O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

 

O Sr. Presidente (José Vera Jardim): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 15 minutos.

Srs. Deputados, como sabem, reservámos o dia de hoje para a apresentação das propostas relativas aos artigos 15.º (Estrangeiros, apátridas, cidadãos europeus) e 34.º (Inviolabilidade do domicílio e da correspondência) da Constituição. Em relação ao primeiro existe apenas uma proposta do PSD, cuja apresentação está a cargo da Sr.ª Deputada Maria Manuela Aguiar.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Maria Manuela Aguiar (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começaria por ir um pouco atrás, para referir que a questão do gozo de direitos políticos para portugueses e brasileiros foi inicialmente suscitada no Brasil, pela comunidade portuguesa, e foi objecto da Emenda n.º 1 à Constituição brasileira, em 1969.
Na altura, Portugal teve a capacidade de dar uma resposta pronta, isto é, cerca de dois anos depois, em 1971, ano em que foi celebrada, em 7 de Setembro, a Convenção de Igualdade de Direitos e Deveres entre Portugueses e Brasileiros, ratificada em 20 de Dezembro do mesmo ano, na Assembleia Nacional. Houve uma troca de instrumentos de ratificação em 22 de Março de 1972, sendo a respectiva regulamentação também desse ano. Portanto, tratou-se de um processo relativamente curto.
Infelizmente, o mesmo não aconteceu quando o Brasil deu um novo passo em frente, em 1988. Já lá vão 13 anos e nós continuamos sem ter logrado dar reciprocidade ao novo patamar que a Constituição brasileira, no seu artigo 12.º, veio colocar o estatuto de direitos políticos entre portugueses e brasileiros.
Talvez haja vantagem em referir os termos do artigo 12.º da Constituição brasileira, no qual se pode ler o seguinte: "Aos portugueses com residência permanente no Brasil, se houver reciprocidade em favor dos brasileiros, serão atribuídos os direitos inerentes ao brasileiro nato, salvo os previstos nesta Constituição". E excepcionam-se como direitos do brasileiro nato os cargos de Presidente e de Vice-Presidente da República, de Presidente da Câmara dos Deputados, de Presidente do Senado Federal, de Ministro do Supremo Tribunal Federal, da carreira diplomática e de oficial das forças armadas.
Para efeitos de discussão, também é interessante referir o conteúdo do estatuto especial de igualdade de direitos políticos, tal como era concebido pela Convenção de Igualdade de Direitos e Deveres de 1971. No artigo 21.º estabelecia-se que "aos nacionais brasileiros, nas condições do artigo anterior, não poderão todavia exercer funções constitucionalmente reservadas aos portugueses originários". Ou seja, estar-lhes-iam vedadas as funções de Presidente da República, de conselheiro de Estado, de Deputado, de Procurador à Câmara Corporativa, de membro do Governo, de juiz dos tribunais supremos, de Procurador-Geral da República, de Governador das Províncias Ultramarinas, agente diplomático, oficial general das Forças Armadas, nem poderiam participar no colégio eleitoral para a designação do Presidente da República. Estas eram as limitações da Convenção de 1971, e os Srs. Deputados já conhecem as que são impostas pela Constituição da República Portuguesa.
Ora, para dar a reciprocidade, não sei se plena mas, pelo menos, muito aproximada, o PSD apresentou um projecto de revisão constitucional que inclui uma proposta de alteração ao n.º 3 do artigo 15.º com a seguinte redacção: "Aos cidadãos da República Federativa do Brasil e dos demais Estados de língua oficial portuguesa, com residência permanente em Portugal, são reconhecidos, nos termos da lei, mediante observância das convenções internacionais e em condições de reciprocidade, os direitos próprios dos cidadãos portugueses, com excepção do direito de acesso aos cargos de Presidente da República, Presidente da Assembleia da República, Primeiro-Ministro, Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e Presidente do Tribunal Constitucional, e do serviço nas Forças Armadas e na carreira diplomática". Como podem constatar, ainda assim, este é um pouco mais restritivo do que o texto do artigo 12.º da Constituição brasileira.
Como sabem, no Brasil, esta questão tem levantado uma grande polémica que teve eco, em Portugal, na revisão constitucional de 1989 e, de novo, na revisão constitucional de 1997, tendo ainda sido apresentado um projecto pelo Deputado Pedro Roseta - que estatuía de forma semelhante àquela que agora aqui propomos - num processo de revisão constitucional que não chegou a concretizar-se, em 1994.
É difícil de compreender para os brasileiros e, penso, para muitos portugueses a razão deste longo impasse, deste impasse de 13 anos. Julgo que uma das razões será uma confusão, absolutamente infundada, reinante entre dois conceitos diferentes de cidadania: entre a chamada "cidadania europeia" e a "cidadania luso-brasileira", que resulta da Convenção de 1971.
Como sabem, na União Europeia, os direitos mais importantes do conteúdo da cidadania são os de livre circulação, de protecção consular e diplomática em países terceiros e os direitos políticos limitados ao nível local. Nós podemos chamar aos estatutos que resultam da Convenção de 1971apenas Estatuto de Igualdade de Direitos ou, então, cidadania luso-brasileira ou cidadania da CPLP, mas temos de ter consciência de que estamos a falar de um conteúdo completamente diverso. Não há entre Portugal e Brasil, muito menos a nível dos países da CPLP, direito de liberdade de circulação; também nos termos da Convenção de 1971, não há direito à protecção diplomática e consular (artigo 17.º do Convenção), nem se abrange o direito à permanência no território português, nem o direito à protecção diplomática em terceiro Estado. A convenção é, pois, muito clara neste ponto.
A meu ver, será mesmo muito difícil que se venha a estabelecer um direito de liberdade de circulação entre os países da lusofonia, o que não quer dizer que não tentemos nem esteja a ser tentado o seu estabelecimento. Mas não é, com certeza, previsível para o curto prazo.
Por outro lado, da Convenção de 1971 decorrem dois estatutos: o estatuto de direitos civis, que é atribuído depois de a pessoas estar devidamente legalizada num país, e o estatuto de direitos políticos, que era concedido ao fim de cinco anos e que, nos termos do novo tratado de amizade luso-brasileiro, passará a ser de três anos. Aquilo em que o Estatuto de direitos políticos ou, se quiserem, neste sentido, a cidadania luso-brasileira vai muito mais longe é, precisamente, no próprio conteúdo dos direitos políticos, uma vez que estes abrangem não só o nível local mas, também, o nível nacional. Mesmo hoje, com a Convenção de 1971, ela vai muito mais longe do que a