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O Sr. Presidente (José Vera Jardim): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 11 horas e 10 minutos.

Srs. Deputados, como sabem, estão agendadas para hoje várias audições, a primeira das quais é com o Sr. Embaixador Costa Lobo, que já se encontra presente, a quem começo por, em meu nome pessoal e, naturalmente, em nome de todos os Srs. Deputados desta Comissão, agradecer a disponibilidade para estar hoje connosco e para nos prestar um depoimento que incidirá sobre o Tribunal Penal Internacional.
O Sr. Embaixador esteve nas negociações de Roma, dirigiu-as, em nome do Governo português, em conjunto com várias outras pessoas, algumas das quais serão também aqui ouvidas, pelo que esperamos o depoimento de V. Ex.ª com muito interesse.
Para não me alongar mais e não tomar mais o seu tempo, vou dar-lhe a palavra, de imediato, para V. Ex.ª nos prestar o depoimento que entender, mas aproveitando, naturalmente e certamente, a experiência riquíssima que colheu ao longo dos muitos meses de trabalho para se chegar ao texto final que instituiu o Tribunal Penal Internacional.
Tem a palavra, Sr. Embaixador Costa Lobo.

O Sr. Embaixador Costa Lobo: - Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero agradecer as suas palavras de boas-vindas e exprimir também a minha satisfação por vir a esta Casa fazer a minha exposição, podendo assim contribuir para estes trabalhos, que faz com que esta minha vinda aqui, além de ser uma obrigação, constitua também, para mim, um motivo de prazer e satisfação.
Suponho que será talvez desejo de todos que faça a apresentação de forma bastante resumida, pelo que vou começar por localizar o tema.
Os trabalhos com a criação do Tribunal Penal Internacional têm antecedentes longínquos, mas começaram, de forma mais directa, no início dos anos 90. Depois, o assunto esteve na Comissão de Direito Internacional e passou mais tarde para um Comité Preparatório, no âmbito da Assembleia Geral das Nações Unidas, mais ou menos em 1995, e, entretanto, a Conferência Diplomática, a realizar em Roma, foi marcada para 1998.
Pessoalmente, fiz parte da delegação apenas a partir da última sessão do Comité Preparatório, que foi, salvo erro, em Abril ou Maio de 1998. Depois, efectivamente, como o Sr. Presidente referiu, em 1998, na Conferência de Roma, estive à frente da delegação.
Foi, naturalmente, uma Conferência interessante, pelo tema, que era difícil, e porque havia variedade de opiniões e de perspectivas. E, ao contrário do que era intenção inicial, a aprovação do texto acabou por ser feita por votação. No Comité plenário o Estatuto tinha sido aprovado por consenso mas, depois, na sessão final da Conferência foi aprovado por votação, pedida pelos Estados Unidos. Mas foi até, talvez, melhor assim, porque ficou mais clarificado, uma vez que os consensos, muitas vezes, escondem divergências e segundos pensamentos que confundem, um pouco, sobre qual a verdadeira atitude dos Estados e o verdadeiro apoio aos documentos que dali saem. Assim, veio a obter-se uma aprovação por 120 votos a favor, 7 votos contra e 21 abstenções. Os 7 votos contra foram de natureza muito heterogénea, pois incluem desde os Estados Unidos à Líbia, ao Iraque e à China.
Portugal, como, aliás, todos os outros países da União Europeia, votou a favor da aprovação.
O texto que foi votado, em face das grandes divergências que havia e de alguns pontos não terem sido resolvidos por negociação directa nos grupos de trabalho, acabou por constar de um documento que foi apresentado pelo bureau e cuja versão final nos chegou apenas durante a noite que precedeu o último dia da Conferência, pelo que a alternativa, naquele momento, era a de aceitar ou não aceitar. O texto suscitava objecções a todos os grupos mas, justamente em virtude da divergência de opiniões a que fiz referência, era inviável alterá-lo.
No contexto do chamado grupo dos like-minded, mais ligado ao grupo Ocidental mas que tinha vários países latino-americanos, alguns africanos e até asiáticos, embora menos, considerou-se que o saldo, dentro da perspectiva que havia, era francamente positivo, pelo que se decidiu pela votação e, inclusive, na sessão final, quando foram propostas determinadas emendas, houve uma moção no sentido de o texto ser considerado directamente, até porque, realisticamente, não havia possibilidade de, naquele momento, fazer aprovar um texto diferente.
Os pontos principais em discussão eram a questão da jurisdição, quem é que abrangia, quais eram as condições necessárias para que determinada pessoa pudesse ser levada a tribunal, a questão dos poderes do Conselho de Segurança, a questão da competência ou dos poderes do Procurador, a questão das penas - designadamente porque havia um movimento muito grande e muito importante de um grupo de países que insistia na inclusão da pena de morte e foi difícil ultrapassar esta questão, obrigando mesmo a uma solução em que o Presidente da Conferência leu uma declaração no sentido de dizer que, ali, a não inclusão da pena de morte não implicava um julgamento, o que, aliás, era óbvio, porque a aprovação de um texto internacional nada tem a ver com as disposições das ordens jurídicas internas, mas, enfim, para dar uma satisfação e conseguir a não objecção desses países, houve essa declaração - e a questão da agressão.
O ponto relativo à agressão continua, digamos, em suspenso. Está incluído na lista de crimes mas refere-se que o Tribunal, de momento, ainda não tem jurisdição sobre ele. Portanto, em termos práticos, só estará, efectivamente, entre os crimes a serem julgados, quando da primeira revisão, que não terá lugar antes de daqui a sete ou oito anos ou talvez um pouco mais. Estas eram as principais questões em discussão.
Houve a aprovação do texto, que não podia ter reservas, e iniciaram-se, depois, os trabalhos da Comissão Preparatória, que recebeu vários encargos, nomeadamente o de elaborar os projectos de uma série de documentos que tinham ainda que ser preparados, entre os quais, o documento sobre as regras do processo, um documento chamado "Elementos dos crimes", onde a definição de cada crime era descrita em maior pormenor, por uma questão de maior certeza e segurança, e outros documentos como o dos acordos sobre privilégio e imunidades, o acordo entre as Nações Unidas e o Tribunal (porque, como sabem, o Tribunal, embora estreitamente ligado às Nações Unidas, não será um órgão das Nações Unidas) e o acordo entre o Tribunal e o país anfitrião, que será a Holanda. Esses trabalhos estão em curso; estão, aliás, relativamente perto