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0015 | II Série A - Número 098 | 30 de Março de 2006

 

As providências legislativas que o Governo agora submete à consideração do Parlamento são muito prudentes e pensadas tendo em conta a necessária harmonização de todos os princípios constitucionais."

Se é certo, como todos referem, inclusivamente o Professor Vital Moreira, que o artigo 109.º da Constituição da República Portuguesa impõe medidas de discriminação positiva para a promoção da igualdade entre homens e mulheres no acesso aos cargos políticos; se é certo que as medidas de discriminação positiva infringem o princípio da igualdade constante do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa; se por isso mesmo não devem exceder o princípio da necessidade, não será verdade que a paridade - que consiste na divisão para sempre do demos em homens e mulheres - excede os limites a que devem obedecer as medidas de discriminação positiva? Não será verdade que a paridade ad aeternum acaba por violar o princípio da igualdade constante do artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa?
Não será verdade que a Constituição só autorizará - sem prescindir dos limites do seu artigo 18.º, n.º 2 - a divisão do demos entre cidadãos e cidadãs apenas para o efeito da aplicação de medidas de discriminação positiva? Não será só assim que tem conciliação com o artigo 109.º da Constituição da República Portuguesa, o artigo 3.º da Constituição da República Portuguesa, que proclama que a soberania é una e indivisível e que reside no povo, sem o dividir por sexos?
E não será só assim que se conciliam com o artigo 109.º, os artigos 48.º, 49.º e 50.º da Constituição da República Portuguesa não distinguem cidadãos e cidadãs?
E será mesmo que, ainda que com os cuidados enunciados na proposta de lei 194/VII, é possível estabelecer um regime em que o critério de escolha é apenas o sexo, sem qualquer outro critério adjuvante?
Será possível dessa maneira compatibilizar o artigo 109.º com o artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
É que, a propósito de medidas de acção positiva relativamente ao acesso ao emprego e promoções na carreira, até o Acórdão Marshall do Tribunal de Justiça da União Europeia, apresentado pelo Professor Vital Moreira no artigo que vimos citando, foram declaradas como contrárias ao princípio da igualdade, quando na opção entre dois candidatos a emprego, ou a promoções na carreira, não tomem em conta, na atribuição da preferência, qualquer situação especial do candidato preferido.
O Tribunal reconheceu a possibilidade de medidas de discriminação positiva a favor das mulheres, desde que as candidaturas (no emprego) sejam objecto de uma apreciação objectiva que tenha em conta todos os critérios relativos à pessoa dos candidatos e afaste a prioridade concedida aos candidatos femininos, quando um, ou vários dos critérios façam pender a balança em favor do candidato masculino e tais critérios não sejam discriminatórios para os candidatos do sexo feminino.

IV - Sentido da imposição constitucional

A fraca representação das mulheres nos órgãos de decisão política tem conhecido duas soluções no sentido de aumentar a participação feminina: o modelo das quotas ou da paridade, e o modelo progressivo.
Este último é, aliás, o dos países nórdicos, que merecem uma referência especial no preâmbulo do projecto de lei do Partido Socialista.
Importa, assim, explicitar que nunca houve em qualquer país nórdico imposição legal de quotas para o sexo feminino.
E apenas a Suécia e a Noruega tinham quotas fixadas voluntariamente pelos partidos.
O modelo progressivo dos países nórdicos contrapõe-se, de facto, ao modelo de incrementação acelerada de participação das mulheres na política que leva o Rwanda ao 1.º lugar do ranking mundial à frente dos países nórdicos e o Burundi ao 16.º lugar, à frente, bem à frente de Portugal.
Melhorou, assim, a qualidade da democracia naqueles dois países?
O Rwanda, que tem um sistema legal de quotas desde 2003, está classificado, no Relatório sobre Desenvolvimento Humano 2005, e já beneficiando do índice sobre a introdução de quotas, no 159.º lugar!
Se as quotas, desde que respeitem os limites das medidas de discriminação positiva, não são inconstitucionais face à actual redacção do artigo 109.º da Constituição da República Portuguesa, a verdade é que a realização desse preceito também pode passar pelo modelo de incrementação progressiva que exige medidas sociais, económicas e culturais que criem as condições para que as mulheres portuguesas estejam disponíveis para a causa pública.
Ora, se é verdade que as mulheres portuguesas conhecem inegáveis sucessos na área do ensino (em 2005, a percentagem de mulheres, com idade compreendida entre os 20 e 24 anos, com o ensino secundário completo atingia 56,6%;no ano lectivo 2003/2004 cerca de 65,9% dos diplomados eram mulheres), a verdade é que o abandono escolar das mulheres entre os 18 e os 24 anos atingiu ainda, em 2005, 30,1%.
As mulheres são as mais atingidas quer pelo desemprego quer pela precariedade. Em 2005, a taxa de desemprego oficial nas mulheres era de 9%, enquanto nos homens era de 7%.
Entre os anos de 2004 e 2005 o desemprego aumentou 15,7%, sendo de 422,3 mil o número médio de desempregados estimado para 2005. Cerca de 56% daquele aumento foi explicado pelo aumento do desemprego de mulheres.