336 II SÉRIE - NÚMERO 12-RC
domínios para uma administração perigosamente fechada. Isto acontece não só nos domínios tradicionais, não só no domínio da defesa nacional, das forças armadas, da problemática de segurança, mas em outros que eram relativamente abertos e que agora são crescentemente fechados.
Por último, os jornais informaram-nos -o que coloca interessantes questões quanto às fontes de informação - que o Conselho de Ministros aprovou recentemente uma iniciativa legislativa nos termos da qual se adoptam, em nome do segredo de Estado e da "segurança" da Administração Pública, medidas de fechamento ainda maiores. Isto significa que se procura contrariar, em sede de lei ordinária, aquilo que é o cumprimento de normas constitucionais. Os jornalistas são atingidos por isso, o que nos parece bastante preocupante.
Por tudo isto, Sr. Presidente, gostaria de sublinhar que consideramos que seria muito negativo se se avançasse para qualquer cláusula do tipo daquela que e proposta pelo PRD e que, de resto, nem sequer é proposta pelo PSD. O PSD prefere actuar no terreno da legislação ordinária inconstitucional!
Também gostaria de sublinhar que cláusulas ambíguas, como a da salvaguarda da intimidade das pessoas, são, como o SR. Deputado Almeida Santos sublinhou, um poço negro que abre para tudo e que impossibilita virtualmente a actividade jornalística normal. Isto porque em muitos casos e absolutamente impossível que a actividade jornalística, quando pretende investigar determinados factos, não invada uma esfera lata da intimidade. É isso mesmo que se trata de fazer, mas dentro de limites, e o Conselho de Imprensa tem procurado velar para que esses limites não sejam excedidos, como frequentemente o são.
Creio que a questão suscitada pelo PSD e uma questão de fundo. Vem enroupada com argumentos que nos suscitam alguns comentários.
O artigo 38.° da Constituição e, de facto, marcado pelos contextos históricos. Isto é, são nele visíveis os sinais do debate e da luta que se travou em Portugal após o 25 de Abril para definir com rigor as balizas da liberdade de informação e para situar e projectar constitucionalmente as diversas concepções que se confrontaram na sociedade portuguesa sobre esta matéria. Atingiu-se um ponto - que se pode qualificar como de equilíbrio razoável- de articulação, de compatibilização de concepções diversas. Penso que o resultado foi, em termos de garantia da liberdade de imprensa e dos direitos dos jornalistas, feliz.
Aquilo que o PSD propõe neste ponto e uma inversão do sinal da Constituição. Isto é, na experiência histórica portuguesa o facto de a Constituição consagrar o que consagra em matéria de direitos dos jornalistas não impediu que a classe jornalística portuguesa sofresse, designadamente através do uso de armas económicas, de armas políticas e de outras formas de pressão legítimas e ilegítimas.
Não entro excessivamente na discussão do que seja a pressão legítima. Pressionados, legitimamente, somos todos. O Sr. Presidente acabou de nos pressionar esta manhã através de uma entrevista no jornal Tempo e ninguém se queixa. É uma pressão legítima? Porém, há outras pressões inequivocamente ilegítimas e isso acontece e aconteceu historicamente também em relação aos jornal istas. Isto significa que a norma constitucional ficou por cumprir...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, peço desculpa de o interromper. É que, provavelmente, é uma pressão "corporativa", e é preferível a pressões heterónimas.
Risos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, as virtudes do chicote interna corporis, substitutivo do outro, do externo, são uma problemática que deve dar uma discussão apaixonante. Duvido que na óptica das costas, que são atingidas, a coisa não seja bastante indiferente.
Quanto aos Jornalistas, a coisa ocorre precisamente nestes termos. E que, independentemente da fonte, de ser extema ou interna, a pressão tem-se vindo a verificar ao longo destes anos. Tem sido muito difícil conseguir levar à prática, em todos as suas dimensões, aquilo que é o quadro constitucional. Sabe-se que o que a Constituição introduziu neste ponto foi uma alteração realmente invulgar, mas que nos parece positiva, não esgotada, não arredável, uma alteração fulcral do que seja o direito de propriedade em matéria de empresas jornalísticas. E fê-lo por reflexão fecunda e por rejeição dos parâmetros que antes do 25 de Abril tinham conduzido a fenómenos aparatosos de concentração de empresas jornalísticas nas mãos de grupos económicos e à sua utilização segundo uma determinada lógica e segundo uma determinada dinâmica, com sujeição dos jornalistas co-envolvidos. Quis-se romper com esse modelo, mas o PSD quer regressar a um modelo - e repito: não digo regressar a esse modelo, mas regressar a um modelo - em que se dá aos proprietários dos órgãos de comunicação um direito absoluto de orientação. Creio que isso é um grande recuo, mesmo em termos da perspectivação do que deva ser a propriedade de empresas jornalísticas, e é um recuo, uma vez que a linha de tendência da evolução no pós-guerra nos países capitalistas - e embora os últimos anos tragam, com os surtos neoliberalistas e outras correntes desse tipo, involuções e regressões - foi no sentido de despojar a propriedade dos meios jornalísticos de alguns dos tributos que classicamente lhe eram atribuídos e de conferir aos jornalistas um estatuto crescentemente importante na definição do que deve ser o próprio produto a vender, que, neste caso, é um produto nobre, ou seja, um jornal ou um outro órgão de comunicação social.
Essa intervenção é extremamente importante e, nos tempos modernos, não nos parece ser um valor perimido. Creio que a visão que o PSD nos traz dos direitos dos jornalistas é uma visão redutora e castradora que poderá ser uma homenagem a algumas tristes realidades, mas que é, ela própria, uma triste proposta jurídica. É uma das mais marcantes propostas do PSD e uma das que mais revelam uma visão do mundo e da comunicação social marcada por traços que reflectem a visão da "social-democracia" que temos em Portugal, ou seja, uma "social-democracia" liberal, proprietarista e redutora dos direitos e do papel dos criadores. Um dos seus argumentos utilizados pelos seus arautos é particularmente envergonhado e devo dizer que gostaria que ele fosse assumido frontalmente. É que, quando se afirma que o facto de os jornalistas intervirem na definição ou na orientação ideológica dos seus jornais e uma coisa que seria quase "aberrante", está-se a estabelecer alguma confusão sobre o que seja essa forma de intervenção. No fundo, aquilo que a Lei de Imprensa estabelece hoje - ca nossa Lei de Imprensa foi aprovada no contexto que conhecem, com participação pi uri partidária e com preocupações que foram larguissimamente comuns - são algumas das modalidades dessa intervenção em todos os órgãos de comunicação social objecto de propriedade privada.
Infelizmente, essas normas são engolidas frequentemente, incluindo quanto à garantia da intervenção dos jornalistas na designação do director com poderes que deveriam se decisivos. A solução legal percebe-se porque a lógica da