0422 | II Série A - Número 019 | 03 de Fevereiro de 2000
que se encontram em discussão as condições de segurança, quer para o ambiente quer para a saúde humana, no comércio internacional de produtos provenientes de organismos geneticamente modificados ganha particular acuidade não só a definição pelo Governo português de uma posição clara sobre a matéria, como a necessidade de uma informação correcta da opinião pública portuguesa sobre a natureza dos benefícios e dos eventuais riscos que os organismos geneticamente modificados (OGM) podem ter.
Detendo a presidência da União Europeia, o Governo português tem a responsabilidade de defender a posição desta perante o grupo de países que se revê na posição dos Estados Unidos sobre esta matéria. E nela, como noutras que envolvem o comércio internacional, a União Europeia e os Estados Unidos partem de posições praticamente opostas: enquanto a União Europeia tem uma posição assente no princípio da precaução, defendendo a possibilidade de condicionar o comércio de produtos resultantes de OGM à demonstração da sua inocuidade para a saúde humana e para o ambiente, já os Estados Unidos defendem a liberdade de comércio destes produtos desde que se não encontre provado serem prejudiciais sobre qualquer desses dois aspectos.
Sendo evidentes os potenciais benefícios que o desenvolvimento da engenharia genética com certeza trará, entre muitos outros sectores de actividade, à medicina humana, à agricultura, à produção animal e à recuperação ambiental de zonas poluídas ou degradadas, não são, no entanto, menos evidentes os riscos que praticamente sobre os mesmos aspectos se podem imaginar.
Por isso, uma sociedade que se pretende responsável e que vise o progresso e o bem-estar dos seus cidadãos não pode, à partida, recusar as vantagens que decorrem do desenvolvimento científico e tecnológico no domínio da engenharia genética, impedindo a produção e o comércio de organismos geneticamente modificados, mas não pode também deixar de tomar todas as medidas para minimizar e controlar os riscos - reconhecendo que não os pode eliminar, por completo, protegendo o ambiente e as pessoas.
Posições radicais de recusa absoluta e não fundamentada da produção e do comércio de produtos e organismos geneticamente modificados encontram contrapartida em posições de aceitação e restrita desse comércio. Nem uma nem outra parecem sensatas, deixando transparecer, num caso, fobias éticas e ideológicas, enquanto no outro se percebe claramente o predomínio dos interesse materiais sobre todos os restantes valores.
Portugal não escapa a este conflito de visões, embora ele esteja confinado a um escasso grupo de agentes científicos, económicos e políticos, porquanto a esmagadora maioria dos cidadãos não dispõe de informação e conhecimentos que lhes permitam formar uma opinião sobre uma matéria que crescentemente lhes vai dizendo respeito ao tornar-se parte da sua vida quotidiana.
Toda a polémica à volta dos chamados "alimentos transgénicos" é bem o exemplo disso. Alimentada pelos órgãos de comunicação social tem sido transmitida à opinião pública, numa perspectiva fundamentalmente alarmista, informação pouco esclarecedora sobre a utilização de produtos resultantes de organismos geneticamente modificados na alimentação humana e animal.
Até agora este assunto tem merecido do Governo pouca atenção e, principalmente, uma actuação errática e pouco propiciadora da informação e do esclarecimento do opinião pública portuguesa. A proibição do cultivo de milho "transgénico", recentemente decidida pelo Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, depois de a sua cultura se ter instalado e expandido - estima-se que, em 1999, se tenham cultivado cerca de 1500 hectares - e sem que a razão dessa proibição tenha sido tornada clara e quando em Portugal se importa livremente milho "transgénico" de países como os Estados Unidos, serviu naturalmente para alimentar as parangonas dos jornais e aumentar a perplexidade e os receios de uma opinião pública sucessivamente alarmada pelos casos da BSE, da brucelose, da peste suína, das toxinas nos alimentos, entre outros.
Considerando que a insuficiente e deficiente informação da opinião pública portuguesa, assim como algum enviesamento das posições veiculadas sobre a utilização dos produtos resultantes de organismos geneticamente modificados, são propiciadores do crescimento de sentimentos de receio da população portuguesa relativamente à segurança alimentar;
Considerando que, pela natureza da matéria em causa e pela sua complexidade, está praticamente restrito à comunidade científica o conhecimento real dos riscos ambientas e para a saúde humana que envolvem a engenharia genética, em particular quando posta ao serviço da produção de alimentos;
Considerando que a Assembleia da República, ou seja, os seus Deputados, possui informação e conhecimentos sobre esta matéria, que, pela sua escassez, não são compatíveis com as responsabilidades legislativas e de controlo da actuação do governos que detém;
Considerando que o conhecimento científico, pese embora a sua enorme evolução, é ainda reconhecidamente insuficiente e, principalmente, sujeito a uma muito rápida progressão;
A Assembleia da República delibera recomendar ao Governo que determine a elaboração de um relatório anual destinado à informação do público sobre a produção e comercialização de organismos geneticamente modificados e dos produtos deles resultantes, incidindo especialmente sobre a alimentação humana e aspectos ambientas.
A Assembleia do República delibera ainda recomendar ao Governo que providencie às Comissões Parlamentares Permanentes da Administração e Ordenamento do Território, Poder Local e Ambiente, da Saúde e Toxicodependência, bem como da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, uma informação semestral da evolução dos processos de negociação de âmbito comunitário e internacional sobre o comércio de produtos e organismos geneticamente modificados, bem como a informação dos dados disponíveis relativos ao seu licenciamento e comércio em Portugal.
Palácio de São Bento, 26 de Janeiro de 2000. Os Deputados do CDS-PP: Rosado Fernandes - Paulo Portas.
PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 27/VIII
RECOMENDAR AO GOVERNO A ABERTURA DE UMA LINHA DE CRÉDITO BONIFICADO, DE LONGO PRAZO, AOS PORTUGUESES RESIDENTES NA VENEZUELA VÍTIMAS DOS TEMPORAIS
A Assembleia da República aprovou recentemente um voto de pesar pelas trágicas consequências de um temporal que assolou a República da Venezuela, sobretudo o litoral da capital, Caracas, ceifando, na sua intensidade e violência, muitos milhares de vidas - não totalmente quantificadas