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14 DE SETEMBRO DE 1988 1109

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é correctiva, é autêntica.

O Sr. António Vitorino (PS): - Em meu entender é no mínimo correctiva da minha intervenção...

O Sr. José Magalhães (PCP): mas por razões jurídicas.

Isso certamente,

O Sr. António Vitorino (PS): - Sempre se poderá dizer que, nesse caso, o efeito útil da proposta do PCP é vincular o legislador ordinário à tradução, sob forma de lei quadro, do princípio da legalidade que já enforma toda a Constituição, pois, em termos de efeitos práticos, não há mais nenhum. Rigorosamente nenhum! E relativamente aos problemas que, habilmente, o Sr. Deputado José Magalhães colocou quanto aos regulamentos de polícia dos governadores civis, quanto à capacidade regulamentar dos institutos públicos - no que não falou, mas que estava implícito -, e das associações públicas e quanto ao poder regulamentar das autarquias locais, sempre se deve entender que tal poder regulamentar é ilegítimo sem existir lei que o fundamente.

No caso dos regulamentos de polícia dos governadores civis temos o § 1.° do artigo 408.° do Código Administrativo, que constitui instrumento legal habilitador do poder regulamentar dos governadores civis e da emanação de regulamentos de polícia por parte desses mesmos governadores civis, regulamentos independentes. No caso dos institutos públicos, a lei instituidora desses institutos tem de prever, forçosamente, a concessão de poder regulamentar a esses mesmos institutos, sob pena da impossibilidade de exercerem tal poder regulamentar. Quanto às associações públicas, o próprio regime jurídico dessas associações é matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, nos termos da alínea r) do artigo 168.° da Constituição, e, por consequência, sempre se terá de entender que as associações públicas só podem exercer poder regulamentar na precisa medida em que tal lhes for conferido pelo acto legislativo que as institui (lei ou decreto-lei autorizado). E no que diz respeito às autarquias locais, conjugando o artigo 242.° da Constituição com o Decreto-Lei n.° 100/84, o poder regulamentar das autarquias locais só pode resultar nestes precisos termos, sempre conforme à lei e nunca contrário à mesma.

Ora, a interpretação que fiz e que o Sr. Deputado José Magalhães ilegitimou é a de que o n.° 1 do artigo 115.°-B do PCP não deve ser interpretado como se cada lei da Assembleia da República definisse, para essa mesma lei ou para efeitos de desenvolvimento dessa mesma lei, a quem compete o poder regulamentar. Esta interpretação é ilegítima e não cabe na proposta do PCP. O que lá cabe, pelo contrário, é a obrigação ou a vinculação de o legislador ordinário definir, em lei quadro, o exercício do poder regulamentar em geral. Só que essa proposta é uma proposta que, com a devida vénia, salvo melhor opinião, e com o necessário e merecido respeito, não cabe num artigo deste género.

Caberia, sim, num artigo atributivo de competências da Assembleia da República, isto é, que conferisse à Assembleia da República a competência para aprovar uma lei quadro do exercício do poder regulamentar, o que é, aliás, em si próprio, também um objectivo discutível, no sentido de saber ser deverá haver uma lei quadro definidora do exercício do poder regulamentar ou se as normas enformadoras da Constituição, em matéria de princípio de legalidade, não são elas próprias instrumento necessário e suficiente para definir os grandes parâmetros do exercício desse poder, porquanto as consequências perversas das formas de autoaumento do poder regulamentar por parte do Governo e de órgãos adjacentes ou conexos é uma matéria que deve ser prosseguida através do exercício do múnus legislativo da Assembleia da República mais do que propriamente por uma lei quadro rigidificadora das formas de exercício desse poder.

Concluindo, o segmento útil da proposta do PCP é consumido pelo princípio da legalidade e pelos afloramentos desse princípio na Constituição e aquilo que de novo a proposta do PCP acrescenta - uma lei quadro do exercício do poder regulamentar - merece, da minha parte, as maiores dúvidas sobre a sua eficácia prática e sobre a sua relevância constitucional, merecendo-me uma apreciação negativa quanto á sua consagração em termos ambíguos num artigo sobre o poder regulamentar. Quando muito, veria melhor a sua eventual consagração na norma de definição das competências da Assembleia da República, mas, mesmo assim, com a ressalva de que tenho dúvidas sobre a eficácia de um tal normativo.

O Sr. José Magalhães (PCP): - O Sr. Deputado não poderia especificar? É que trata-se de falar de dúvidas e é sempre duvidoso falar de dúvidas. Em todo o caso, é sempre possível, pelo menos, especificar em que é que consistem as dúvidas principais, ou seja, qual a parte em que V. Exa. rejeita, determinante e perfunctoriamente, a nossa ideia como hipótese de trabalho.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado, nunca nesta comissão rejeitei qualquer ideia como hipótese de trabalho, mas o que contesto é a inserção da proposta neste artigo e desta forma ambígua. Isso rejeito liminarmente. Pelo que vimos, esta proposta consente mais do que uma interpretação possível, embora aquela que eu fiz seja ilegítima no entender do autor da proposta, só que me parece que a pretendida lei quadro não alcançaria os efeitos úteis que o Sr. Deputado José Magalhães lhe pretende imputar. Isto é, o problema da apetência expansionista das competências regulamentares do Governo não é sustido através da existência de uma lei quadro do exercício do poder regulamentar porque ou essa lei quadro era altamente rigidificadora e aprofundadamente clarificadora da fronteira entre competências legislativas e regulamentares, e daí resultaria um factor de extrema rigidificação do sistema normativo ou então, se essa lei não pretendesse introduzir essa revolução delimitadora das competências legislativas e das competências regulamentares, acabaria por ser tão vaga que teria escasso interesse útil.

Esta é a minha opinião, que assenta apenas numa única dúvida: a de saber se há vantagens em introduzir factores de rigidificação no sistema normativo através de uma lei quadro quando, em meu entender, o princípio da legalidade e o exercício das competências próprias da Assembleia da República, hoje em dia, já