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isto com a especial exigência de maiorias qualificadas para a revisão constitucional. Isto é: a Assembleia da República precisa de uma maioria qualificada exigente de dois terços, e, se se tratar de um processo extraordinário, ela terá de ser aberto por maioria de quatro quintos, para aprovar alterações à Constituição. Isto porque o legislador constituinte considerou que não basta uma maioria, ainda que absoluta, existente na Assembleia da República para poder proceder a alterações à Constituição.
Ora bem, conjugando esta exigência, aliás justa, com a possibilidade de submeter as propostas de alteração da Constituição a referendo, temos uma maioria de dois terços da Assembleia da República inviabilizada por uma decisão tomada em referendo por uma minoria, quando comparada com os cidadãos que elegeram esses dois terços de Deputados. Isto é: uma maioria qualificada de cidadãos eleitos é suplantada por uma decisão que pode ser tomada por um número muito reduzido de portugueses.
Há, portanto, aqui, de facto, um confronto de duas legitimidades, e creio que fazer prevalecer uma legitimidade referendária, que pode, inclusivamente, no plano político, ser tomada por 20% ou 25% dos portugueses… Dir-me-ão, mas o referendo, se não tiver quórum, não é vinculativo; se não votarem 50% dos portugueses não é vinculativo. Será assim juridicamente, mas os senhores consideram vinculativo politicamente um referendo no qual votaram cerca de 30% dos portugueses.
Portanto, como é que os senhores conciliam isto? Como é que os senhores consideram razoável que uma maioria de dois terços num Parlamento democraticamente eleito possa ter de ceder perante uma decisão referendária sobre uma decisão que ela acabou de tomar? Como é que os senhores resolvem este conflito de legitimidades? Não reconhecem que, de facto, estão a pôr em causa a legitimidade de um Parlamento democraticamente eleito para poder proceder a alterações à Constituição?
Se já é discutível que o referendo em geral possa ser considerado como uma forma de, de alguma maneira, contrariar a legitimidade democrática da Assembleia da República numa situação normal, embora em alguns casos seja, obviamente, admissível, pois o referendo está admitido na nossa Constituição, creio que é diferente quando se trata de alterações à Constituição, tendo em conta a especial exigência de maiorias qualificadas, porque aí parece-me que é ir longe demais em matéria de referendo.
A última questão que lhes coloco diz respeito às autonomias regionais. O Sr. Deputado Luís Marques Guedes falou como se o PSD tivesse o monopólio das autonomias regionais. Ora bem, o PSD não tem o monopólio da autonomia, quando muito poderá ter o monopólio da gritaria em torno da autonomia regional, mas o monopólio da autonomia seguramente que não tem. E mesmo em relação a essa gritaria às vezes os senhores demarcam-se dela e fingem que não a ouvem, sobretudo quando ela assume, enfim, um cunho muito mais provocatório relativamente à República. Mas o monopólio da autonomia seguramente que não têm.
E, aliás, já tem sido dito, e com razão, que se há matéria nesta revisão constitucional onde todos nos podemos aproximar de algum entendimento é em matéria do aprofundamento da autonomia regional. Portanto, não vale a pena o PSD estar a querer "puxar pelos galões" nessa matéria, porque, efectivamente, não tem muitos galões para puxar relativamente a outras propostas aqui apresentadas.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Podemos ficar contentes, não é verdade!?

O Sr. António Filipe (PCP): - Exactamente! Pode ser que se consiga um resultado importante, porque creio que a autonomia regional é uma feliz construção da República. Creio que correspondeu, obviamente, a históricas aspirações das populações insulares, mas corresponde a uma forma de organização do Estado que todos nós muito prezamos e que vale, de facto, a pena procurar continuar a aprofundar, porque com isso progridem as regiões autónomas e creio que progride também a democracia e a República. É nesse sentido que gostaríamos de ver esta questão discutida.
Mas há uma outra questão, que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes aqui suscita, que creio que nos coloca dificuldades, que tem a ver com a possibilidade da introdução de círculos eleitorais para as eleições regionais de não residentes nas regiões autónomas.
Lembro-me que uma disposição desse tipo esteve consagrada, durante muitos anos, no Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, até que o Tribunal Constitucional a considerou inconstitucional. Mas nos longos anos em que esteve no Estatuto, isto é, antes de o Tribunal Constitucional se ter pronunciado sobre ela, essa disposição não foi aplicada. E não foi aplicada porque se colocavam aqui problemas práticos que nunca foram superados.
Vale a pena pensar porque é que, desde 1980 até quase ao final do século XX, isto é, durante os quase 20 anos em que essa disposição vigorou, nunca foi aplicada na região autónoma. Ora bem, não foi porque coloca problemas de princípio e também problemas práticos, uma vez que o universo eleitoral é definido em função de um nexo de residência e não de naturalidade. Isto é: nós votamos, mas votamos no local onde residimos, independentemente da região do País de onde sejamos naturais, e nas eleições regionais votam os cidadãos que estão recenseados nas regiões autónomas, independentemente do local onde tenham nascido - podem ter nascido em Trás-os-Montes ou em Lisboa, mas, desde que residam na região autónoma e estejam lá recenseados, podem votar nas eleições regionais -, e não votam os naturais que residam e estejam recenseados fora da região, estejam eles no estrangeiro ou, eventualmente, no território do continente.
Portanto, a questão que se coloca, desde logo é a de saber se, criando esse círculo, os cidadãos nascidos nas regiões autónomas que vivam no continente também são considerados emigrantes para esse efeito e, portanto, se eles também votam como emigrantes, ou se se faz um círculo onde votem os açorianos e os madeirenses, respectivamente, quer residam em Lisboa ou em na Venezuela; se é o mesmo círculo eleitoral que os senhores propõem ou se são círculos diferenciados; se há um para os que vivam no continente e outro para os que vivam noutros países da Europa e, eventualmente, em países africanos ou da América Latina.

O Sr. Gonçalo Capitão (PSD): - Ou Cuba!

O Sr. António Filipe (PCP): - Ou Cuba, como disse o Sr. Deputado Gonçalo Capitão.
Como é que isso funciona? E o que é que os senhores pensam acerca disso? E, já agora, se o nexo de relação