4 DE AGOSTO DE 1988 965
efectividade e da racionalidade da respectiva exploração antes da outorga da propriedade plena, em termos de consagrar um modelo evolutivo, que passaria por uma solução transitória deste género até à outorga da propriedade plena, como desiderato final deste processo de transferência das terras expropriadas com os limites previstos no n.° 1. Eis, Sr. Presidente, uma síntese da nossa proposta.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em relação ao PSD, gostaria apenas de fazer uma referência muito sucinta, que não sei se ontem foi feita, no que respeita não tanto ao mérito da proposta - porque ela certamente ontem foi objecto, em termos globais, de uma explanação -, mas à razão por que não deparámos com dificuldades intransponíveis pela circunstância de haver uma referência, na actual redacção da alínea f) do artigo 290.°, à eliminação dos monopólios e dos latifúndios.
E a razão por que entendemos que essa referência não obsta à nossa proposta de eliminação resulta de duas considerações. Uma primeira de carácter mais geral pois, como já foi dito repetidas vezes, alguns aspectos da nossa Constituição que surgem de maneira mais marcada na redacção de 1976 e de uma maneira menos nítida, mas igualmente existente, na redacção da Constituição de 1982 assentam num princípio estruturante que entendemos ter caducado. Ele é particularmente nítido nesta matéria da Constituição económica, como tive já oportunidade de referir, quer a propósito das nacionalizações, quer a propósito do Plano. De resto, há, em matéria de plano e de reforma agrária, nesse aspecto, uma grande articulação, porquanto, na redacção do n.° 1 do artigo 91.° da Constituição de 1976, a propósito dos objectivos do Plano, se diz que, para a construção de uma economia socialista, através da transformação das relações de produção e da acumulação capitalista, a organização económica e social do país deve ser orientada e disciplinada pelo Plano, e, em matéria de reforma agrária, no artigo 96.°, se diz: "Objectivos de reforma agrária - A reforma agrária é um dos instrumentos fundamentais para a construção da sociedade socialista e tem como objectivos:..."
Como repetidas vezes tenho dito, entendemos que esta construção da sociedade socialista, nos termos em que ela foi conseguida originariamente, não tem hoje actualidade e, por consequência, digamos que esse objectivo já não é vinculado, em razão ou do desuso ou de um uso contrário.
A segunda observação que queria fazer, para evitar discussões sobre esta matéria que são certamente muito interessantes e que teremos oportunidade de ter, mais em geral, quando discutirmos os primeiros artigos da Constituição, resulta da circunstância de o PSD, no artigo que consagra os objectivos da política agrícola, naturalmente, entender que, se e quando isso se justificar em função de uma política agrícola que tem por objectivo o aumento da produção e da produtividade do sector agrícola, da promoção da melhoria da situação económica, social e cultural dos trabalhadores e do melhor uso e gestão, por forma racional, dos solos e dos diferentes recursos naturais, ou ainda para fomentar a constituição de explorações agrícolas viáveis, com dimensão fundiária adequada, haverá uma política apropriada, tanto em matéria de latifúndios, como também em matéria de minifúndios.
Nestas circunstâncias, não vemos que o facto de ter sido mencionada, dentro de uma terminologia bem conhecida quanto às suas raízes ideológicas, a ideia da luta contra os monopólios e latifúndios, na alínea f) do artigo 290.°, seja também um obstáculo à sua eliminação.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, a intervenção ontem produzida pela bancada do PSD e a intervenção que hoje foi produzida pelo Sr. Deputado Rui Machete são, quanto a mim, uma boa introdução para os termos em que a questão está colocada e para as implicações, o conteúdo e as consequências da posição que, nesta matéria, o PS anunciou e aqui foi sustentada, sucintamente, pelo Sr. Deputado António Vitorino, deixando em aberto todo um mar de questões.
Não podia, obviamente, antecipar, ponto a ponto, aquilo que o Sr. Deputado Rui Machete agora acaba de sustentar; no entanto não se trata, propriamente, de algo que tenha escolhido para nos revelar hoje. Trata-se de uma posição que vem um pouco mais desenvolvida, na sua versão originária, num artigo que um dia destes há-de ser publicado na "Revista de Estudos Políticos" de Madrid e que está traduzido, de resto, em português.
Ora, sucede que a tese, sendo o que é, pode dar origem a interessantes discussões de carácter, porventura, académico sobre a caducidade ou não de limites materiais de revisão (para não dizer até mesmo da Constituição toda). Pode-se, evidentemente, especular a galope nessa matéria, fazer exercícios conceptuais de contraposição entre o princípio constitucional A e o princípio B - para proclamar, triunfantemente, a vitória do princípio B e não a do princípio A, especular sobre o desfile das forças sociais e políticas em luta pela aplicação da Constituição e sobre as regressões políticas impostas por circunstâncias históricas de determinado cariz. É igualmente possível procurar transformar à força a Constituição num eco "destruído pelos factos", empurrado pelas pressões e nidificado pela vontade política daqueles que, num determinado momento, se alcandorem em maioria e querem continuar, a todo o preço, a sê-la. Tudo isto pode ser dito - em longo ou em curto.
Tudo espremido, no entanto, a questão política que se suscita é esta: o PSD não se conforma com os limites materiais da revisão. Poderá quem quer que seja, em termos mais enérgicos ou mais flébeis, sustentar que no nosso regime democrático qualquer progresso, no sentido da construção do socialismo, terá de ser decidido pela vontade do povo, nos termos normais da concretização do princípio democrático pelo voto em eleições ou através de decisões dos órgãos que politicamente o representam: dirá uma evidência! Dirá o que a Constituição diz como resultado do compromisso constitucional originário de 1976. Se disser, por outro lado, que os ritmos, as regressões e os avanços na concretização dos princípios constitucionais dependem do impulso e do jogo de forças políticas e sociais que, numa determinada estrutura e num determinado sistema, se registem, dirá outra evidência.
Coisa totalmente diferente é extrair de tais evidências o corolário técnico-jurídico-constitucional de que se verificaria um fenómeno de caducidade dos limites de revisão. Sobretudo, por mais apetecível que seja a