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1774 | II Série A - Número 054 | 04 de Maio de 2001

 

te inoperacional, a não ser que sejam alteradas as estruturas de formação ou contratados profissionais imigrantes em número suficiente. Ora, as duas novas faculdades de medicina, do Minho e da Beira Interior, terão 110 alunos por ano e, atendendo a que são precisos 11 a 14 anos para formar um especialista, não bastarão para resolver a falta de médicos. Ao mesmo tempo, vive-se desde já uma incontornável falta de enfermeiros, da ordem de mais de uma dezena de milhar, e faltam ainda auxiliares de acção médica, cuja integração e formação profissional poderia libertar enfermeiros de outras tarefas que actualmente cumprem.
Ao nível dos cuidados primários, esta crise é igualmente visível: dos 388 centros de saúde, raros são os que dispõem de capacidade para pequenas intervenções. Desde os anos 80 as consultas de pediatria, ginecologia e obstetrícia e de outras especialidades foram desarticuladas; faltam meios auxiliares de diagnóstico. Não há, portanto, condições nestes centros, nem em número e qualificação dos profissionais de saúde, nem em equipamentos, incluindo meios auxiliares de diagnóstico, capacidade de internamento e de resposta satisfatória a urgências de primeira linha para os quais são vocacionados.

III - A crise é agravada pelo descontrolo da gestão do SNS, que tem crescido ao longo do tempo.
Os dados são conclusivos: "Ao longo de seis anos, de 1995 a 2000, a dotação inicial adicionada atingiu 4,144 milhões e a dotação final 4,431 milhões de contos, com a segunda a acrescer à primeira à média anual de 7.2%. Ao longo do período os 287 milhões de contos de diferença do final para o inicial, acrescidos dos 387 milhões de contos mobilizados para a regularização da dívida, atingem 675 milhões de contos, ou seja, 16.3% do somatório das dotações iniciais para o mesmo período. Por outras palavras, globalmente, para o conjunto dos anos que vão de 1995 a 2000, admitindo que todos os recursos concedidos foram bem geridos, a sub-orçamentação inicial do SNS ronda os 16%" (Correia de Campos, ibid.).
Em consequência deste descontrolo, resultado da prática acumulada de sub-orçamentação, de falta de credibilidade dos contratos e orçamentos, de falta de rigor na gestão, de facilitação dos interesses privados e dos lobbies instalados, as contas do SNS no ano de 2001 voltam a aproximar-se de um déficit vertiginoso. Apesar de a Ministra da Saúde ter anunciado um déficit zero para o exercício e a redução do déficit acumulado de 336 para 206 milhões de contos, as projecções actualmente possíveis indicam que estes objectivos não se podem cumprir e que, pelo contrário, o déficit acumulado pode vir a ultrapassar os 400 milhões, o dobro do que estava previsto, dado que o déficit de 2001 pode atingir cerca de 186 milhões. Deste modo, e ainda segundo os cálculos de Correia de Campos, poderemos ficar perto de um déficit da ordem de 42% do orçamento inicial de 2001, o que, a verificar-se, só terá sido ultrapassado em 1998.
Ora, esta situação é tanto mais grave quanto o actual Ministério da Saúde dispôs da maior regularização da dívida jamais praticada, que foi de 277 milhões de contos no final de 1999, através de um orçamento rectificativo então explicado pela necessidade de proteger e reformar o SNS.
Por outras palavras, estamos em situação de pré-colapso porque, não tendo sido realizada nenhuma reforma de fundo nem quanto à qualidade dos cuidados de saúde nem quanto à forma da sua gestão, o financiamento deixa de obedecer a regras explícitas e controláveis e passa a ser uma forma de promover os poderes obscuros de que sucessivos responsáveis governamentais se queixam sem conseguirem tomar qualquer iniciativa sustentada. O fracasso é ainda marcado pelo facto de as potencialidades de gestão introduzidas pela legislação vigente não foram aproveitadas: o Conselho Nacional de Saúde não funciona, a administração central do SNS não existe e, portanto, os órgãos de coordenação do SNS ficaram por criar - e, em consequência, muita da mais importante legislação aprovada ficou por aplicar.
Assim, sem planeamento do uso dos recursos, vão sendo tomadas decisões desconexas e incoerentes, como a construção de três hospitais num raio de 50 km (Abrantes, Torres Novas e Tomar), o que determinou que a União Europeia se recusasse a financiar dois deles, havendo ainda simultaneamente um notório subfinanciamento dos Hospitais de Santarém e Leiria, que tem impedido o desenvolvimento das suas capacidades de resposta.

IV - Esta inacção contrasta nitidamente com a promessa apresentada pelo partido vencedor das últimas eleições, que no seu Programa do Governo garantia que "Chegou a hora de nos comprometermos solenemente com os portugueses no que toca a uma melhoria do sistema de saúde. É indispensável ao País um sistema de saúde mais eficiente, que preste melhores serviços aos cidadãos e de qualidade reconhecida. Na próxima legislatura caminharemos decididamente nesse sentido (…). Chegou a hora da promoção da saúde como grande prioridade.".
Mais ainda: apresentava o PS a proposta de um novo "contrato para a saúde", com prioridades que podiam ser concretizadas e que podiam ser verificadas: "O que propomos aos portugueses é um novo 'contrato para a saúde', com seis elementos fundamentais: o acesso aos cuidados de saúde; a qualidade; a protecção e segurança; a promoção da saúde; a gestão e as profissões. As seis componentes serão avaliadas e revistas anualmente e serão tomadas as medidas necessárias para sustentar as obrigações do Estado nesse contrato, no âmbito de um conjunto de medidas que consideramos prioritárias nesse domínio" (Programa do Governo do PS para as eleições de 1999).
Assim, a saúde foi anunciada como a prioridade do Governo para esta Legislatura.
Um ano e meio depois, e na ausência de medidas que configurassem essas reformas, o Governo apresentou ao Parlamento um diploma - as Grandes Opções do Plano para 2001 -, em que anunciava a apresentação de uma proposta de nova lei de bases da saúde e de um novo estatuto do SNS, de um novo estatuto jurídico hospitalar, de uma redefinição dos cuidados de saúde primários com o desenvolvimento dos centros de saúde da 3.ª geração, de um novo sistema de garantia de qualidade e, ainda, de uma nova política do medicamento. Nenhuma dessas iniciativas legislativas foi apresentada até hoje.
No entanto, uma parte dessas questões fora tratada pelo anterior Ministério da Saúde, depois da apresentação do SNS21 e, nomeadamente, em legislação que não tem sido cumprida e, de um modo mais geral, no documento Saúde, um compromisso, revisto em 1999, que sugeria uma nova estratégia de gestão que, assente na separação das funções financiadora, reguladora e prestadora de serviços, procurava criar os instrumentos legislativos para lhes dar corpo, nomeadamente definindo um modelo contratual com orçamentos e contratos-programa que permitisse introduzir mecanismos de controlo de eficiência em níveis intermediários de gestão.
Esse conjunto de propostas reformadoras articulava-se em quatro propostas estruturantes: os sistemas locais de saúde, os centros de saúde da 3.ª geração, os centros de responsa