O Sr. Presidente (Jorge Lacão): - Srs. Deputados, temos quórum, declaro aberta a reunião.
Eram 11 horas.
Srs. Deputados, continua em apreciação a matéria constitucional dos artigos 255.º a 262.º. Fazendo rapidamente o ponto da situação da nossa reunião anterior direi que, após a apresentação, por parte do Partido Socialista, de uma proposta e alguma clarificação em torno dela, essa proposta ficou de ser ponderada pelos vários Srs. Deputados e, portanto, é com essa ponderação que estamos em condição de retomar os nossos trabalhos.
Assim sendo, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, como acabou de referir, e assim é, no final da última reunião houve a apresentação de uma proposta de substituição para o artigo 256.º, para a qual, dado o adiantado da reunião, solicitámos algum tempo no sentido de podermos expressar a nossa opinião. E é isso que vou fazer desde já.
A primeira observação é que nos parece que esta proposta tem, desde logo, um grande mérito que para nós representa um avanço muito importante. Refiro-me à concretização, em textos já de revisão constitucional, por parte do Partido Socialista, da realização do referendo nacional que é um aspecto que não constava do projecto inicial do Partido Socialista e com o qual nos congratulamos e reputamos de muito importante.
Quanto a outros aspectos do texto, que passo rapidamente a analisar, devo confessar ao Partido Socialista que algumas questões que resultam destes quatro pontos da proposta de substituição do artigo 256.º oferecem-nos algumas dúvidas, umas do nosso ponto de vista politicamente muito relevantes e outras que, enfim, até podem ser entendidas como dificuldades de interpretação da nossa parte e para a qual me permitiria pedir ao Partido Socialista alguma explicitação afim de que fique perfeitamente perceptível o alcance exacto do texto.
Tentando fazer uma análise mais ou menos sistemática do articulado devo dizer que, relativamente ao n.º 1, se nos colocam duas dúvidas de interpretação. Primeiro, ao falar-se logo na segunda linha "...depende da lei prevista no artigo anterior...". Ora bem, podemos verificar que o artigo anterior é o artigo 255.º no projecto de lei do Partido Socialista, que não altera em nada o artigo 255.º da Constituição da República Portuguesa. Nesse sentido penso que se deve ler que a lei prevista no artigo anterior é a que consta do artigo 255.º do texto em vigor da actual Constituição da República Portuguesa, mas há aqui uma dúvida de interpretação que queria deixar. Quando se fala que a instituição "depende da lei prevista no artigo anterior...", querem com isso dizer que a lei tem que estar aprovada pela Assembleia da República, tem que estar promulgada, tem que estar publicada, tem que estar em vigor?
Como sabem, cotejando este aspecto com o de outros projectos de lei de revisão constitucional, nomeadamente o do PSD, importa clarificar a questão do momento - de resto, numa primeira reunião o próprio Deputado Jorge Lacão tinha colocado essa questão ao Partido Social Democrata a propósito da nossa interpretação para o artigo 255.º - em que o referendo se deve realizar. O momento, em termos de cotejamento com a lei de criação das regiões.
O segundo aspecto, na parte final deste n.º 1 fala-se em ..."recenseados no território nacional e em cada área regional." o que, desde logo, nos coloca uma dúvida. Há ou não dois recenseamentos e, logo, dois referendos? Se falam em "recenseados no território nacional e em cada área regional", querem dizer, e é um pedido de esclarecimento que faço, que haverá dois recenseamentos possíveis, um nacional e outro em cada área regional? Ora, a ser assim e de acordo com o funcionamento da lei de recenseamento eleitoral portuguesa, só fará sentido se houver dois momentos diferentes em que o universo de cidadãos recenseados possa divergir ou então não percebemos o porquê de se colocar "recenseados no território e em cada área regional". Ou são momentos diferentes ou então o recenseamento é só um.
A terceira questão não é uma dúvida é uma objecção política de fundo e tem a ver com o conjunto de cidadãos que, por esta redacção, serão chamados a participar no referendo. Parece-nos que fica claro desta redacção, de resto à semelhança daquilo que o Partido Socialista faz no seu projecto de lei na revisão do artigo 118.º, que o PS entende que neste referendo, como em todos, devem participar apenas os cidadãos recenseados no território nacional. Todavia, nomeadamente, em matérias como a regionalização, não vemos razão absolutamente nenhuma para que os emigrantes não possam também participar nesse referendo e formularem a sua opinião sobre a divisão do país em regiões. Os emigrantes não podem ser considerados cidadãos de segunda, são cidadãos de corpo inteiro, o próprio Partido Socialista o reconhece no seu projecto de lei e por declarações de membros do Governo que têm esta área, a quem terá que se reconhecer uma participação na vida política nacional a todos os níveis.
Sendo assim, chamava a atenção que o problema, que se estende ao artigo do projecto de lei socialista a propósito da revisão do artigo 118.º, também se irá colocar no referendo que é preconizado para as alterações que resultarem da revisão do Tratado da União Europeia - e nesse sentido a nossa perplexidade ainda aumenta mais. Ou seja, quer o Partido Socialista dizer com isto que entende que, quer para a regionalização quer para as revisões do Tratado da União Europeia, os portugueses que residem em França, na Alemanha, na Espanha, etc., não vão poder pronunciar-se, não vão poder formular a sua opinião e participar nessa decisão que tem de ser nacional?!
Esta é para nós uma questão que coloco como política. É evidente que o Partido Socialista poderá esclarecer e dizer que não é esse o sentido e o alcance politicamente desejados para esta matéria mas, nesse caso, o projecto tem que ser revisto rapidamente nesta parte e também no artigo 118.º, aliás, como nós desde o princípio temos vindo a afirmar. Como se pode constatar, começamos a tropeçar desde já em problemas que dão razão ao nosso ponto de vista de que as coisas têm necessariamente que ser vistas em conjunto. Portanto, esta questão do conjunto de cidadãos que serão ou não chamados a pronunciar-se no referendo da regionalização com ligações necessárias ao problema do referendo sobre a revisão do Tratado da União Europeia é evidente para nós que se trata - obviamente que começamos por pedir os esclarecimentos ao Partido Socialista de qual o alcance pretendido - duma questão política essencial.