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II SÉRIE-A — NÚMERO 184 26

do crime de falsas declarações, nos termos n.º 2 do artigo 3.º, da mesma lei, e também de tal dever não ser

exclusivo dos agentes que, para efeitos da Lei 34/87, de 16 de julho, são considerados titulares de cargos

políticos e altos cargos públicos – ainda que o elenco dos artigos 3.º e 3.º-A, da Lei 34/87, de 16 de julho, e

artigos 4.º da Lei 4/83, de 2 de abril, seja largamente coincidente –, persiste a consideração de que o tipo de

enriquecimento injustificado não surge estruturado como delito de falsidade. O desvalor jurídico-penal não

decorre da inverdade ou ocultação de bens e rendimentos no ato declarativo produzido em cumprimento das

injunções que decorrem da Lei 4/83, de 2 de abril, pois, mesmo que infringidas, não assumem relevo autónomo

para o efeito da incriminação como enriquecimento ilegítimo. Permanece a exigência de uma variação

patrimonial, cuja medida nem mesmo é encontrada a partir do que foi efetivamente declarado, mas sim do que

deva ser declarado. É, pois o acréscimo patrimonial sem origem conhecida que emerge em si mesmo como

desvalioso - e não a divergência entre o declarado e a realidade ou mesmo a omissão de declaração -, sem que

se logre identificar um dever jurídico - e o correspondente défice pessoal a sancionar - que o legitime. Aliás, no

que concerne ao património adquirido, possuído ou detido nos três anos seguintes à cessação de funções -

idóneo, nos termos do n.º 1 do artigo 27.º-A, a conduzir a um apuramento de incompatibilidade -, nem mesmo

persiste qualquer obrigação declarativa fundada na Lei 4/83, de 2 de abril: a declaração final deve ser

apresentada no prazo de 60 dias a contar da cessação de funções (cf. artigo 2.º, n.os 1 e 4).

(Fernando Vaz Ventura).

Declaração de voto

Com base nas considerações já expendidas na declaração de voto aposta ao Acórdão 179/12, que se

pronunciou sobre o Decreto da Assembleia da República que pretendia instituir o crime de enriquecimento ilícito,

e que entendo serem ainda aplicáveis no presente caso, acompanho o juízo de inconstitucionalidade mas

apenas no que se refere à violação do princípio da presunção de inocência do arguido.

A eliminação, nas normas dos artigos 335.º-A do Código Penal e 27.º-A da Lei 34/87, de 16 de julho, aditadas

pelo Decreto da Assembleia da República n.º 369/XII, do inciso "sem origem lícita determinada", que constava

do anterior diploma e representava a formulação negativa de um elemento constitutivo do tipo legal, não evita a

presunção do resultado ilícito em que se traduz a divergência entre o património e os rendimentos declarados.

Nesse sentido, o arguido terá sempre de tomar a iniciativa de alegação e prova em relação aos factos que

revelem a discrepância, em vista a determinar a origem lícita do património ou, ao menos, suscitar o estado de

dúvida sobre o caráter injustificado do enriquecimento. E não poderá limitar-se a exercer o direito ao silêncio,

visto que a não prestação de declarações terá sempre a consequência desvantajosa de não permitir contraditar

a prova documental que evidencie a variação desproporcionada entre o património e os rendimentos.

Na verdade, o tipo legal não exige a prova da origem ilícita do património – que, a verificar-se, conduziria ao

preenchimento de um outro tipo de incriminação –, nem será possível ao Ministério Público, em fase de

investigação, desvelar eventuais circunstâncias justificativas do enriquecimento que sejam do conhecimento

pessoal do arguido. Encontrando-se o tipo legal construído em termos tais que o arguido tem de prescindir

necessariamente do direito ao silêncio para esclarecer aspetos que não poderão ser objeto de prova por outro

meio, o que está em causa é uma verdadeira transferência do ónus da prova da acusação para a defesa.

(Carlos Fernandes Cadilha).

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