cultural irlandês, como o divórcio ou a interrupção voluntária da gravidez.

O direito irlandês sobre o referendo é particularmente rico: previsto nos artigos 27.°, 46.° e 47." da Constituição, o processo referendário é regulamentado através dos referendum acts, publicados e sucessivamente actualizados desde 1942. As disposições actualmente em vigor constam não só do referendum act, como ainda da lei eleitoral electoral act.

O referendo constitucional é definido pelos artigos 46.° e 47° da Constituição. Todo e qualquer projecto de revisão é apresentado, em primeiro lugar, na Câmara dos Deputados (Dail) e é obrigatoriamente votado nas duas câmaras do Parlamento (Oirechtas) após o que é submetido a referendo nos termos do referendum act em vigor. O referendo constitucional tem sempre caracter vinculativo.

O referendo legislativo está consagrado nso artigos 27.° e 47.° da Constituição. Trata-se de um referendo de ratificação, vinculativo e de iniciativa mista, parlamentar e presidencial, cabendo, no entanto, ao Presidente da República a decisão final sobre a sua convocação.

Quando uma lei já aprovada pelo Parlamento contém disposições consideradas de relevante interesse nacional, um terço dos Deputados e a maioria dos senadores podem solicitar ao Presidente da República que não promulgueo diploma sem que o submeta a referendo. Se o Presidente considerar que o pedido é justificado, não promulga o diploma e convoca um referendo ou dissolve a Câmara dos Deputados. Havendo dissolução, a lei é submetida à nova Câmara e só é promulgada se houver uma resolução do «Dail» nesse sentido; havendo referendo, o seu resultado é vinculativo, desde que a votação maioritária corresponda a pelo menos um terço do eleitorado.

Os referendos locais e regionais, não sendo consignados na Constituição, são todavia previstos pela lei, sobretudo quando o seu âmbito e objecto são claramente territoriais.

Há ainda outra forma de intervenção popular que releva simultaneamente de dois institutos: o referendo e a petição. Esta forma de intervenção diz respeito à criação de municípios e o processo- é o seguinte: no decurso de uma assembleia municipal, qualquer colectividade territorial de mais de 1500 habitantes pode reclamar o estatuto de município através de uma petição subscrita por, pelo menos, 20 chefes de família, sendo então convocada uma assembleia para examinar o problema. Nesta assembleia, 10 eleitores presentes podem requerer a organização de uma votação a fim de que os cidadãos decidam sobre o estatuto da referida colectividade territorial. A par destes referendos são ainda organizados referendos consultivos sobre assuntos de âmbito local.

Reino Unido

Pode afirmar-se que a prática do referendo no Reino Unido descende do Agreement of People de Cromwell em 1648.

Actualmente o processo referendário tem sido controverso, baseando-se as críticas, sobretudo, no facto de que este inst^uto esvaziaria de conteúdo o sistema representativo, pondo em causa a soberania do Parlamento.

No entanto, a partir dos anos 70, o referendo começou a ser aceite na prática institucional do Reino Unido, ainda que sempre facultativo e de efeito meramente consultivo. Dado não existir Constituição escrita, não há um texto único regulador das formas e condições de convocação de referendos, sendo cada um deles objecto de lei especial.

O Parlamento pode desencadear consultas sobre qualquer matéria, mas não é obrigado a fazê-lo sobre assuntos pré--definidos.

Até agora foram realizados vários referendos regionais que culminaram no processo de devolution (devolução aos órgãos regionais de certos poderes centralizados no Estado). Veja-se os casos recentes de referendos na Escócia e País de Gales no sentido de terem parlamentos próprios.

O Local Government Act de 1972 consagra consultas populares sobre matérias de interesse local (polis) decididas nas assembleias de eleitores das pequenas colectividades territoriais, quando exigidos por, pelo menos, um terço dos eleitores presentes. No entanto, estas consultas não têm efeito vinculativo.

IV — Enquadramento constitucional do referendo

Em Portugal, a ideia do referendo aparece, pela primeira vez, em 1872, na secção v do projecto de lei de reforma da Carta Constitucional subscrito por José Luciano de Castro, sob forma de ratificação popular das alterações constitucionais. Segundo o autor, esta ideia poderia interessar o País na manutenção das suas instituições políticas e daria a estas a força da opinião e o prestígio do sufrágio popular: «a soberania popular é inalienável» (idem, p. 111).

No entanto, só muito mais tarde, no âmbito da 2° revisão do texto da Constituição de 1976, é que velo a prevalecer a consagração do instituto do referendo nacional (Lei n.° 1/ 89), já que na sua versão original a Constituição da República Portuguesa não acolheu os instrumentos referendários. Assim, a partir de 1989, o artigo 118.° da Constituição passou a prever a possibilidade de recurso a referendo nacional, dispondo no seu n.° I que:

Os cidadãos eleitores portugueses podem ser chamados a pronunciar-se directamente, a título vinculativo, através de referendo, por decisão do Presidente da República, mediante proposta da Assembleia da República ou do Governo, nos casos e nos termos previstos na Constituição e na lei.

Até à revisão constitucional de 1997, a doutrina portuguesa era unânime no sentido de afirmar que o referendo consagrado entre nós se rege, basicamente, por três princípios (v., por exemplo, Gomes Canolilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada):

a) O referendo nunca é obrigatório, mas sempre facultativo, ou seja, o recurso ao referendo implica sempre uma decisão livre dos órgãos de soberania competentes. Quer a proposta, quer a decisão são sempre actos discricionários, pelo que não