representada(…)" foi, pura e simplesmente, amputada. Compreendo que ela possa ser um pouco crispada e que até pudesse haver vantagem em substitui-la por outra. Por exemplo, em vez de "A soberania da República é especialmente representada, em cada uma das regiões autónomas, por um Ministro da República (…)" poderia estabelecer-se algo como "Em cada uma das regiões autónomas existe um Ministro da República como representante do Estado na região", diga-se do Estado enquanto pessoa colectiva diferente da região. Seria uma fórmula mais enxuta e penso que aboliria alguma da crispação que a actual expressão constitucional encerra.
Agora, abolir esta expressão da função representativa do Estado mas, por outro lado, deixar essas funções, não faz sentido. É que o PS não as põe em causa, lá para a frente tudo se mantém - direito de assinatura, de veto, de nomeação do Presidente e dos membros do Governo Regional -, todas essas funções, a que, por economia, designarei como funções de comissário da República, o PS não as elimina, e bem. Então, a que propósito eliminar, pura e simplesmente, a designação conceitual que suporta essas funções, mantendo, no artigo 232.º, apenas aquilo que é menos importante e, porventura, excrescente na função do Ministro da República, que é justamente a sua função de prefeito?! Se alguma coisa há a manter, no artigo 232.º, é justamente a função de representação do Estado, é justamente a função de comissário da República para cada uma das regiões.
Portanto, a meu ver, a proposta do PS não é bem avisada. Penso que ela merece ser reflectida e, sem prejuízo de alterar a redacção do n.º 1, não vejo como é que seria coerente e não seria uma fonte do maior equívoco dizer-se, por um lado, que não se quer tocar na função comissarial do Ministro da República e, por outro, tirar-se da definição exactamente esse elemento essencial. O ganho que se teria seria nenhum, porque ele continuaria a ter os poderes que tem, as funções que tem, o desenho institucional que tem. A nível da definição, isso seria fonte do maior equívoco.
Portanto, uma proposta que, em vez de eliminar equívocos, aumenta equívocos, sinceramente, Srs. Deputados do Partido Socialista, penso que merece uma reflexão. A revisão constitucional não deve ser feita com isto, sobretudo nesta matéria. Se há equívocos, se há uma figura que cria equívocos, então, a rever-se, ela deve ser revista no sentido de afeiçoar e aprimorar arestas, não no sentido de as aumentar. Sinceramente, eis uma proposta que, a meu ver, não é bem avisada.
A minha posição nesta matéria é a seguinte: o actual quadro constitucional não suporta a eliminação de uma figura comissarial residente da República em cada uma das regiões autónomas e pôr isto em causa seria pôr em causa o actual quadro constitucional. O Sr. Deputado Guilherme Silva fá-lo à vontade, porque, de facto, o seu contexto é todo outro, pois ele propôs uma revolução constitucional. Essa revolução constitucional, felizmente, não foi para a frente, mas isto é uma peça dessa revolução constitucional. Portanto, se a revolução constitucional, em si mesma, não foi para a frente, esta peça não tem sentido nenhum, aliás, sem as outras peças, perde o sentido.
A proposta do PSD é incoerente, ilógica e põe em causa o elemento fundamental que é a figura do comissário residente. De facto, substituir os comissários residentes por um "Ministro do Ultramar" residente em Lisboa que teleguiado ou por computador fala com o presidente do governo regional, veta, promulga ou assina decretos, é uma coisa que, de facto, a meu ver, não é congruente com a ideia das regiões autónomas, sobretudo descontínuas e insulares. É que se mesmo nos países territorialmente contínuos, como a Itália ou a Espanha, essa figura existe, então, num sistema de descontinuidade geográfica, a figura do comissário residente é absolutamente imprescindível.
Quanto à figura do Ministro da República, estou disponível para dar algum relevo à argumentação do Sr. Deputado Cláudio Monteiro mas, sinceramente, não a considero pertinente. Essa figura é, de facto, híbrida, mista e complexa, mas foi desenhada assim desde o princípio e tem funcionado! As figuras, para funcionarem, na política, não têm de ser necessariamente coerentes, isto é, pôr de um lado a figura do comissário e do outro lado a figura do prefeito. A verdade é que, com mais ou menos densidade, essa figura tem funcionado,…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): - Mal!
O Sr. Presidente: - … de forma, aliás, diferente nas regiões autónomas e tem funcionado mal para aqueles que pensam que não devia haver nenhum controlo da República sobre as regiões autónomas.
Hoje, há o Ministro da República, amanhã, diriam "Aqui d'el-rei o Presidente da República... A que propósito o Presidente da República?! Aqui d'el-rei que se está a limitar a autonomia". Hoje, propõe-se a abolição do Ministro da República; amanhã propor-se-ia a abolição do Presidente da República, isto é, a abolição em relação às regiões autónomas.
Portanto, o termo da conclusão é óbvio: tudo aquilo que se tem dito do Ministro da República ou de cada Ministro da República, porque veta, promulga, não promulga, etc. diriam, a partir daí, do Presidente da República, com uma diferença: é que a carga explosiva aumentaria de forma perfeitamente intolerável. A grande vantagem do Ministro da República é exactamente a de ser essa "almofada", esse intermediário, esse ponto de distanciamento entre o Presidente da República e as regiões autónomas. Propor a eliminação desta figura seria, de facto, propor a receita para o desastre e, sinceramente e de boa fé, penso que quem propõe isto não tem nenhuma razão para não crer que seria assim, que o resultado seria necessariamente esse.
No dia em que isto acontecesse, não só teríamos uma revolução constitucional consumada como teríamos o desastre institucional instituído! A partir do momento em que o Presidente da República tivesse de fazer o primeiro veto a um decreto regional ou mandar para o Tribunal Constitucional o primeiro decreto regional ou, porventura, tivesse de ouvir os partidos regionais para nomear o presidente do governo regional, seria o desastre. Tudo isto é evidente para quem queira pensar duas vezes sobre o quadro que se desenharia no momento em que desaparecesse o Ministro da República como figura comissarial.
Portanto, Srs. Deputados, a minha posição é a seguinte: oposição definitiva e rotunda às propostas do Sr. Deputado Guilherme Silva e do PSD; apelo e proposta concreta ao Partido Socialista para refazer, pelo menos, o n.º 1 da sua proposta, uma vez que, tal como está, é um convite ao equívoco e lá, onde existe um pequeno equívoco, multiplicá-lo por cem. Penso que a função da proposta do Partido Socialista e da revisão constitucional não pode ser esta.