Estado, Srs. Deputados: Uma das virtudes de ter pouco dinheiro é não se poder fazer desperdícios, mas isso também cria alguma dificuldade para quem tem de apreciar e de fazer sugestões sobre o orçamento.
O orçamento do Ministério dos Negócios Estrangeiros, excluindo o que é cooperação, que, de algum modo, também faz parte dos negócios estrangeiros, mesmo quando não diz respeito a este Ministério - e, felizmente, começa-se a entender assim -, limita-se a 0,7% da despesa geral do Estado.
Tem-se dito que é essa a percentagem que, na Europa Ocidental, se tem destinado aos vários ministérios de negócios estrangeiros. Julgo que até está certo em ministérios de negócios estrangeiros que estão afinados pelas novas tecnologias, em que é fácil o ministro ou os secretários de Estado entrarem rapidamente, e com grande profusão de documentos, em contacto com qualquer embaixador numa emergência, mas penso que não é bem esse o caso com que o Sr. Ministro ou qualquer ministro dos negócios estrangeiros, em Portugal, se confrontam.
É por isso que se percebe que praticamente metade, ou seja, 2,5 milhões de contos, da despesa que é reservada ao investimento seja destinada ao aperfeiçoamento dos serviços, volume igual àquele que é dedicado à aquisição e à melhoria de edifícios e de instalações, não só aqui mas também em vários sítios do mundo.
Penso - e não é talvez uma recomendação para si, mas uma sugestão para que o reivindique - que, no momento em que se requer uma actualização de meios e uma dotação aos serviços de meios sofisticados informáticos modernos e adequados, bem se justificava que o Estado aqui tivesse consignado uma verba mais importante para essa função. Não o pôde fazer, mas espero que o Sr. Ministro - e nada me leva a pensar o contrário -, à medida do que já fez ou está a fazer com os consulados, não esqueça também o problema das embaixadas, que é bem importante, principalmente quando elas generalizarem uma actuação também no domínio da economia, que não se compadece com fáceis ligações ou com ligações não atempadas, porque isso paga-se muito caro na economia nacional.
Sr. Ministro, ouvi dizer ainda agora que este Governo estava à vontade no que dizia respeito ao Instituto Camões. Penso que o drama é que qualquer governo que chegue está e continuará à vontade no que diz respeito ao Instituto Camões, porque a primeira coisa que falta é sabermos o que é queremos dele.
Não sei se estou de acordo, mas, provavelmente, não estou, em que seja uma virtude o facto de o ensino do português elementar ter passado para a tutela do Ministério da Educação. Interrogo-me mesmo se seria isso que deveria ter sido feito, e estou muito inclinado a pensar que não. Julgo que o Instituto Camões, como o Instituto Cervantes, como outros institutos, devem ter uma função bem mais lata do que aquela que têm tido.
Concordo também com o que tem sido o Instituto Camões até agora. É melhor pô-lo no Ministério da Educação do que deixá-lo estar no meio da tormenta, porque bem chega o Camões, além de ter sustentado Os Lusíadas na mão, ter de sustentar também o ensino do português, porque seria um bocado difícil.
De qualquer maneira, penso que nenhum de nós, nem nenhum partido, nem nenhum português consciente, pode estar contente com o que, até agora, aconteceu ao Instituto Camões. Talvez isso se deva ao facto de ele ter andado a passear de instalação para instalação, a variar de presidente para presidente, a uma cadência perfeitamente alucinante, e ainda não ter encontrado o seu caminho.
Faço votos, Sr. Ministro, para que, tal como este ano marcou um interesse particular, e com resultados espero eu, no que diz respeito à cooperação, V. Ex.ª integre nas suas preocupações o Instituto Camões, com tudo o que ele significa, para ver se, em 1999, podemos olhar para ele com outros olhos. Não chegam revistas, o que é preciso é que haja nas universidades cadeiras de português, particularmente em países que nos estão muito ligados e onde deveríamos ter outra presença, que não temos.
Sr. Ministro, fica esta recomendação sobre o Instituto Camões.
Passo agora à cooperação, onde, como digo, com os recursos que lhe são atribuídos, não me parece que pudesse fazer algo de muito diferente daquilo que faz. Se 40 milhões de contos são para o funcionamento e 5,8 milhões de contos para o investimento, não me parece que pudesse ir muito longe.
Quanto à cooperação, já tive ocasião de dizer que fiquei muito contente, até porque "berrei", durante longos anos, pela necessidade de um programa integrado da cooperação e de um orçamento integrado da cooperação. E, finalmente, ele chegou. Não há dúvida de que o Sr. Secretário de Estado cumpriu a promessa feita no primeiro dia em que veio à Comissão dos Negócios Estrangeiros, Comunidades Portuguesas e Cooperação.
Mas este programa e este orçamento da cooperação torna evidente uma coisa que já se pressentia: é que estamos com uma cooperação casuística. Não lhe faço qualquer crítica por isso, porque V. Ex.ª só podia constatar que era assim depois de ter este documento preparado. Mas, a partir deste documento, há a possibilidade de fazer a avaliação sobre onde são investidos estes 57 milhões de contos e onde é que aqui continuará a haver alguma coisa daquela santa boa vontade - sempre é melhor do que nada - do Director-Geral, que compromete 30 contos por ano. Bom! Mas perante os problemas e a dimensão deles, a soma exaustiva de 30 contos por ano a comprar borrachas não vai longe!
O Sr. Ministro e o Sr. Secretário de Estado disseram que era chegado o momento de fazer a articulação com a política de cooperação europeia. Ora, julgo que isso é importante, mas não é da primeira linha de importância para nós portugueses. E gostava de chamar a vossa atenção para isso! É muito mais importante para nós portugueses a outra parte, que não está aqui, a cooperação privada, no sentido lato do termo, que é a cooperação quando se instala um campo de algodão em Moçambique; que é a cooperação quando se alarga a actividade da Cimpor a Moçambique; que é a cooperação quando se fazem os investimentos na banca que estão a ser feitos; que é a cooperação quando jovens universitários vão, todos os anos, tratar de hospitais por África fora. E esse esforço de cooperação que aqui não está totalizado, muito provavelmente, é superior aos 57 milhões de contos que estão contabilizados. Essa é que é, na perspectiva portuguesa, a grande necessidade de articulação. O Estado tem de ser aqui supletivo e, para ser supletivo, tem de saber o que é que se está a fazer no domínio do privado.
Penso que, neste momento, a Assembleia dotou o Governo de um instrumento para isso, que é o novo regulamento das ONG-B e será também a ELO e outras organizações