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II SÉRIE-A — NÚMERO 32 64

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 98/XIII (1.ª)

PROPÕE A CONSAGRAÇÃO DE UMA NOVA MISSÃO PARA A AUTORIDADE PARA AS CONDIÇÕES

DE TRABALHO (ACT) — ALTERANDO O SEU ÂMBITO DE AÇÃO, REFORÇANDO OS SEUS PODERES E

DOTANDO-A DE MAIS MEIOS PARA COMBATER A PRECARIEDADE

A precariedade é um problema central do país. Combatê-la é uma urgência social e um imperativo

democrático. Com a precarização que hoje existe nas relações laborais, é a própria cidadania que é esvaziada,

com o emprego a deixar de constituir, num número crescente de situações, uma plataforma de exercício e de

acesso a direitos. Se somarmos aos desempregados os contratos a termo, os falsos recibos verdes, o

subemprego, os falsos estágios, os bolseiros de investigação que nunca tiveram um contrato, as pessoas em

“contratos emprego-inserção”, a subcontratação, os trabalhadores das empresas de trabalho temporário,

chegamos à conclusão que a maior parte da classe trabalhadora em Portugal está desempregada ou tem uma

condição laboral precária.

As três vias da generalização da precariedade em Portugal

A precariedade em Portugal tem-se generalizado por múltiplas vias. Mas há três dimensões essenciais. É

também sobre elas que uma transformação política de fundo se impõe:

1. A precariedade instalou-se por via de alterações legislativas que pretenderam “flexibilizar” a regulação

laboral, tendo como efeito a desproteção dos trabalhadores, o embaratecimento e a facilitação dos

despedimentos, a multiplicação de estatutos contratuais e a profusão de formas precárias de relação entre

empregadores e prestadores de trabalho. A última revisão ao Código de Trabalho, efetuada pela Lei n.º 23/2012

de 25 de junho, concretizou medidas decorrentes dos objetivos plasmados no Memorando da Troika, muitas das

quais chumbadas pelo Tribunal Constitucional e preconizou um retrocesso significativo dos direitos dos

trabalhadores. Reverter essas alterações legislativas, garantir novos mecanismos de proteção de quem trabalha

e a cobertura dos novos riscos sociais é uma prioridade de uma política pública assente na promoção do trabalho

digno.

2. Em segundo lugar, a precariedade generalizou-se também pela transgressão das normas laborais, ou

seja, pela banalização de práticas ilegais. Tem sido assim com o falso trabalho independente, mas também com

o recurso abusivo e fora da lei ao trabalho temporário, aos estágios, ao trabalho “voluntário”, ao trabalho

temporário, aos contratos a termo para funções permanentes, bem como a múltiplas modalidades de trabalho

informal. O combate à precariedade no nosso país tem de ter em conta que a efetividade das normas laborais

é posta em causa diariamente por estas práticas. Só uma fiscalização séria por parte da ACT pode combater

este flagelo. Contudo, o caminho percorrido nos últimos anos foi o inverso. A ACT tem atualmente um corpo de

profissionais claramente insuficiente para fazer face à sua missão. De acordo com aquilo que é recomendado

pela Organização Internacional de Trabalho, a ACT deveria ter cerca de duas centenas de inspetores a mais

relativamente àqueles de que hoje dispõe. Os relatórios desta entidade são claros. Os pedidos de intervenção

aumentaram em 30%, mas as visitas inspetivas reduziram-se para menos de metade. Em 2011, tinham sido

visitados pela ACT 74 600 estabelecimentos. Em quatro anos, o número desceu abaixo dos 30 mil.

3. Não é apenas por ausência de fiscalização que o Estado tem sido cúmplice do processo de precarização.

O Estado é ele próprio um empregador de precários. De acordo com os dados do Observatório do Emprego

Público, havia, em 2014, 61.145 contratos a termo na administração pública (central, local e regional), isto é,

mais de 10% dos trabalhadores estavam enquadrados por esta modalidade. Os contratos de avença e à tarefa

abrangiam 24465 trabalhadores. O congelamento das admissões na Administração Pública e as restrições à

contratação daí decorrentes fazem com que se tenham multiplicado, um pouco por todos os serviços públicos,

situações de recurso ao trabalho temporário, a falsos recibos verdes, a medidas “ocupacionais” e de “trabalho

socialmente necessário” como os contratos emprego-inserção, as avenças ou contratos à tarefa. Os casos de

falsos recibos verdes no próprio Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), revelam o quanto a

Administração Pública tem dado um péssimo exemplo. O Estado mantém largas dezenas de milhares de

trabalhadores com vínculos precários.