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II SÉRIE-A — NÚMERO 1

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PROJETO DE LEI N.º 6/XV/1.ª

ALARGA A TUTELA CRIMINAL DOS ANIMAIS, PROCEDENDO À QUINQUAGÉSIMA SEXTA

ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL

Exposição de motivos

A proteção animal é uma preocupação crescente da sociedade contemporânea, reveladora de uma maior

consciencialização no que respeita à capacidade de os seres percecionarem sensações e sentimentos de forma

consciente, bem como o sofrimento e dor.

Desde 1995 que a Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, aprovou o regime de proteção dos animais,

estabelecendo, designadamente, a proibição de «todas as violências injustificadas contra animais,

considerando-se como tais os atos consistentes em, sem necessidade, se infligir a morte, o sofrimento cruel e

prolongado ou graves lesões a um animal». Esta lei foi posteriormente alterada pela Lei n.º 19/2002, de 31 de

julho , pela Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, pela Lei n.º 39/2020, de 18 de agosto e pela Lei n.º 6/2022, de 7

de janeiro.

Apesar de na sua versão inicial o diploma remeter, no então artigo 9.º, para lei especial o regime

sancionatório, só volvidos 26 anos, com a Lei n.º 6/2022, de 7 de janeiro, foi introduzido um quadro

contraordenacional no diploma.

A sensibilidade dos animais («sentient beings») é hoje indubitável e a sua capacidade de sofrimento, a sua

sensibilidade à dor e a sua capacidade de afeto estão na origem de uma profunda reflexão ética e jurídica sobre

a relação entre o ser humano e os animais.

Em 2012 um grupo de renomados neurocientistas proclamaram a Declaração de Cambridge sobre a

Consciência dos Animais1:

«Nós declaramos o seguinte: ‘A ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo

experimente estados afetivos. Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos

neuroanatómicos, neuroquímicos e neurofisiológicos de estados de consciência juntamente com a capacidade

de exibir comportamentos intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os humanos não

são os únicos a possuir os substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo

todos os mamíferos e as aves, e muitas outras criaturas, incluindo polvos, também possuem esses substratos

neurológicos’» (sublinhado nosso).

Acontece, porém, que esta reflexão não pode permanecer apenas no campo da ética e da moral, sendo

necessária e urgente a apresentação de medidas para o seu correto enquadramento jurídico, em consonância

com os avanços científicos e sociais.

Neste mesmo sentido, destacamos as palavras do ilustre Professor Menezes Cordeiro, de que «há um fundo

ético-humanista que se estende a toda a forma de vida, particularmente à sensível. O ser humano sabe que o

animal pode sofrer; sabe fazê-lo sofrer; sabe evitar fazê-lo. A sabedoria dá-lhe responsabilidade. Nada disso o

deixará indiferente – ou teremos uma anomalia, em termos sociais e culturais, dado o paralelismo com todos os

valores humanos»2 (sublinhado nosso).

O artigo 13.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)3, na redação introduzida pelo

Tratado de Lisboa, veio reconhecer um dever de proteção por parte dos Estados-Membros aos animais,

enquanto seres «sensíveis», embora sujeitos a harmonização4:

«Na definição e aplicação das políticas da União nos domínios da agricultura, da pesca, dos transportes, do

mercado interno, da investigação e desenvolvimento tecnológico e do espaço, a União e os Estados-Membros

terão plenamente em conta as exigências em matéria de bem-estar dos animais, enquanto seres sensíveis,

respeitando simultaneamente as disposições legislativas e administrativas e os costumes dos Estados-

1 The Cambridge Declaration on Consciousness – 7 de Julho de 2012. 2 António Menezes Cordeiro, in Tratado de Direito Civil, III, Parte Geral, Coisas, Almedina, 2013, pág. 276. 3 Disponível em http://europa.eu/pol/pdf/consolidated-treaties_pt.pdf. 4 Com antecedentes no Protocolo n.º 13 do Tratado de Amesterdão (1997).